Friday, February 22, 2013

Na tonga da mironga…

Será que estou tendo alucinações? Outro dia, juro que ouvi, na novela , núcleo da incapadócia, as pessoas se cumprimentando usando a palavra Kabuletê. Quis perguntar a algumas amigas sobre o dialeto turco usado na globo, mas me esqueci. Quando encontro com as amigas temos outras coisas a comentar, que, para nós, são infinitamente mais interessantes. Devia postar isso na Facebook, talvez assim obtivesse uma confirmação. Mas o danado me distrai, com suas perguntinhas. Quer saber como estou me sentindo, o que estou fazendo, essas coisas maquinais, nas quais a gente nem pensa a não ser que uma maquininha nos pergunte. Ou então, o danadinho, mandão como ele só, me exige: "Escreva alguma coisa, Lucia" e eu, obediente, saio da página e volta ao trabalho em word…
Mas volta e meia a lembrança do kabuletê me assombra, na forma da musiquinha do Vinicius (em parceria com o Toquinho, acho eu) e fico cantarolando, em meio aos meus afazeres, que esta semana teêm sido burocráticos e chatos. No entanto, não posso reclamar, estou cumprindo todas as etapas. Dei entrada no passaporte, agendei renovação de carteira de motorista, providenciei o conserto do carro, cobrei o conserto da TV, estava presente no conserto do filtro de água, agora preciso ler contrato e tomar decisões chatas, chatíssimas. No meio desse caos, aniversariei, tive um dos meus piques de tristeza, me aprumei, dei uma ajudinha familiar de emergência, e continuei na leitura de Crônica da Casa Assassinada, de Lúcio Cardoso. E Rimbaud, meu Deus? Descobri mais um livro sobre ele, na Travessa! Acabo indo à falência… E será que escrevo sobre o Mia Couto? Oh, céus! Tanto o que fazer… E o meu vício secreto, de ficar jogando paciência no computador, me corroendo as horas produtivas!
Vale mais ficar lembrando da Tonga da mironga, e dizendo a todos, com sorrisos banhados a chá de maçã: Kabuletê!

Tuesday, February 19, 2013

Aniversariando

Aniversariar é uma arte.
Aos poucos, com a repetição, a gente vai aprendendo que não tem muito o que esperar da data. Alguns amigos se lembram. Outros, não. Alguns amigos telefonam, outros nos mandam mensagens por e-mail, telefone, facebook. Outros vêm a nosso encontro, outros se escusam.
E a arte, onde está?
Está no sorriso feliz que, por delicadeza, colocamos em nosso rosto, mesmo a contragosto. Principalmente quando se sabe que a data de nosso nascimento deixou de ter importância para os outros. Há um tempo em que nossa data de aniversário é um motivo de comemoração de "maravilhas". É a data em que surgimos no mundo e passamos a ser o ente mais importante para um alguém qualquer. Tenho uma amiga cujo filho é médico e se embrenhou pelas selvas. Num belo dia, foi chamado para assistir a um parto de uma índia. Quando chegou, o bebê, minúsculo, já tinha nascido e estava exangüe entre as pernas da mãe. O jovem pegou o pequenino e cuidou dele, massageou seu coraçãozinho com a ponta dos dedos e rejubilou com seu primeiro vagido, ainda fraquinho. Esse menininho terá o dia de seu natalício comemorado com carinho e emoção por este rapaz sensível, enquanto ele viver. Talvez sua mãe, e seus parentes também se relembrem da data com grande alegria. Mas o indiozinho, provavelmente, vai crescer, seus pais e seu médico desaparecerão, provavelmente antes dele, e ninguém mais ficará comovido e relembrará o milagre de seu nascimento…
Passei minha infância sem maiores comemorações. Naquela época, não eram usadas. Mas ninguém estava especialmente feliz com o meu nascimento, ou, pelo menos, essa era a impressão que eu tinha. Na adolescência, tive uma festa de aniversário, meus quinze anos, ameaçada por uma das enchentes no Rio. Não era uma super-produção, mas era a minha festa. Um amigo, o Ricardo Zambelli (por onde andará ele?) tinha uma banda e ia tocar lá em casa. Eu fiz meu próprio bolo – nessa época eu conseguia fazer bolos deliciosos – em formato de coração, pois era a única forma que eu tinha em casa. Mas a chuva começou a cair e as ruas foram alagadas. A garagem do meu prédio encheu e os carros flutuavam, descontrolados. Eu olhava a intempérie e sofria, com a certeza de que ninguém iria aparecer. Mas, maravilhada, vi chegarem amigos ensopados, os rapazes da banda rebocando seus instrumentos encharcados, e me encantei com a festa, embora até hoje tenha certeza de que a festa em si é que era o atrativo, e não o meu aniversário.
Casada, descobri que meu dia de nascimento era realmente razão de júbilo para alguém. O Guilherme realmente se importava comigo, disso eu tenho certeza. E, mesmo nas comemorações mais simples, o carinho dele tornava meu dia especial.
Agora, sei que tenho amor e carinho a meu redor, mas também sei que o meu aniversário é apenas mais um dia do calendário. Ninguém vai acordar maravilhado porque, num ano remoto, uma menina indesejada nasceu para se tornar a pessoa mais importante da vida de outrem. Agora voltei a ser uma pessoa comum. E, no dia do meu aniversário, sofro, lembrando do que um dia fui.
Mas sobrevivo, estou sobrevivendo bravamente, e vou sorrindo, agradecida de ter tantas pessoas que querem demonstrar, com carinhos realmente verdadeiros ou com originalidades requentadas, que sou uma pessoa querida, amada verdadeiramente. Só não sou mais aquela pessoa especial.

Monday, February 18, 2013

Sobrevivendo ao meteorito

Era dia de aniversário na família… E, de tarde, haviam marcado um meteorito como uma atração extra.  Ia passar perto, mas sem perigo algum para o planeta. Todos os telescópios focados no grande show estelar e eis que um penetra resolve roubar a cena, e quase que nos prega uma peça de mau gosto! De noite, fui jantar com a família, e a conversa ficou assim meio entrecortada, cada qual pensando com seus botões que "imagine se a trajetória do astro fosse um pouquinho diferente"…
Dias antes, em plena folia, um reforço na loucura: O papa renuncia! Vejam só o que dá nascer na segunda metade do século XX: a gente vê o homem pisar na Lua, vê estrelas caindo sobre a Terra, vê (e aprende o nome de) tsunamis se repetindo, vê a revolução nas comunicações e vê um Papa renunciar… É bem verdade que perdemos as duas guerras mundiais, mas fomos fartamente compensados com violentas e intermináveis guerras, quase que uma por semana. Guerras que já não se diferenciam de jogos eletrônicos a não ser pela contagem de mortos pois neste caso são reais. E que nos fazem lembrar do conto de Eça de Queirós – O mandarim. Basta apertar um botão… Lá longe, na distância, o mandarim cai fulminado. E deixa-nos a herança de uma ameaça: quem sabe não estamos à mercê de um outro botãozinho qualquer?
Mas o meteorito, com certeza, anda perturbando outras leis da natureza. Eis que o morto ressuscita e lá aparece o Chaves, pimpão e sorridente, segurando um jornal do dia. Será que só eu me lembro do filme Moon over Parador? Aquele com a Sonia Braga, que conta a história de uma república latino americana cujo caudilho morre prematuramente e os seus prepostos arrumam um sósia que lhes permita uma "sucessão sem percalços"?
A onda de choque demora algum tempo para chegar ao Brasil, mas chega e "mata" meu celular! De repente, estou outra vez no tempo das cavernas, sem celular, sem amigos, flutuando no vácuo, como um meteorito pré-queda. Ninguém sabe de mim, eu não sei de ninguém… Encontros, só fortuitos, por mero acaso, na calada da noite, na fila de táxi.  E agora? Paralisada, fico sem saber como agir, onde ir, como recuperar a vida que depositei num aparelhinho um pouco maior que uma caixa de fósforos.
Refugio-me no cinema, para aproveitar o ar condicionado e a fantasia dos outros. Escolho As sessões e me comovo. Uma história real de alguém capaz de viver de suas palavras. Bravo!

Monday, February 04, 2013

Ai de mim, leitora ociosa…

Leio, e leio por prazer.
Creio que esta é uma confissão cada vez mais rara. Quase tão rara quanto as questões levantadas por Rubem Braga, ociosamente, em sua crônica "Nascer no Cairo, ser fêmea de cupim…" No entanto, parece que, na época, era mais comum do que se pensa essa dúvida apavorante de como se chamaria a fêmea do cupim.  Como sou dada a um escabichamento, lá fui eu ao meu dicionário procurar a femme fatale que cortou o ingresso de tantos ao Instituto Rio Branco e… aleluia!  Pensam que esta é uma exclamação de júbilo? Bem, não deixa de ser, mas é também a solução do mistério.
ALELUIA - designação comum aos exemplares alados (macho e fêmea) dos insetos isópteros ou cupins, quando abandonam o ninho para o voo nupcial após o qual as fêmeas fecundadas formam novas colônias; arará, cupim, sililuia, siriruia.
O mistério, aliás, já tinha sido desfeito por Manuel Bandeira, em seu texto "A fêmea do cupim". Graças a uma amiga aficcionada às palavras cruzadas ele descobriu que a palavra almejada pelo concurso de ingresso à diplomacia brasileira era arará, a qual depois encontrou no seu Pequeno dicionário brasileiro da língua portuguesa – indicando que tamanho não é documento.
Como estava com a mão na massa, aproveitei para descobrir que quem nasce no Cairo, cairota é. Escardinchar não está no Aurélio, lamento, mas encontro a palavra sinema. Aposto que poucos conheciam o vocábulo, mesmo que os que já conheciam a anatomia das orquídeas e que fossem capazes de identificar a parte da coluna que representa os filetes estaminais concrescidos. Nem mesmo toda minha propensão ao escabichamento me permitiu ir atrás dos novos enigmas. Até porque me distraí com seresma, talvez prima das sereias, mas que não passa de uma mulher mole, indolente e inútil. Mas eu não sou nada disso! E, embora não tenha tempo para descobrir o antônimo de póstumo, sou prestimosa e ofereço-lhes um sinônimo para saudade – escabiosa. Advirto, porém, que esta saudade não é um sentimento, e sim uma flor, e não das mais belas. Uma flor roxa e humilde, daquelas que custam a fenecer…