Friday, April 04, 2014

Prazo perdido

Prometi que voltaria a publicar todas as quintas, mas perdi meu prazo. Desculpem, mas acho que vocês poderão compreender que meu tempo não é elástico e que, nas horinhas que dispunha para a escrita, hoje, precisei encaixar mais uma visita ao dentista. A terceira esta semana! Mas valeu a pena. Começo a sentir o rosto desinchar, e me sinto mais aliviada.
Depois, uma aula extra, já que na segunda vou gravar um programa de rádio… Já fui a três gravações de programas de rádio, uma numa universidade fora do Rio, acho que no Paraná, mas já esqueci. As outras duas em rádios aqui no Rio. Os programas cariocas eram ao vivo e na primeira gravação, ali em Botafogo, fiquei fascinada pelo microfone, um daqueles lindos, imitando os antigos, com uma espécie de halo. Sinceramente, não sei como desgrudei os olhos daquele microfone e consegui me concentrar para responder as perguntas que o locutor fazia.
Na segunda vez, aqui no Rio, só que bem ali ao lado do edifício garagem Menezes Cortes,  eram várias as pessoas participando, e o programa acolhia perguntas e comentários dos ouvintes. Impressionantemente dinâmico, o rádio dá uma sensação de maior adrenalina que as gravações de programas na TV. Em minha primeira entrevista, num estúdio de TV a cabo de uma emissora local, lá no Paraná, fiquei super insegura, com medo de que mostrassem alguma coisa que eu (ou os produtores) não queriam. Pois era preciso esconder o fio do microfone, era preciso não suar em bicas, apesar dos intensíssimos holofotes e do meu sempre crescente nervosismo. A entrevistadora era uma dessas jovens jornalistas que estão se preparando para tomar o mundo de assalto com suas certezas: uma bonita moça, sem dúvida uma boa aluna da faculdade de comunicação, mas ainda uma máquina. Ela usava o ponto com desenvoltura, enquanto eu pensava em "Deus", uma voz desmaterializada que havia me notado e se dignado a me dar instruções por um altofalante.  A sala toda era preta, mas havia um bar num dos cantos, que suponho que fornecia água para os que morressem desidratados pela incidência das luzes. E, no entanto, essa não foi a pior vez de uma entrevista: houve uma vez muito anterior, quando fui dar uma palestra em Trinity College, em Hartford. Como ali é uma cidade de forte presença portuguesa e meu assunto tinha alguma conexão com Portugal, descobri que, na hora que subi ao pódio para fazer minha apresentação, uma equipe de TV se montou inteira no meio da plateia e me filmaram, implacavelmente. Assim que as luzes se acenderam e eu vi o aparato, minha garganta se contraiu e foi com um esforço sobre-humano que consegui dominar minha voz trêmula. A voz ficou passável, mas aí as mãos começaram a tremer e foi preciso apoiar o papel no pódio para que eu pudesse ler o que havia escrito. Quando terminei, meu corpo todo doía de tanto se contrair, tentando se controlar. Foi minha primeira grande plateia. E eu nem sequer me lembro sobre o que falei…
Volto ao rádio. Ali me sinto mais solta. Não vou aparecer em lugar nenhum, e por isso me solto um pouco mais. Preocupo-me com minha voz, que sempre acho muito infantil, nada apropriada para ser escutada. Mas, o que é uma voz desacompanhada?
Nas minhas pequenas palestras pelo mundo afora, vou-me virando. Prefiro aquelas em que estamos todos ao redor de uma mesa, em congressos mais ou menos procurados, embora sempre interessantes. Tenho um grande temor quando sei que haverá um tempo para as perguntas da plateia, pois sempre acho que não vou saber responder. Acontece que as pessoas têm sido gentis comigo: fazem-me perguntas fáceis, ou nem perguntam nada ou só fazem suas "colocações". Deixo que coloquem, meio anestesiada, sabendo que esse ritual é sempre um tanto incômodo. Sorrio e agradeço a contribuição, pois não sou mulher de contracolocar nada. Algumas palestras me renderam muito bons frutos. Outras me conquistaram bons leitores. No cômputo geral, acho que estou dando conta.
Quais as que mais gosto? Aquelas em que identifico, em alguns olhares, um brilho cúmplice de aprovação e de encantamento. As que mais detesto são as entrevistas mecânicas a apresentadores indiferentes, profissionais sem paixão. E aquelas em que me divirto são as leituras que faço para as crianças, de meus livros infantis, quando desencavo um lado que herdei do meu avô, o meu mais querido contador de histórias: um teatro envergonhado e contido, coisa de tímida, que se deixa levar pelo olhar generoso das crianças.