Monday, March 29, 2010

tristemente pornográfico…

Tinha intenção de publicar aqui uma foto que recebi de um amigo, supostamente um "autorretrato do Eros Grau", candidato à ABL. Como dizem alguns amigos na América, God forbid! Não consegui, talvez porque meu blog tenha mais bom gosto que eu… Mas, já que estava com a cabeça pensando em bobagens, lembrei da cena de nudez do Alec Baldwin no filme Simplesmente complicado. Todo mundo morre de rir, embora nada seja mostrado. A nossa imaginação é mesmo fantástica, cria aquilo que não consegue ver, e se diverte com o que não vê. Coisas há, porém, que não conseguimos imaginar, e é preciso que nos mostrem com uma foto, um desenho, alguma prova visual. Este seria o caso da foto que não consegui publicar. Mas, como vocês não vão acreditar mesmo, nem adianta comentá-la. Ainda borboleteando em volta do assunto, nos tempos de colégio, nossas conversas profundas a respeito de namoros eram muitas. Nós, as sem namorado, escutávamos atentas às que namoravam, e mais que namoravam, "namoravam firme". Uma dessas, do alto de sua lourice e de seus dois anos de namoro nos ensinou que era muito fácil saber se o rapaz que habitava nossas fantasias era o nosso verdadeiro amor: bastava imaginá-lo nu, de botas. Se continuássemos sonhando com ele, aquele era o nosso príncipe. Achei que o conselho era muito bom, mas me faltava uma coisinha: eu nunca tinha visto um homem pelado. Não conseguia imaginar… Depois, o tempo foi passando, não precisei do artifício para saber se o Guilherme era o meu príncipe, pois nunca tive dúvidas disso. E, depois, preferi nunca imaginá-lo nesta terrível e reveladora indumentária. Só que um dia, muitos anos depois, fui ao cinema ver um filme muito bom com o Paul Newman (esqueci o nome do filme, é claro, sempre esqueço!). O filme era uma história verdadeira de um senador americano que se casou com uma prostituta de quem era amante. O senador era texano, e já velhote. E eis que, para ir para a cama com a amante, usava botas, daquelas botas todas desenhadas, de vaqueiro, pois só com botas conseguia "firmeza" (grip). Finalmente! Nu, de botas, definitivamente, nem o Paul Newman! E eu ria sem parar no cinema, ria de chamar a atenção, dessa minha piada pessoal, sem que ninguém entendesse o por quê de tanto riso. E fico por aqui, pensando num outro filme, que acabo de assistir. Ana Bolena. Um filme mudo, que comprei em DVD, sem nem saber que era mudo. Anunciado como uma superprodução, realmente, o filme tem qualidades incríveis, embora peque pela simplificação e pela transformação em mártir de Ana Bolena. Mas os cenários e as roupas são extraordinários. E como me delicio com aquele estilo de representação dos filmes mudos, com aquelas reviradas de olhos, os sorrisos mefistofélicos, o exagero expressivo. É bem verdade que o filme é uma das obras primas do expressionismo alemão. Passei mais de duas horas assistindo ao filme e pensando que, um dia, a gente vai olhar os filmes de hoje com o mesmo estranhamento que olha os filmes do passado. Como as imagens envelhecem! E, como diria o Drummond, como dóem!

Friday, March 26, 2010

Sumiço II

Não sou muito dada a sumiços, uma vez que adoro escrever. Este meu bloguinho é uma fonte de prazer, um lugar onde converso com amigos "de verdade" e "imaginários". Quando era menina, filha única, vivia criando minhas narrativas, onde interpretava personagens que criava. Não me lembro de muitas destas criações, que sempre variavam, só uma ou outra, como a "menina pastora". Tudo começou quando encontrei uma espécie de bengala (na verdade era um suporte de cabide de um armário). Eu tinha uma bola de encher, multicolorida, e passei a "pastoreá-la", com a bengalinha, pela casa. Ia para cima e para baixo, conduzindo minha ovelhinha, desviando-a dos móveis e paredes de minha casa, incentivando-a com gentis (nem tanto) toques de minha bengalinha, transformada em cajado. Minha avó aceitava estas minhas brincadeiras sem comentar. Minha empregada já estava convencida de que eu era maluca, e essa brincadeira foi a confirmação de seu diagnóstico. Ela foi uma das principais agentes para manter minha autoestima embaixo. Toda a vez que falava comigo, era de maneira a ressaltar alguma qualidade negativa que eu por ventura tivesse. Será que ela fazia isso na frente de meus avós? Sinceramente, não sei. Mas ela passava por mim e sussurrava um "doida", um "cara de lua", e me tratava meio aos trancos. Não acho que ela não gostasse de mim, ao contrário, acho que ela gostava sim. Mas eu era o membro mais frágil da família, e era em mim que ela descarregava suas frustrações e hostilidades. Só que na época eu não era capaz de entender isso, e cada "safanão", cada "porca", rosnado baixinho e com raiva, ficavam sangrando. Mas volto às minhas personagens. Eu lia muito, sempre adorei ler. Tive até um livrinho inglês, Candles For The Queen, que ganhei de uma amiga de vovó (na verdade, era uma muambeira, que vinha regularmente vender camisolas importadas e não sei mais o quê). Acho que, como ela nunca conseguiu freguesa que quisesse comprar o tal livrinho e percebeu que a neta da cliente vivia de livro na mão, resolveu agradar a cliente e se livrar do encalhe com o presente. Corri para o embrulho, que, pelo formato, já podia adivinhar que era um livro. Quando abri e não entendi, fiquei decepcionada, mas minha avó foi logo dizendo que eu estava aprendendo inglês e em breve seria capaz de ler a historinha. Olhei o livro todo e só reconheci a palavra queen. Mas o livro era ilustrado, e fui acompanhando a história. Descobri que candles eram velas. Pouco a pouco fui descobrindo o vocabulário, construindo a história da coroação da Rainha Elizabeth II (vejam como o livro era velhinho). A última aquisição foi um verbo, yelled, que pode ser traduzido como exclamaram. Por onde andará este livrinho? Guardei-o durante muito tempo, mas acho que minha mãe jogou-o fora, ou deu-o de presente. Quando fui estudar em Portugal, ela simplesmente deu tudo o que deixei para trás. Toda minha coleção do Príncipe Valente, todos os livros, discos e recortes dos Beatles, a coleção de histórias infantis que ganhei de prêmio de redação no ginásio – uma casinha de papelão com uma estante onde estavam uns dez livrinhos extraordinários como Tartarin de Tarascon, O Albergue do Anjo da Guarda, A menina das nuvens, e outros que já esqueci quais eram. Para terminar essas rememorações, claro que fui a Menina das Nuvens, claro que fui Narizinho (Tanto uma como outra compartilhavam meu nome). Daí que acabei com esse sonho de que, quando crescesse, queria ser personagem. Hoje entendo que, quando finalmente virar personagem, crescerei.

Friday, March 05, 2010

Vale a pena contar outras histórias


Esse vídeo foi "roubado" do blog da maravilhosa Adriana Lisboa. Assistam e prestem atenção nas histórias!

Sopa de letrinhas

Ontem tive minha primeira aula de hebraico! Estou orgulhosa por já conhecer o aleph (finalmente!), o shin e o sin, o mem e o mem sofit, o vav, o iod (iud), e as notações para a, é, ê e o. Um tracinho embaixo, ou um tezinho embaixo da letra equivale a "a". Dois pontinhos, deitados ou em pé, embaixo da letra equivalem a "ê". Três pontinhos, ou cinco pontinhos, debaixo da letra, "é". Um único pontinho, embaixo da letra, pode ser "i". Se estiver no alto, à esquerda, vira "o". Três pontinhos numa ladeirinha debaixo da letra, vira "u". Essas três últimas vogais podem ser representadas de outra maneira ( o iod, que é sempre i, e o vav, que quando tem pontinho em cima é "o" e com pontinho no meio à esquerda é "u". Ia me esquecendo de uma letrinha já aprendida, o tav (taf). Aprendi a escrever nome, quem, mãe, você no feminino, sol, lá, presente, seis, sexto, água, a preposição de, meu ou minha e dele, e mamãe. Pensando bem, já posso escrever shalom: shin com tracinho embaixo, lámed com o vau com pontinho em cima, mais o mem sofit. Não podemos esquecer que tudo isso é escrito da direita para a esquerda. Acho que ninguém entendeu nada, né? Mas eu aprendi a lição! Shalom a todos!

Tuesday, March 02, 2010

Terremotos

Me lembro (acho que me lembro) que no dia do terremoto do Haiti eu tinha acordado muito cedo e me deixado maravilhar pelo nascer do dia. E de ter pensado: num dia assim só podem acontecer coisas boas. Aí a televisão veio me contar as tragédias e me senti quase que ofendida com a "traição". 
Não me lembro se no dia do terremoto do Chile o dia estava bonito ou triste, mas me lembro da TV contando as tragédias e da presidente Bachelet falando na TV. Descartava o risco de tsunami no Chile, dizia que a situação era de catástrofe, mas que eles estavam preparados para enfrentá-la. Eu bem que indaguei aos meus botões (algo que aprendi a fazer com Machado) como alguém, mesmo que seja um país, pode estar preparado para uma catástrofe. Catástrofe é um termo saído do teatro grego que indica a reviravolta que traz o fim da tragédia, é o acontecimento principal, culminante da tragédia, o clímax. Se estamos falando de teatro grego, e as tragédias contavam as histórias dos heróis míticos, compreendo que toda a plateia estivesse preparada para a catástrofe. Quem se sentava nas arquibancadas dos anfiteatros estava careca ou cabeludo de saber que Ifigênia seria morta pelo pai, que Édipo mataria o pai e casaria com a mãe, que Fedra se apaixonaria por seu enteado, essas coisas. Mas acho que os gregos, freudianamente (não resisto!), estavam interessados em entender como é que se deve lidar com essas reviravoltas e as lições eram severas. Acho que os gregos da plateia queriam era saber como é que os protagonistas, surpreendidos (pois eles não sabiam) reagiam frente à catástrofe, para a qual eles nunca estavam preparados ( e depois a filosofia vai tentar sempre informar e preparar, mas sem grandes resultados – há sempre uma peça do quebracabeças que está faltando).
La Bachelet também não sabia, seu país não sabia que o tsunami chegaria, que os incêndios se ateariam, que o desespero levaria pessoas pacatas a saquear os supermercados, que o medo levaria outros a se armarem ameaçadores. Aposto que, a essas alturas, ela deve de estar contando o tempo para entregar a faixa presidencial.
Fui vítima indireta de um terremoto. Há muito tempo atrás um terremoto destruiu a bela cidade natal de meu marido. Na falta de internet, ficamos dias tentando falar ao telefone para saber da família dele. Muitas perdas materiais, mas estavam todos vivos. Ficamos tranquilizados de longe. Mas, quando finalmente nos encontramos outra vez, descobrimos que eles estavam mudados. A catástrofe os transformara inteiramente. Algo foi destruído no espírito de minha sogra. Algo desapareceu para sempre do olhar de meu sogro. Suspeitei, então, que as piores vítimas eram as que sobreviviam.
Nunca estive num terremoto, não sobrevivi a nenhum furacão, as enchentes que enfrentei foram amenas. Mas sou vítima de uma catástrofe pessoal. Meu terremoto ainda balança o chão sob meus pés, apesar do tempo que já se passou. Perdi minha "terra firma", piso sobre escombros e sobre um chão sem sustentação.  Estou vivendo no exílio…