Friday, August 31, 2007

Confusões tecnológicas

E eis que, embora não fosse essa minha intenção, acabo tendo uma espécie de diário aqui neste blog. Uma espécie porque estou bem consciente de que ele pode ser lido, embora eu não me esforce para que ele seja conhecido. Um amigo me falou que colocou no seu blog um título assim como dicas para passar no vestibular, e que isso aumentou à beça o número de hits (será que é isso que se diz?) no tal blog. Aliás, o blog dele é muito mais sofisticado que o meu, com contadores e gráficos que lhe ajudam a administrar seus escritos, como se fosse uma novela. Eu fico com esse meu formato " blog 101" e nem sequer consigo publicar tudo o que quero. Ontem a noite, depois de descrever uma festa de comemoração e o rótulo do vinho Reserva dos Amigos, acabei perdendo todo o post, que se recusou a ir para seu devido lugar. Nem sequer consegui salvar um rascunho para mandar depois. Mas, em compensação, mandei resenha pela internet lá mesmo da lona, com esse meu equipamento de laptop e modem da vivo, que me rompeu as fronteiras das antes inevitáveis tomadas. E é banda larga, é um show.
As jornadas aqui de Passo Fundo continuam me encantando. Hoje levei o dia devagar, pois ontem quando finalmente cheguei ao hotel, estava um bagaço. Mas assisti a uma espetacular palestra com o Ferrez, que me abriu os olhos para muitas coisas. As idéias se agitam em meu cérebro, as emoções me invadem, as confusões me rodeiam e dou mil bandeiras, mas estou feliz.

Thursday, August 30, 2007

Noites brancas

Falo desta madrugada gelada, prateada de lua, que se seguiu a um dia intenso. Não consigo dormir, não quero que este dia termine, um dia que começou com um discurso acadêmico e que passou por uma palestra sobre arte e erotismo, com direito a vaias e a bombas de hiroshima, e que depois teve o extraordinário espetáculo de Dario Fo, representado pelo Julio com a maior entrega que já vi no palco. Em seguida, minha participação na mesa Arte e transcendência, logo eu, bicho da terra tão pequeno, me fazendo ridícula, tropeçando no tapete das etiquetas, enquanto brilhavam as estrelas de Lya Luft e de Affonso Romano de Sant'Anna, de Mario Sabino e de Mariana Ianelli. Aliás, a Mariana é uma estrela de primeiríssima grandeza. Seu livro, Almádena, é tão elegantemente lindo, tão sensível e profundo, que todos nós nos reconhecemos nele. Aguardo um momento de serenidade para voltar a lê-lo, com unção. Mas a serenidade está longe de mim. Não consigo dormir. Estremeço de frio, embora esteja com o aquecimento ligado e aninhada entre lençóis. Escuto o canto de um pássaro -- rouxinol ou cotovia? Ou seria apenas algum pássaro mítico, o canto de alguma sereia extraviada, atraída pelas inúmeras seduções da jornada?

Tuesday, August 28, 2007

Prêmio Josué Guimarães

Agora já posso revelar o meu segredo: Recebi o prêmio Josué Guimarães com os contos
A mãe de Proust
A caixa
Manhã.
Acho que nem preciso dizer como estou feliz. E que estou compartilhando este prêmio com o Guilherme, que ainda me habita

Monday, August 27, 2007

Passo Fundo

Cheguei a Passo Fundo, com olhos de encantamento. A cidade não é especialmente bela, mas tem um coração. Essa universidade que transcende seus limites de "interior" e que avança pelo imaginário de brasileiros, de angolanos, de poloneses e outros através do trabalho de um grupo enorme, liderado pela Tânia, que mal conheci mas que já parece amiga de uma vida inteira. Gostei de meu "ônibus escolar", que me trouxe de Porto Alegre até aqui na companhia de gente tão maravilhosa em carne e osso que nem parecem "autores consagrados" nem "editores renomados". Eles existem, eles conversam e riem, comem quindins (ou chocolates, como a menina da tabacaria), fazem-nos pensar ou matam-nos de tédio, carregam suas malas e contam suas histórias -- maravilhosas, instigantes, repetidas, sedutoras--. Alguns são pessoas de ação, fazem, planejam, organizam. Outros são contemplativos, absorvem por todos os poros, pelo olhar, pelos ouvidos, tudo o que podem. Ainda nem cheguei na Jornada propriamente dita, estou só no hotel, mas já me sinto feliz, com a maravilhosa sensação de pertencer a um grupo.
Agora vou trocar de roupa, tentar comprar uma máquina fotográfica e, finalmente, ir ao encontro dos outros peregrinos nesta romaria cultural. Os sinos ao longe avisam da passagem da hora. É tempo.

Thursday, August 23, 2007

Estranheza

Ontem li em voz alta um conto de Felisberto Hernández para as proustianas (Rachel, Stella, Nelly, Sylvia, o grupo todo, só faltava a Laura). Elas adoraram. Mas eu me pergunto: quem não adora Felisberto? Ele é um sedutor. Suas histórias caminham devagar -- devaneando -- e sempre que existe a possibilidade de o leitor se cansar e olhar o relógio, ou afastar os olhos da página, ele nos oferece alguma coisa inesperada e valiosa, como uma imagem estranha, uma observação inteligente e saborosa como uma iguaria de Circe. Não da mitológica, mas daquela Circe envenenadora de Cortázar, que nos faz apreciar até os mais repulsivos ingredientes, dos quais só nos damos conta depois de experimentarmos o seu sabor... Foi uma manhã de Balcão, pois é este o nome do conto que li, e estávamos sentadas ao lado do "balcão" da Dedei, amplo, com suas plantas e sua vista para a enseada de Botafogo. Vejam como são as coisas, bastou escrever "enseada de Botafogo" para Machado invadir minhas lembranças e eu ficar pensando como o universo de Machado é diferente do do contista de Montevidéu. Machado criou e nutriu seus loucos com a ciência e a filosofia. Felisberto fê-lo a partir dos sonhos e da arte. Seus contos são melodias onde os acordes se desenvolvem em pequenos trechos que se dispersam para se agruparem todos no final, fazendo sentido ou desfazendo os sentidos e nos devolvendo nossas emoções e pensamentos com uma nova roupagem.
No fim do dia me entreguei a Tezza e suas angústias. Só estou no começo, mas percebo como é denso e trabalhado o seu texto. Minha professora eterna, Marlene de Castro Correa, dizia que Drummond era uma mistura de paixão com meticulosidade. Encontro essas qualidades no texto de Tezza. Hoje vou dedicar mais tempo a ele.
Para os curiosos: Os livros em questão são: O cavalo perdido e outras histórias, de Hernández e O filho eterno, de Tezza. Valem muito a pena.

Tuesday, August 21, 2007

Uma mulher com um segredo

Vejam como são as coisas: Inesperadamente, uma campainha de telefone toca e sua vida se modifica, os planos se desfazem, ou então surgem já prontos e reluzentes numa nuvem de ouro e incenso (será que é assim mesmo que se escreve?). Há meia hora atrás eu carregava minha placidez, sem sustos. Agora meu coração sobressaltado pula, inquieto, dentro do meu peito e eu me transformei numa mulher com um segredo. Um segredo que pulsa, como uma nova vida, e que brilha como um sol pelos meus olhos espantados que, instantes atrás, se embaçavam de mesmice.
Queria telefonar também, e me transformar em anjo mensageiro, queria dividir com o mundo essa notícia, mas não posso. Trata-se de um segredo. Preciso calar, apagar o brilho dos olhos, sossegar o coração e continuar vivendo minha vida a conta-gotas, mesmo que minha taça esteja transbordando de alegria. Porque é alegre o meu segredo. É iluminado de sol e saber. Mas eu me calo, e me envolvo nos véus do mistério.
Um anjo me anunciou a boa nova. Outro anjo me confirmou. E eu me maravilho e, finalmente, me entristeço. Onde está você meu amado, para se alegrar comigo?
O que vale é que tenho Felisberto Hernández aqui comigo. Embarco nas palavras dele e navego pela casa inundada, esquecendo de meu coração também inundado de prazer.
Ave, palavra. Ave, T. Ave, L.

Saturday, August 18, 2007

de exílio e outras solidões

Minha companhia neste sábado é a TV ligada. Sem que eu preste atenção às vozes, seu som me faz companhia, e volta e meia eu olho para essa visita tagarela, que, mesmo ignorada, continua seu solilóquio na esperança de me fisgar, em algum momento. Mas eu resisto. Devia estar fazendo as resenhas atrasadas. Termino de ler os livros, começo a escrever, depois desisto, vou jogar paciência. Ou vou fazer um lanchinho, Ou tirar uma soneca.Ou escrever no blog... Aqui estou eu, a tv em frente, os livros a meu redor, a cabeça vazia. Ou cheia do que não devia. Um sábado pecaminoso, improdutivo,preguiçoso, seguindo uma sexta-feira idem. Amanhã saio dessa. Tenho programa. Vou ver amigos, vou ao teatro. Mas, e as resenhas? Volto para elas. Ao menos tento mais uma vez.

Saturday, August 04, 2007

Dallas, partindo.

Desta vez deixo Dallas com um gostinho de quero mais na boca. Mas o que me espera é NY, a cidade que parece feita de energia. Quando chego lá eu me sinto devagar, lenta, pesada, pois tudo parece estar acontecendo na velocidade da luz. As pessoas andam correndo, os edifícios engolem milhares de pessoas, como aqueles monstros mitológicos que exigiam o sacrifício de pessoas. Engolem e vomitam depois, e a multidão, estonteada, parece escapar de um monstro para ser engolido por outro, subterrâneo e lúgubre. Os que escapam zunem como moscas atraídas pelos letreiros da cidade. Broadway, Times Square. Soube que tem gente que não gosta de suas luzes e do constante burburinho a seu redor. Pos eu adoro.Gosto de parar e atrapalhar centenas de pessoas que não chegam a compreender o meu irresistível desejo de olhar à volta, de me banhar de luz. Mas também gosto de me refugiar em alguma sala menos procurada de algum museu, e me perder na contemplação de alguma beleza ou terrível hediondez. Porque há muitas coisas feias em Museus. Há gente horrorosa tanto retratada quanto visitando as artes. Há quadros que são dolorosamente feios, propositalmente desagradáveis. Há assuntos terríveis, inquietantes. Depois eu conto o que se passar por lá. Agora, neste instante, o futuro ainda não existe, ou talvez só exista em alguma cidade neo-zelandesa, ou em alguma província do Japão. Hoje já é amanhã por lá. Me lembro de quando Guilherme viajava para a China que eu gostava de brincar com ele e perguntar, quando ele me ligava: E aí, o que é que vai acontecer comigo amanhã? Ele habitava o futuro, e isso para mim era tão estranho quanto agora é saber que ele está vivendo somente no passado. Como reverter o tempo e reencontrá-lo? Minha viagem ainda só tem um vetor, é como a viagem daquele filme 2046. Vou seguindo pelo tempo, mas estou em outro 2046, aquele do passado, do quarto de hotel onde vivia a pessoa amada...
Voltando ao presente, é hora de fechar as malas. E de mandar um beijo aos leitores, presentes e passados, mas também futuros.

Wednesday, August 01, 2007

Museus e mais museus

Muito melhor que fazer spinning em Dallas é visitar seus museus. Ficam um ao lado do outro, no cultural district, que, na verdade, não é bem em Dallas, mas em Fort Worth, na cidade universitária. Os museus são lindos, belas obras de arquitetura, com espelhos d'água e design moderno, esculturas na entrada, ótimo acervo, embora não muito grande, e extraordinárias exposições. Fui ver From Mirror to Portrait, no Kimbell Art Museum, e Ron Muek no Modern Art Museum of Fort Worth. Duas exibições excepcionais, sendo que a primeira, como é coletiva e temática, dá até para fazer uma enorme monografia. Como se pode dizer coisas sobre essa insistência artística em fazer retratos e auto-retratos na era da fotografia! E retratos auto-fágicos que se alimentam não dos modelos, mas da própria concepção de retrato, uma coisa de louco. Nunca tinha parado muito para pensar sobre isso, embora goste imensamente de retratos. Sou até razoalvelmente boa em desenhá-los e esculpi-los (é, tenho uma veiazinha de artista plástica, mas nada que me faça abandonar a literatura). Adorei, adorei, adorei.
Também adorei a expo do Muek, que sempre me impressionou muito com suas peças tão intensamente realísticas no detalhe, embora totalmente modificadas nas proporções. Seu bebê gigantesco, um recém-nascido que toma uma sala inteira de um museu, mas que surge ainda com seu cordão umbilical quase que latejante, e suas marcas de sangue como insígnias da batalha pela vida, contrasta com a pequena dimensão do pai morto, indefeso, inerte e diminuído, vencido pela morte, mas comoventemente apresentado como uma criança que necessitasse de ser apanhada no colo para ser consolada...
Demais!
Acho que estou, finalmente, começando a gostar de Dallas (ou, pelo menos, de Fort Worth, já que os museus se concentram na cidade universitária.) Mas, o moderno perfil dos edifícios de Dallas, sua natureza escultórica, me fascina. Fico contemplando os edifícios ao longe, quando passo pelas auto-estradas (que também são altas-estradas, em seus cinco andares inacreditáveis) e me parece que estou passando por uma cidade do futuro, com suas torres todas únicas, todas belas e friamente espelhadas.
Mas aí me deparo com uma orgia arquitetônica de uma lanchonete à beira da estrada imitando um palácio das mil e uma noites e me pergunto que estranho país é este, onde a beleza se revela em bom e mau gosto, e onde a paródia se instaura a cada passo do caminho?