Friday, November 30, 2007

Último capítulo!

Sim, chegamos ao fim do mês, chegamos ao fim da novela. Depois de hoje é embarcar nas comemorações natalinas, cada vez mais descaracterizadas... Amanhã tem inauguração da Árvore da Lagoa -- grandes engarrafamentos à vista. A temporada de compras já começou. O assédio para contribuirmos com algum tipo de caridade, também. Os enfeites exagerados, cada vez mais luxuosos e de mau gosto estão por toda a parte e as festas de confraternização, as lembrancinhas de amigo oculto, os telefonemas das "primas da Sapucaia" já começaram! As musiquinhas eletrônicas repetidas até o estupor nos anestesiam os sentidos. Arre! Lá vou eu reclamar, mas houve um tempo em que Natal era diferente: a gente saía pelas ruas com um sorriso, com vontade de abraçar todo o mundo, e era um grande programa ir visitar os presépios que se armavam pelas Igrejas. Logo em seguida, porque éramos democráticos e tolerantes, todos iam à praia para receber as baforadas fedorentas dos charutos baratos dos pais e mães de santo, que se postavam, desde o dia 26, em ônibus estacionados na avenida Atlântica, cada vez mais numerosos. A praia se enchia de flores e de velas, e os tambores se aqueciam para a grande noite da virada, e todos nos sentíamos renovados. Os encantos outros são hoje são outros, e também me encantam -- não se enganem, vivo no presente. Mas tenho pena de me sentir acuada e, ao invés do impulso de abraçar e ser abraçada, me preocupar em desviar-me das pessoas na rua, abraçando apenas a minha bolsa... Olhar o próximo com desconfiança é a coisa mais anti-natalina que conheço, mas parece ser o novo mandamento. Ouvi dizer que existe uma campanha, que está correndo o mundo, de "Abraços grátis" -- A gente bem que podia fazer isso aqui no Rio, uma maratona de braços e corações abertos, como o Redentor, nossa maravilha.
E agora -- com meus abraços -- o último capítulo!

Capítulo XIX

Você disse que ia mudar o final.

Não pude. A história de Paula e Francesco não podia ser como a nossa. Aquele Francesco não merecia um final feliz. Ele estava traindo a mulher. Não merecia ser feliz.

Mas quem morreu foi a Paula! Ela é que foi castigada pelo erro do outro.

Castigada? Não, ela ficou com a melhor parte: Não teve que lidar com a culpa que ela já tinha começado a sentir. Não envelheceu. Não ficou com Alzheimer. Não foi trocada por outra. Não teve que lavar cueca nem meia suja...

Mas o Francesco não foi castigado...

Você é que pensa. A mulher dele vai presa, ele tem que cuidar dos dois filhos. Precisa parar de escrever poesia e se dedicar a dar aulas particulares, ou seja lá o que for, para complementar a renda. Os meninos crescem, se revoltam. Um enche o corpo todo de piercing, engorda, pára de estudar, se junta a uma turma de arruaceiros, neo-nazistas, ou mussolinistas, seja lá como se chamam na Itália. O outro se vicia, foge de casa, aqueles dramas de filho drogado, que quando aparece é só para arrumar mais dinheiro para as drogas...

Pôxa! Tem piedade do Francesco.

Não tenho não. Ele também engorda. Se casa de novo, desta vez com uma megera que reclama que ele é um fracassado...

Chega! Pobre coitado.

Olha o corporativismo... Mas ele continua um bom poeta. Os livros dele são redescobertos e ele recebe uma homenagem e um convite para participar da FLIP.

Nossa FLIP?

É, mas ele não vem. Está doente, tem diabetes mal cuidado e acaba perdendo uma perna...

Ah, não aguento mais. Chega.

Viu? A Paula escapou disso tudo.

Vem cá. Deixa eu te mostrar o que é que ela perdeu: Perdeu beijos assim. Perdeu abraços, perdeu as mãos do amado percorrendo suas costas, devagar, arrepiando sua pele...

Tudo isso é muito bom, concordo. E ainda perdeu as conversas, sem fim...

E as tardes de cinema, com aqueles emocionantes filmes de ação!

Isso não é grande coisa, melhor são filmes franceses, que fazem a gente pensar...

Ah, não. Isso é garantia de morrer de tédio: como aquele filme que mostra as imagens de uma câmera de vigilância e que os intelectuais acharam a grande maravilha do ano! Se nem os vigilantes aguentam ficar olhando sempre a mesma coisa...

Fábio, pelo amor de Deus! Não diz isso em frente aos nossos amigos, prá não me envergonhar!

Sim, senhora, dona Hipócrita. Pode deixar que vou fazer cara de “pensador”, se falarem no filme perto de mim.

Você está me gozando: o que é que você quer dizer com “cara de pensador”?

Regra número um: o importante não é o que o “autor quer dizer”, mas o sentido que o texto adquire em seu contexto.

Ô, meu amor, não faz isso com sua Mari, não, tá?

Não. Até porque já estou de saída. Maracanã, lá vou eu!

Maracanã? De novo?

É jogo do Botafogo, final. Um clássico! Imagine, Botafogo e Flamengo, e no Maraca! Hoje é um grande dia. As torcidas. Uahhh! As bandeiras, enormes. Os refletores, a fumaça colorida.

Você parece criança!

Por que você não vem comigo?

Detesto futebol.

Jogo no Maracanã não tem nada a ver com futebol. Tem a ver com o público, com o espetáculo de uma paixão compartilhada...

Prefiro ficar lendo meu livrinho...

Eu ia gostar que você fosse comigo.

Ah, não. Ninguém merece. Me poupe.

É pena. Porque eu ia mesmo gostar, se você fosse. Tchau.

Que bobagem. Uma infantilidade, isso. Eu nem gosto de futebol... Que é que eu ia fazer lá? Só se fosse para ficar vendo ele sofrendo com as ameaças de gol. E escutando ele xingar o juiz e o técnico... E para escutar aquele riso gostoso de alegria, quando ele joga a cabeça para trás e se entrega, e depois volta a si, procurando o meu olhar... Ah, não, e eu não vou estar lá para ver os olhos dele brilhando de alegria! Fábio! FÁBIO! Me espera. Eu vou sim! Fábio. Ah, meu amor!

Inda bem que consegui te alcançar!

No comments: