Tuesday, December 26, 2017

Estrela de Natal

Passou o Natal, mas a epidemia de votos natalinos, de mensagens engraçadinhas, de postagens edificantes, de protestos amargos, de Natais sertanejos, polares, africanos ainda chega em mensagens incontáveis no meu computador. No entanto, essa estrela a que me refiro só é de Natal porque apareceu como notícia de jornal no domingo, dia 24/12.
Tecnicamente nem se trata de uma estrela. É apenas um provável planeta desconhecido ainda dentro de nosso sistema solar. Depois que Plutão foi rebaixado, perdendo seu status de nono planeta, eis que surge esta hipótese de um novo nono planeta, que ninguém ainda viu, mas cujos indícios parecem ser irrefutáveis. Sua órbita seria diferente das dos outros irmãos da Terra, e estaria provocando a inclinação das órbitas dos objetos transnetunianos, que seriam…"pequenos corpos celestes localizados além da órbita de Netuno". O que me chama a atenção é o fato de que estes pequenos objetos já foram vistos e observados, mas o tal Planeta Nove, apesar de ter massa 10 vezes maior que a da Terra, ninguém ainda conseguiu ver. Nem sequer os olhos mecânicos das sondas que já enviamos para o espaço e que nos brindam com imagens de buracos negros, de estrelas de nêutrons, e o espetáculo do choques de galáxias distantes. 
Este nono planeta ainda não foi visto, mas desperta temores. Confirma a crença da existência de um planeta invisível, que só surgiria nos céus quando estivesse em rota de colisão com o nosso planetinha, tão combalido por nosso descuido com sua generosa e bela natureza. 
O astrônomo que se dedica a estudar os indícios da existência do Nove reclama, pois, de tempos em tempos, as redes sociais se enchem com os boatos que falam do planeta X, o tal que pode destruir a Terra. Bem, se eu fosse de acreditar em "teoria de destruição", poderia argumentar que Plutão foi destituído de sua categoria planetária para que não se confirmasse a existência de um décimo planeta, ou seja do Planeta X. Ficamos com o Planeta IX, Plutão vira proto-planeta e a Terra escapa, graças à terminologia. Salvamos o mundo, quiçás o Sistema Solar inteiro, graças à terminologia.  
Então, já que a terminologia salva, contribuo, chamando esse corpo celeste de estrela de Natal. Quem sabe assim olhamos para o nosso próprio planeta III, essa nossa terra negligenciada, e passamos a cuidar dela um pouco melhor?


Thursday, December 21, 2017

História de Natal
Lucia Bettencourt
Natal, 2017



Uma história de Natal é escrita com uma estrela, brilhando, destacada, no céu. Para que ela brilhe é preciso que a noite esteja escura. Não tenha medo, portanto, da escuridão que acaso te envolva.
Um Natal, como o nome diz, celebra o nascimento de uma criança. Para que ela nasça, é preciso que haja as dores de um parto, intensas, prolongadas. Não te assustes, portanto, com as dores que acaso te martirizem.
Um conto de Natal, bem contado, fala de pobreza e de aflição. Não desanime, então, se te falta dinheiro, se o alimento é pouco.
Pois uma história de Natal também é contada com o abrigo recebido. Um abrigo modesto, sem luxo, mas caloroso. Uma vaca e seu leite prometem alimento. Um burro, presente, vai oferecer transporte e trabalho. As ovelhas, balindo, vão doar a vestimenta, e mais leite, que sobre para o queijo. Já temos, então, um começo de festa. Um pouco de leite e algum queijo sobre um pano estendido aguardam convidados.
A estrela, então, brilha mais. Ilumina. E o primeiro convidado chega. É um anjo! Com ele vem a música.
A criança nasceu. Seu choro já cessou. A mãe enxugou a fronte cansada, e os vincos da dor se estenderam num sorriso. Ela dormita, enquanto o anjo, com voz suave, embala a criança. José, o parceiro, ordenha a vaca e alimenta o burro que os levará dali para uma terra de paz.
Eis que chegam os pastores, atraídos pela luz e pela música. Vêm calados, como é de costume. São pessoas solitárias, passam o tempo no campo, sozinhos, a cismar. Eles não fazem barulho e sentam em círculo, depois de prepararem uma fogueira para se aquecerem. As ovelhas deitam-se ao redor, e entre elas, os cachorros se mantêm vigilantes, atentos. Protegem.
Um dos rapazes lembra do pedaço de pão que ainda não comeu. Coloca-o junto ao leite. Cada um deles oferece aquilo que tem. Pois uma história de Natal se tece com o pouco de cada um. Nozes. Frutas secas. Um som de flauta para acompanhar a voz do anjo. A chama da fogueira crepita, exala o perfume das ervas que alguém jogou ali, e o calor distende os corpos, que se acomodam entre os animais. Já é bem tarde quando chegam outros convidados. Algumas mulheres, preocupadas com os filhos e maridos que não voltaram para a noite. Crianças nos colos de suas mães. As mantas se estendem pelo chão, alguém lembra de por água no fogo, para fazer uma tisana.
A mulher mais velha examina o menino. Olha o umbigo. Certifica-se de que ele e a mãe estão bem. A mãe acorda e olha-a com gratidão. A mulher pegou o menino, limpou-o, envolveu seu corpinho nos panos mais suaves que encontrou e agora, ajudando a mãe a se acomodar, coloca o filho em seu colo e ensina-a a amamentar. A criança é saudável e tem apetite. Vê-lo comer desperta a fome em todos.
Mas eis que os cães começam a ladrar, dando alarme. Alguém se aproxima. Os pastores, em alerta, pegam seus cajados, preparam suas fundas.
Guiados pela luz, vindos de bem distante, são os magos que chegam, montados em altos camelos, que, mal param em frente ao abrigo, se ajoelham, e deitam, permitindo que os homens, estranhos em seus turbantes e seus tecidos diferentes, desçam e descarreguem as ofertas que trouxeram. Esses magos têm posses. Trouxeram provisões variadas, tapetes, pequenas arcas cheias de mercadorias e perfumes.
A festa está completa. As mulheres e os homens cozinham, enquanto o bebê, farto e satisfeito, adormece de novo, no colo da mãe.
A luz do dia os encontra a todos adormecidos. Até mesmo os cães fecharam os olhos por alguns instantes.
O sol torna as ovelhas inquietas. Começam a balir, querem ir pastar. Os cães se espreguiçam. Levantam-se com os rabos abanando, prontos para o trabalho. Os homens e as mulheres gostariam de dormir mais um pouco, mas sabem que precisam cumprir suas tarefas. Só o anjo se mantém imóvel. Seus olhos não se afastam do menino. Contemplam, com doçura, o milagre da vida, tão inexplicável.
Mas um conto de Natal não termina aí. A história de Natal fica gravada nos corações das pessoas. Com sua simplicidade e beleza acomoda-se nos corações e se refaz a cada nascimento. Pois a história de Natal é uma história comum a todos os homens, que nascem trazendo a esperança de uma nova vida, e as promessas de um futuro de festa e de solidariedade.

É uma história que dissipa a escuridão, o silêncio e a dor. Acreditem no Natal. Acreditem na vida. É um milagre compartilhado por todos.