Tuesday, July 28, 2009

De volta

Cá estou eu no meu cantinho outra vez. Os ventos uivantes que não encontrei na Argentina estavam à minha espera aqui na minha torre, trazendo arrepios e cheiros do mar. Qual é o bom de chegar? Encontrar a casa com seus cheiros e objetos familiares. Olhar pela janela e encontrar as paisagens já conhecidas, mesmo que desconhecendo o agreste vento. Poder usar uma roupa recém tirada do armário, e não de uma mala. Usar o computador que, dócil, não se recusa a abrir páginas de internet. Qual é o triste de chegar? É a saudade do novo, do inesperado. É a síndrome de abstinência que nos ataca quando nos vemos na casa vazia. É a realidade que nos morde com mil dentes nas correspondências, nas faltas nos armários da cozinha, nas chaves extraviadas, nas providências a tomar.
Mas, pouco a pouco, a gente se sente aconchegada nos abraços dos amigos, nos sossegos da rotina, no cheiro de café, no sabor da comida preparada em casa. Isso para não falar de nosso prazer em escutar nossa própria língua, na TV, nas ruas, em casa.
Chego e já penso em partir, no entanto. Irei, talvez essa semana mesmo, talvez na próxima. Com certeza em setembro, para a Itália. E, no entretempo, vou escrevendo, visitando o país das maravilhas, das lembranças, do espelho. Isso enquanto o sorriso da lua me faz pensar em Alice, enquanto o pessoal das Histórias Possíveis me chama de volta das férias, enquanto passeio pela cidade e encontro mudanças de cenário. 
Agora vou descansar o corpo moído de carregar malas e de passar horas em aeroportos e em pequenos aviões fabricados em Liliput. Por falar nisso, semana que vem os Houyhnhnms estarão atraindo todas as atenções da cidade. Athina, a imperatriz, traz seus súditos para a Hípica e todos nós vamos nos tornar especialistas em cavalos, graças à mídia. Taí, vou gostar de aprender. Mas, agora, descanso.

Saturday, July 25, 2009

Don't cry for me , Argentina

Como é linda essa região da Argentina. O lago Nahuel Huapi (Nahuel=jaguar;huapi=ilha) emoldurado pelas montanhas de picos nevados (estavam nevados quando chegamos, agora estão sem seu disfarce), o sol que prateia as águas, o vento que empurra as nuvens e provoca mil pequenas ondas, é, realmente, de dar gritos! Adoro o sol que aqui sempre me parece obliquo, como os olhos de Capitu, adoro o frio que mordisca meu nariz até deixá-lo vermelho. Adoro os passeios procurando a neve que se esconde, fugaz e passageira. Bariloche, San Carlos de Bariloche, com suas incontáveis fábricas de chocolate, ruas cheias de gente, mesmo com a ameaça da gripe suína, e os cafés onde, ao invés de me comportar, sucumbo à tentação de un chocolate caliente.
A família se divide: uns anseiam pela neve e suas emoções, outros adoecem com o frio, eu finalizo as resenhas, tento adiantar o trabalho final do curso, luto com a falta de sinal para a internet, a falta de adaptador para carregar os eletronicos do qual dependemos…
A TV me faz companhia, mas também me impacienta. As massagens oferecidas pelo hotel me tentam, mas não sucumbo à tentação. Li mais dois livros de Mia Couto, e assim que consegir carregar meu brinquedo novo, o Kindle, lerei o que nele se esconde. Amanhã parto para Buenos Aires, com a informação de que em breve vai estrear um filme sobre os últimos anos de vida de Borges.  Curiosa, tenho que me aguentar, pois ainda é cedo para vê-lo.
E, desde já, começo as despedidas, cantando, com Evita, que the truth is I never left you. 

Friday, July 17, 2009

O passado silenciado

Estou fazendo, quase que simultaneamente, as resenhas de dois livros apaixonantes. O primeiro é um amor antigo, obra prima de José Cardoso Pires, O Delfim. O segundo é amor novo, ainda brilhante como moedinha nova, apaixonante: Antes de nascer o mundo, do Mia Couto. As duas histórias são tão bem urdidas que o leitor corre o risco de esquecer a verdadeira história, que sublinha nos silêncios (olha o Mia aí, minha gente!) o verdadeiro conto. Mas os danadinhos não deixam. Na hora que a gente podia se perder para sempre na narrativa, eles dão uma puxadinha nas rédeas e nossa imaginação estaca, intrigada: o que é que estamos lendo, mesmo? Podemos desvendar, ou não desvendar nada, mas sabemos que ali, naquele silêncio, a máquina do mundo se desvela. Será que poderemos enxergar além das sombras? 

Tuesday, July 14, 2009

Deu no Globo…

Um conselho que dou a escritores que possam estar sofrendo de "writer's block" (existe um termo consagrado em português? Bloqueio criativo? Síndrome da página em branco?): Leiam as manchetes do jornal, que não lhe faltarão assuntos. Não falo, obviamente, dos escândalos da política nem das mortes violentas. Essas já viraram lugar comum e só inspiram os cineastas. Falo das coisas inusitadas como a possibilidade de um Harry Potter in drags! Quem poderia imaginar que o bruxinho ia crescer e que seu maior desejo seria virar travesti? Bem sucedido, milionário e baixinho, o seu desejo expresso nas páginas do jornal é se vestir de mulher por causa das roupas! A culpada deve ser a danada da Hermione, que fica desfilando todos aqueles modelitos Channel que ganha de presente e rouba os flashes nas estréias. Naughty, naughty, tanto um quanto a outra.
Querem ver mais? Pois leiam o poema de amor do jovem de 17 anos, publicado na quarta capa do Megazine. "Ela é minha mulher, corpo quente/e sexo farto."
Sexo farto? Mas a amada ainda possui "…língua/ culta de conhecimentos sem fim." e "cantarola Vinícius na velha zona/sul boêmia." Essa mudança de linha amplia a significação e me deixa com um título de conto já pronto: Vinícius na zona! Fantastique! (pois estamos no 14 juillet, Vive la France!)
Para terminar, uma de reforma ortográfica: O Brasil vai pagar mais caro pelos submarinos que comprou porque a França vai repassar tecnologia. Se nos lembrarmos da piada da construção da ponte, aquela que diz que a cidade pediu três orçamentos para a construção de uma ponte, e que os alemães cobraram um milhão, os americanos cobraram dois milhões, mas ofereceram cobertura e ar condicionado para toda a ponte, e os brasileiros cobraram três milhões. A cidade, curiosa quanto aos melhoramentos, que não foram mencionados, chamou os brasileiros para conversar. Eles disseram que era isso mesmo: cobrariam três milhões, chamariam os alemães para construírem a ponte, ficariam com um milhão e o outro milhão iria para o prefeito. Daí que, na reforma ortográfica, a gíria grana por fora passou a ser grafada tecnologia.
Agora chega de jornal, e aqui vai minha homenagem ao Theatro Municipal, que sempre amei, assim, com h e tudo o mais, e que merecia um poema tão verdadeiro quanto o do jovem aluno do Pedro II, citado antes. Esse theatro está preso às minhas lembranças mais antigas, de aluninha de ballet do Professor Pierre (Klimon? Climont?) De minhas apresentações como Outono ainda na minhamais tenra Primavera… As lembranças são confusas, mas lembro-me de me perder por uns subterrâneos cheios de praticáveis e de poeira, numa deliciosa brincadeira de esconde-esconde. Lembro de uma montagem espetacular de Sonho de uma noite de verão, com a Lucélia Santos. Lembro do último baile de Carnaval do Municipal, que graças a Deus (que a ciência prova que não existe, Dawkins, eu sei, mas que continua sendo uma ótima expressão de alívio) foi eliminado. Das óperas extraordinárias que assisti, dos ballets que me deslumbraram com sua beleza, dos incontáveis concertos da Dell'Arte ou dos convites para as frisas do Bradesco, quando Guilherme ainda era o "senhor presidente". Não houve nem uma vez que eu tivesse entrado no Municipal sem me emocionar com a beleza do prédio. E sempre me sinto uma espécie de princesa lá dentro, mesmo quando só consigo um lugar na torrinha lateral e passo o tempo todo com a sensação que, se não fosse pelo insustentável aperto das poltronas que imprensam nossas pernas de encontro à mureta da frente, poderia me distrair e despencar lá de cima. Amo o Municipal, amo o Assirius, que já foi um excelente restaurante e que impressionou os gringos que meu marido recepcionou com um almoço no local, e às mulheres dos gerentes de todo o Brasil a quem, ao invés de oferecer um dia de shopping, ofereci um almoço ali seguido de uma visita à Biblioteca Nacional, quase em frente.
Então, viva ao Theatro Municipal! Que ele ofereça mais 100 anos de magia, e mais outros 100 ainda multiplicados por 100.
E que o nosso 14 de julho seja comemorado sempre com a construção de uma coisa boa, não com a queda de uma coisa ruim. Mas que tenhamos todos a Liberdade, Igualdade e Fraternidade, belas palavras, embora filhas do Terror com a Guilhotina… 

Monday, July 13, 2009

Desculpem nossa falha!

Voltei de Paraty gripadíssima. Se era suíno ou não o vírus que me atacou, não sei. Só sei que era chatíssimo, exigente, e que me dominou enquanto não cedi e fiz repouso. O que valeu é que, enquanto estive lá em Paraty (um erro de digitação me fez perceber que o nome da cidade já carrega em si a festa - party) ele não me incomodou. Fui e voltei bem, dirigi sem problemas, deixei os amigos no aeroporto, voltei para casa e… dormi! Mau sinal, todas as vezes que durmo de tarde significa que estou para adoecer. No entanto, achei que estava apenas muito cansada, depois de tantas atividades, muita alegria e companhia todo o tempo – eu, que agora passo dias inteiros sem falar, por falta de interlocutor, me vi numa interminável conversa, deliciosa e variada, como uma borboleta num jardim florido. Bem, vou poupá-los da descrição minuciosa dos sintomas. Também não vejo mais como falar de FLIP, assunto mais que requentado em mil postagens pela internet, em artigos de jornal, em folhetos, em revistas. Quem ainda quer saber do Chico? Quem, se não a vovozinha, ainda se lembra do Lobo? Quem guardou na memória o teor da palestra do Dawkins, as emoções do Domingos, as verdades do Talese? Quem ainda lembra que eu falei na OFF FLIP? Os livros que trouxe, ganhados ou comprados, não puderam ser abertos, muito menos lidos. Aqui em casa se juntaram aos manuscritos do Cremasco, aos livros enviados pelo Maurício, ao manuscrito do Altamir. Desculpem amigos, mas ainda vou demorar: terminadas as aulas, tenho que fazer o trabalho final do semestre. Mas, para complicar minha agenda de trabalho, tiro alguns dias para paparicar a família, que se reúne toda na próxima semana, numa viagem para os picos nevados do Cerro Catedral. Gripe outra vez? Por que me amedrontar? Irei, iremos de avião. Passaremos pela Linha Vermelha. Colocaremos nos pés umas tabuinhas velozes e nos despencaremos pelas encostas da montanha, numa velocidade absurda. Tudo isso é risco. Viver é muito perigoso, nos ensina Guimarães Rosa. Mas, enquanto viva, contemplo minha nesguinha de mar, sorvo o azul pelos olhos, encho o peito de maresia até provocar a tosse, e continuo o descanso, agora frente ao computador, já com mais ânimo. Prometo que escrevo, que volto a ler, que tentarei cumprir os prazos, que não deixarei esses azuis que me encantam passarem outro dia sem minhas homenagens!

Friday, July 03, 2009

Fliperama II e III e !V...

Atrasada, eu sei, mas como me dividir entre o computador, na pousada, e as mesas e os amigos e os divertidos almoços e jantares? Meu computador, já no limite, cansado, cada vez me parece mais lento: estou há mais de 10 min. convencendo-o a colaborar comigo.Então, sem mais demora, vamos às notícias: A mesa das verdades inventadas foi muito boa. Muito bem dirigida, todos broilharam, Bloch, Tatiana e Sérgio tinham muito em comum e destaco algumas frases.
Da Tatiana:
A solidão da escrita é procurar, no próprio corpo, o que poderia ser narrado.
Do Sérgio:
A realidade não existe. Só existe no momento em que a organizamos num discurso.
Do Bloch:
A biografia definitiva é uma falácia.

Claro que eles disseram muito mais, eu é que sou fraca de anotações.
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A grande mesa da Flip, até agora, foi a do Dawkins. O Boccanera foi super profissional e não deixou a peteca cair nem quando houve problemas com o som. O Dawkins foi super simpático, inteligente, divertido, simples de entender. Ouvindo-o, percebemos que ele lê muito, conhece bem literatura inglesa, ou pelo menos, os clássicos da literatura inglesa. Tudo o que ele falou foi interessante, mas não anotei nada -- perdi a caneta, vejam só! E, além do mais, nem sou repórter, sou apenas uma deslumbrada, felicíssima de estar aqui escutando tantas coisas, aprendendo tantas outras.Muito bom.

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A noite? Foi uma loucura portenha. Depois de tanto saber, a euforia das conversas e dos cérebros super estimulados, trocando risadas e lembranças, cantando El dia en que me quieras num restaurante argentino, voltando para a pousada cantando Garota de Ipanema em espanhol, na expectativa de uma sexta-feira de muitas outras atividades.

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Fora das mesas principais, começamos a sexta pela divertidíssima mesa sobre o acordo ortográfico, mediada pelo Marcelo Moutinho, e estrelada pelo Marcelino Freire e o Ondjake. A exuberância do Marcelino, propondo um acordo pornográfico para que todos aprendam a usar bem a língua, foi secundada pela elegante contenção do Ondjake que começou por citar Fernando Pessoa (Minha pátria é a língua portuguesa). Em seguida, ele revelou que Mia Couto oferece uma atualização do pensamento de Pessoa ao dizer "Minha pátria é minha língua portuguesa", para terminar com um amigo, provavelmente imaginário, que diz: "Minha pátria é minha língua numa portuguesa". No entanto, longe de se esvaziar nesta brincadeira, a mesa cresceu, levantou-se a questão da oralidade, da falta de solicitação popular para essa unificação da ortografia, dos aspectos comerciais que estão por tras da reforma, da resistência por parte dos portugueses. E aí, meio que sem querer, o humor voltou a imperar nas longas "colocações" da platéia, quase todas feitas por portugueses ou angolanos ou moçambicanos. Só que não vou comentar aqui, para vocês não pensarem que estou contando piadas de português.


A off-flip também está crescendo.O público comparece e gosta da programação. Ontem foi o Ruffato, debaixo de chuva, e mesmo assim bem assistido. Hoje houve uma homenagem a Bandeira. O Secchin, num novo visual que o deixou muito mais charmoso, fez uma excelente análise de Profundamente. Depois, o pessoal da Fliporto continuou com o mesmo tema, mas ressaltando a pernambucanice (será que dá para usar essa palavra?) do poeta.

Voltando às mesas oficiais, Tezza e Bellatin, concorridíssima, infelizmente foi prejudicada pela passeata das comunidades tradicionais, que organizaram uma demonstração barulhenta e com um estribilho antipático: Queremos perturbar! Eles têm razão de sobra para protestar, mas o estribilho foi muito infeliz.

Depois, a tão esperada mesa de Hatoum e Chico. O mediador, intimidado com a tarefa sobrehumana (?) travou. Hatoum e Chico foram simpáticos, mas, apesar da imensa multidão que arrastaram, que levou o pessoal a barrar até o Gay Talese e alguns credenciados (que depois conseguiram entrar, graças a um supervisor mais atilado) a mesa foi meio borocochô. O Chico, o Hatoum e o mediador confessaram que tinham combinado como ia ser, e essa combinação tirou a espontaneidade que, nas outras mesas, deu tão certo. Preparar-se para uma mesa é muito bom, mas combinar as jogadas torna o jogo sem graça.

E agora vou dormir.

Thursday, July 02, 2009

Fliperama I

Este é o curioso mosaico feito de livros, que forma o retrato de Manuel Bandeira, poeta homenageado. Curioso porque a imagem, a olho nu, quase que não se revela, mas na oto até que dá para reconhecer.
Aqui vão algumas frases pinçadas durante a sessão das 11:45
Domingos de Oliveira:
Não existe banalidade.
Estou convencido de que existe uma "terra dos romances prontos", o escritor deve ser capaz trnar-se leve para chegar lá.
O segredo da produtividade é acabar tudo o que se começa.
Meu amor não é meu, dou para quem quiser.
Toda obra de arte boa é de auto-ajuda. Se eu vejo um filme e ele não me ensina nada, é um mau filme.