Saturday, August 25, 2012

Sem gana que eu gosto…

Acordar sem gana de viver. Decidir passar o dia na cama, esperando a manhã seguinte. Pode isso, com um dia como esse, uma paisagem como essa? Se eu fosse finlandesa, ou russa, ou sami, aposto que uma coisa dessas não aconteceria comigo num dia de sol. Na verdade, lembro-se de minha surpresa ao visitar a Rússia e, naqueles dias intermináveis (e frios) de verão, me surpreender ao ver os bebês passeando com seus pais e irmãos às 11 horas da noite, quando o sol ainda estava iluminando as ruas. A guia, que adorava contar as histórias dos príncipes e czares que tinham morrido estrannnngulados, é que se admirou com minha surpresa: "Quando é que eles vão conseguir apanhar sol, se não aproveitarem o verão?!" Daí que, mesmo sendo inverno, conformadamente me levanto da cama, leio os jornais e agora dou uma passadinha aqui antes de me vestir para ir à praia. Sim, cumprirei meu dever de boa finlandesa/carioca e irei desfilar o maiô novo pela praia. Se o Guilherme estivesse aqui, ia perguntar: Maiô novo? Mas você quase nem usou o do verão! E sorriria com a minha resposta: Este estava tão florido, parecia um buquê, e não resisti. E então eu desfilaria satisfeita, banhando-me no sol do sorriso dele, e criaria coragem para mostrar que também comprei uma saída nova, pois era muito chique. E lá iríamos nós, não para a praia, mas para o barco, o reino encantado que me transformava em sereia e a ele em Posídon. Vejam como é possível passar do mais completo desânimo ao entusiasmo. Aliás, não sei se os leitores sabem o que significa entusiasmo, em suas origens. Numa etimologia mambembe revelo que é possuir um deus interior. Acho que é verdade. Despertei o deus interior e a alma voltou. E agora vamos os três passear. Usando bastante protetor solar, é claro!

Monday, August 13, 2012

Fim de festa

Acabou. Já não temos mais Olimpíadas em Londres, agora o Rio é que já é cidade olímpica. Não assisti aos jogos, não vi TV esta semana, com as retinas queimadas pela minha própria imagem na TV Senado, no programa homenageando o Antônio Carlos Secchin feito pelo Maurício Melo Jr.
Odeio me ver na TV, detesto minha voz, tenho vergonha de minha imagem. Creio que isso se deve à minha timidez, reajo muito mal a posições de destaque, e estou tão encabulada que sumi. Não apareço por aí, não tenho saído de casa, a não ser para as coisas mais urgentes, e esta semana foi cheia de coisas urgentes. Festas de aniversários – e não estou errando no plural: é que foram várias festas e vários aniversários. Velório de amigo querido, aula nova no Midrash, tantas coisas, tantas… E tudo o que eu desejava era ficar escondida debaixo da cama, esperando que tudo passasse e que eu mesma me esquecesse de que tinha me visto na TV. Não consegui rever o programa, apesar de ter sido re-exibido no sábado e no domingo.  Neste próximo sábado e domingo vai voltar a aparecer na TV e depois creio que poderei voltar a viver um pouco menos escondida. Por enquanto, não contem comigo para andar pela praia, passear pelas ruas do Leblon, visitar exposições e ir ao cinema. Fico em casa, lendo. Mas tenho que aparecer na Bienal. Vou para SP na terça, mediar a mesa do SESC e na quarta vou ao espaço de leitura infantil para ler A cobra e a corda.
Ontem não resisti e fui ao Municipal assistir o Neschling regendo a OSI (Orquestra da Suíca Italiana). Deslumbrante. Ele ficou tão emocionado que chorou, as lágrimas correram soltas pelo seu rosto, mostrando bem a emoção que o entusiasmo do público lhe causou. A interação entre maestro e orquestra foi muito espontânea, todos pareciam estar fazendo música com prazer. Eu confesso que esperava um pessoal mais "burocrático" com aquele espírito de relógio perfeito em seu funcionamento, mas sem mais animação, e fiquei agradavelmente surpreendida. Por algumas horinhas me esqueci de mim mesma. Ô coisa boa, esquecer que a gente existe!…

Saturday, August 11, 2012

Dia dos pais

Amanhã é dia dos Pais.
Nem ia falar nisso se não estivesse conversando com uma amiga, outro dia, sobre as novas famílias: com múltiplos pais e mães, por diferentes razões. Nem sempre isso acontece por conta da orientação sexual, mas por casamentos desfeitos e refeitos ou situações bem tristes de perdas familiares quando irmãs e amigas, pessoas mais próximas, se acomodam e incorporam os filhos de vizinhos, os netos, os sobrinhos, etc.
Conheço uma família de três irmãs, e apenas uma delas teve uma única filha. Essa menina passou a ser filha das três irmãs, pois o pai da menina morreu muito cedo. Uma das irmãs nunca se casou, a outra está casada até hoje, mas seu marido é um artista razoavelmente famoso, passa muito tempo fora do Brasil, apresentando seus filmes em festivais. Mas ele gosta da menina, e sempre que pode leva-a com as três "mães" para viagens encantadoras a Disney ou a resorts deslumbrantes.
Tudo o que essa menina quer, ela obtém. Tudo que ela diz, é motivo de encantamento para as suas "mães", ela cresce, linda e saudável, esbanjando auto confiança. Mas ela não é uma menina feliz. Não tem amigas de sua idade, por exemplo. Ninguém vai com ela ao teatro ou ao cinema, e ela não vai a festas de aniversários, pois sempre tem algum programa maravilhoso para fazer com alguma de suas "mães": um dia vai andar de balão com a mãe 1, no outro vai à noite ao ballet com a mãe 2, depois de passar o dia com a mãe três numa visita guiada ao Jardim Botânico em que o guia é nada menos que o ministro da Agricultura ou seu equivalente…
Amanhã as três mães estão competindo para fazer coisas mirabolantes, para que ela não note a ausência de seu pai, e do tio, que está montando uma exposição no Kwait...
Talvez de noite, escondida, ela chore baixinho, escondendo o rosto no travesseiro, imaginando como sua vida seria mais divertida se seu pai estivesse vivo e ela tivesse tempo para brincar com as outras crianças.
E também me lembro do caso de meu amigo, que morreu nas vésperas do dia dos Pais, deixando uma ausência insuportável. Sei como é isso. Quando meu marido se foi, eu não suportava reunir a família, pois era quando a ausência dele se fazia mais notável. Passei alguns anos fugindo de Natais e aniversários, dia das mães e dia dos pais, com o coração em carne viva. Mudei? Não, continuo tentando me esquivar, embora agora esteja mais forte para poder estar presente sem ele nas festas. Afinal, não é justo com meus filhos deixá-los sozinhos tendo que lidar com suas perdas. E vou, reúno e faço questão de mostrar que o pai muito amado está em nossas lembranças, em uma expressão de um de seus filhos, mas, sobretudo, no carinho e no cuidado enorme que fazem de meus filhos extraordinários pais e mães. Isso eles aprenderam e herdaram do pai.
Mas, quem nunca teve pai, teve que ser "pai" de si mesmo. Cuidar-se. Fortificar-se. É para essas pessoas que não conheceram seus pais, ou que tiveram pais ausentes, que desejo um Feliz Dia. Sejam fortes. Sejam compassivos consigo mesmos. E aceitem-se como os heróis que são. Heróis porque sabem perdoar.

Sunday, August 05, 2012

TV ou não TV

Há tanto tempo sem ligar, descubro que minha televisão não liga mais. Queimou? Suicidou-se? Eu nem sabia, e ficaria sem saber se não fossem os filhos que chegam e mexem em tudo. Remexem. Reviram. Depois dão uma "ajeitadinha" e se vão, me deixando com um sorriso bobo no rosto. E a casa totalmente desarrumada. Não ligo. Nem arrumo, pois seria como esticar os lençois logo depois de se fazer amor. A gente quer as marcas, só mais um tempinho, para olhar e sorrir, lembrando do que acabou de ocorrer. Os jornais espalhados, a geladeira cheia de guloseimas, as taças de vinho para mais um brinde bobo qualquer. Meus sapatos que ficaram pela sala, junto aos jornais, misturados de ontem e de hoje, quase sem ler. Proponho um cineminha, mas eles não querem: Não tem nada passando, me informam. Eu sorrio, sabendo bem a tradução… eles não querem ver os filmes em exibição, seja porque já viram, seja porque já marcaram com amigos e irão outro dia. Depois debandam. Hoje é dia de futebol, o tempo ficou meio feio, já até choveu muito. Agora esfriou e, de barriga cheia, eles se espalham deitam, rearranjam móveis e perguntam da prateleira que ainda não mandei fazer, do ar condicionado que preciso revisar, da pintura, da mesa, dos detalhes que me esqueço de providenciar. Olhares críticos, atentos, certificando-se de que ainda podem mandar e exigir coisas aqui em casa.  Você mudou de lugar as taças? se espantam. Mas eles é que esqueceram o lugar de sempre, e ficam meio assustados com isso. De repente se dão conta de que o tempo passa e de que eu estou cada vez um pouco mais distante. Qualquer hora dessas eles são capazes de chegar aqui e não me encontrar mais. Ou de encontrar uma mãe diferente daquela que eles carregam em suas lembranças. Cada vez que aparecem, fazem questão de olhar as fotos e comentá-las, como se com isso se reassegurassem de que ainda sou aquela das fotos, aquela menina de 20 anos segurando um bebê no colo, a de 24 com os três filhos no colo, todos sorridentes, todos impacientes por sair do congelamento do instante e voltar a brincar de viver. E sempre se admiram de que o Ivan ainda não estivesse ali com eles. Como se estivéssemos sempre presentes, sempre todos juntos mesmo ainda antes de existirmos, e muito depois que todos desaparecermos. E todos curtem as lembranças. A casa de Angra. O mar. O barco. E sonham com o passado, pensando no futuro. E eu me despeço. Aos poucos. Sem que eles percebam. Vão, vocês podem seguir em frente, não precisam parar. É essa a vida, e eu fico feliz por sentir que, mesmo daqui a muito tempo, eles vão sentir, na visita de seus filhos, adultos, a doçura que eu sinto ao recebê-los aqui. Mesmo que seja apenas para me anunciar que não tenho mais TV…