Sunday, January 29, 2012

Água no feijão

Ninguém para botar água no feijão, que estou de volta! Mas não me importei, cheguei e fui comer feijão no Gula Gula, ô delícia! Brasileiro sente mesmo falta de feijão, né? E eu nem mesmo sou uma assídua comedora de feijão… Mas, quando viajo, volto com saudade dele, pretinho, temperadinho, quentinho, coisa mais boa! Principalmente quando se passa tempo jantando Doritos. Esse meu cardápio foi horrível, mas teve que ser, por conta do pé machucado, que não me permitia sair para jantar.
Mesmo assim, com esses senões, a viagem foi legal. Andei o tempo todo na minha moto de handicap, que aluguei, e vi como são importantes alguns detalhes que aqui no Brasil ignoramos: calçadas lisas e amplas, para permitir a circulação da motoquinha, rampas, portas amplas, nada de postes ou pedras no meio do caminho… Até me diverti. E acho que foi uma boa experiência para trabalhar literariamente: andar de muletas, o medo de ser derrubada, as dificuldades experimentadas. A questão da dependência. Mesmo sabendo que eram limitações temporárias, experimentar essas limitações me deu uma nova perspectiva. O mesmo com a leitura do Coetzee, Slow Man, do qual já falei.
Toda vez que viajo compro um "livro em CD", que escuto no carro. Geralmente compro um livro desses que não tenho certeza se vou gostar do autor, ou algum que esteja na lista de best seller, deixo os mais literários para a própria leitura. Só que desta vez não resisti e comprei um Murakami. Creio, no entanto, que cometi um erro: para começar, é um tijolo (são 38 CD's) Acho que vou ter que inventar uma ida a São Paulo de carro para ter tempo de escutá-los! Do jeito que eu dirijo por aqui, ou seja, cada vez menos, vou demorar uns dois anos para terminar esse livro IQ84 (acho que o título é esse, mas agora que escrevi, penso que talvez tenha cometido um ato falho e comentado  minha própria falta de inteligência ao  embarcar num projeto de escuta tão ambicioso). Contarei para vocês minha experiência, tão logo a comece, pois ainda estou com o pé imobilizado, nem posso dirigir…
O que vi? O que fiz? Parques da Disney, bichos de pelúcia imitando gente, gente imitando bichos e bichos de verdade nadando e pulando como gente. Not much. Mas muito divertido, e cheguei feliz. Acho que esta é a primeira vez que volto de viagem sem aquela sensação de depressão pós viagem. Voltei feliz por chegar. Talvez as peripécias do voo da volta tenham contribuído para isso: um problema no avião, volta ao aeroporto de Miami, pouso em área remota, rodeada de bombeiros, ambulâncias e carros de segurança, um grande teatro que alongou em mais de quatro horas a viagem. Mais coisas para contar, depois, como a história da velhinha que implorava ao piloto para descer. Ela desapareceu assim que chegamos no aeroporto, desistiu de voar. Só espero que não tenha vindo de navio, pois estes me parecem ainda mais perigosos que os aviões! Estou até agora impressionada com este navio tão moderno, naufragado sem mais nem menos! Em terra as coisas também não estão tão firmes: que absurdo, os três edifícios caídos no centro do Rio! Mal tive tempo para  colocar em dia as correspondências, ainda não terminei nem mesmo a leitura do jornal do dia, nem dos imeios atrasados, das mensagens facebucais, e toda essa parafernália.  Mas deixo aqui meu recado, minha mensagem de volta a esta terra onde encontro frio e chuva no meio do verão, para me deixar ainda mais confusa do que já sou!

Friday, January 13, 2012

Sexta 13, questionários e outras cositas más…

Sexta feira 13 e um trevo de 4 folhas (obrigada, Fafá!) combinam bem paca! Pesquisa de O Globo com perna imobilizada também! Filmes antigos e alguém de molho em casa, outra boa parceria. Livros? A toda hora, muitos! Visitas? Claro! Consegui ficar todos estes dias sossegada em casa graças a meus amigos maravilhosos que apareceram por aqui para dar uma força, à minha família e todas as suas providências, aos livros, aos filmes antigos na TV. Até a pesquisa de O Globo me deixou feliz! Melhor dizendo, me senti útil. Mas, em compensação, descobri como leio mal o jornal que vem me saudar todas as manhãs: Algumas seções eu nem sequer conhecia de nome! Que jornal é esse que recebo e que não leio? Espero que os entrevistadores não me eliminem da sua lista de pessoas a entrevistar. Posso ter outra doencinha, uma gripe, ou unha encravada, e vou gostar de ter o que fazer de novo… Mas quero que conste aqui que meu elogio para os cronistas foi para o Francisco Bosco. Não que eu não aprecie muitos outros cronistas do jornal. Desde a Cora ao Ubaldo, do Joaquim ao Jabor, tenho muitos cronistas que saboreio com prazer, cujos textos me estimulam e fazem pensar. Mas o Francisco Bosco, ultimamente, é o meu chocolate, meu bombom. Só que me dei conta: esta semana não encontrei o Chiquinho no jornal! Volta, Chico! Vem me encantar. O outro Chico vai me encantar quando eu voltar de viagem, nas apresentações extras em fevereiro (Obrigada, Isabella!) Mas o Francisco Bosco não pode abandonar as páginas de O Globo! Que cronista tão perfeitamente sintonizado com quem gosta de literatura!
Por falar em O Globo, publicaram uma resenha que fiz de Libido aos pedaços no blog do Prosa e Verso. Eu não conhecia o autor, mas ele me mandou, hoje, um imeio agradecendo, foi gentil.
Já que estou assim neste clima de faits-divers, aproveito para mencionar o livro da Nora Ephron que acabei de ler: Não lembro de nada. Eu sou fã da Nora, e descobri que fiquei fã dela desde o filme que ela diz ter sido um fiasco, Amor é fogo (Heartburn). Pois o Harry met Sally e It's complicated e You've got mail eu nem sabia que eram dela. Mas agora que sei, sou ainda mais fã dela. Acho que só sei que são dela os fiascos. Tem um outro que ela fez falando sobre suas irmãs, não é mesmo? Mas, como também não lembro de nada, não tenho certeza. E o clube das desquitadas? Também não era dela? Sinto muito, mas meu pé não vai me deixar ficar aqui tempo suficiente para consultar o São Google.
Bem, estou lendo muitas coisas ao mesmo tempo, e vendo muitos filmes. Por falar nisso, It's complicated estava na TV ontem à noite. E Dr. Zhivago. E, não ontem, mas anteontem, Lawrence da Arábia. Como vêem, estou de molho, mas tenho me divertido! E amanhã viajo! Depois eu conto.

Wednesday, January 11, 2012

Sex-age…

Já era para ter escrito este post há dias, mas tive um fim de semana acidentado. "A queda", nome de filme,  que, quando vira a dura realidade, nos deixa estropiados. Pois é. Caí, na real. Uma escada, um voo, falta de sustentação e lá estou eu, estatelada no chão, me perguntando como é que fui parar ali. Mas, dos males, o menor: ligamentos, apenas. Chato, demorado, mas nada que exija pinos, hospitalização ou maiores cuidados. Minhas mãos, porém, estão ocupadas com um par de muletas. E meu tornozelo condenado a 20 min de gelo a cada duas horas. Isto posto, voltemos ao meu assunto: sábado me diverti lendo o Geraldinho Carneiro, que chega aos sessenta anos munido de bom humor e cheio de vida. Parabéns, poeta! Mas quem é que pode acreditar na idade do Geraldinho? Fica difícil, não acham? Tão difícil quanto acreditar que a mulher de Canções (filme imperdível) tenha nascido em 1928. Como é possível que aquela mulher esteja com 84 anos?! Ela mesma levanta a possibilidade de haver um erro em seu "rezisto". Adorei as histórias, me emocionei, e chorei potes. Aliás, não faço nada a não ser chorar. Todos os filmes que tenho assistido me fazem chorar, por uma razão ou outra. Chorei em Imortais - de raiva! Que filme ruim! Chorei em O último pianista de Mao, embora tenha achado que era uma história muito fantasiosa. Chorei em Canções, com algumas emoções que as lembranças trazidas pelos sons suscitaram. Chorei em A guerra está declarada: Romeu e Julieta, com filho, só podia dar mesmo em tragédia. Chorei em Faça-me feliz: onde está minha capacidade de rir em comédias modernas absolutamente sem graça? Tão bobinha, tão bobinha…
Bem, agora minhas aventuras cinéfilas foram interrompidas, por força maior.  E eu, imobilizada na frente da TV, aproveito para ver filmes antigos. Arsenic and Old Lace. Uma comédia antiga, com um elenco de primeira. Imperdível. Portanto, despeço-me aqui, para ver a TV. E vivam os sex-age-nários!

Friday, January 06, 2012

Dia de Reis

Hoje é o dia da visita dos 3 Reis Magos. Quando era pequena, e montávamos o presépio, eu nunca o achava completo se os três reis – e seus respectivos camelos – não estivessem devidamente representados! Aliás, falando nisso, penso que esta é uma característica minha: preocupar-me com os coadjuvantes! Portanto, o meu presépio precisava de ter 3 reis, 3 camelos, pelo menos um anjo com uma tabuleta  "Hosana nas Alturas e Paz na Terra entre os homens de boa vontade." (Acho que eram estes os dizeres). Eu gostava muito da palavra Hosana, já não sei por quê…
Também precisava de uns dois pastores, meia dúzia de ovelhas, uma vaca, um burro, uma estrela com rabinho de cometa. Uma cabaninha, e a mangedoura, claro. Houve um ano, em que, já adulta e mais hábil em montagem de presépios, que extrapolei. Com o Guilherme, cujos presépios da infância também eram caprichados, juntamos musgo, criamos laguinhos e rios, um terreno acidentado cheio de rochas. Conseguimos árvores que compramos numa loja de modelos de trens e que estavam completamente fora de proporção com as figuras. Acho que, naquele ano, tivemos patinhos, mas posso estar enganada. Com certeza absoluta, tivemos uma orquestra de anjos que ostentavam instrumentos diversos como harpas e violinos, trombetas e cellos. Nosso presépio estava tão caprichado que, finalmente, chamou a atenção das crianças. O que foi muito bom, mas também decretou o fim da integridade das figuras (por sinal muito toscas) Os camelos ficaram lascados, os anjos sem instrumentos, ou sem asas, etc, etc. A partir daí o presépio, a cada ano ia se simplificando, com suas figurinhas coladas e patéticas encenando sempre a chegada dos Reis Magos. Que uns anos se aproximavam lentamente, por exigência das crianças, e outros se postavam logo ao lado do trio principal, e lá ficavam acumulando poeira e esperando não se despencarem das alturas hosanais. Depois, tudo acabou. Não fiz mais presépios, nem árvore. Ano passado, armei uma pequenina árvore. Este ano, montei um presépio simplificado na sala, armei uma árvore em Angra. Mas meu Natal já não tem mais encanto.  Já que estou neste clima de saudosismo, falo da árvore que montávamos: Eu pegava as crianças e fazia uma oficina de natal: Criávamos nossos enfeites. Anjos, bolas, guirlandas, tudo era feito por nós mesmos. Houve um tempo em que eles achavam essa a árvore mais linda do mundo: era obra deles, alguns enfeites eles guardavam de ano para ano, achando tão excepcionais que não queriam se desfazer. Acho que foi lá nos EUA que eles mudaram de opinião: as árvores passaram a ter enfeites comprados. Concordo que são mais lindas, essas árvores compradas prontas. Mas as que mais me encantaram foram aquelas que fizemos, carinhosamente.
As árvores do guloso do meu marido, quando ele era pequeno, eram enfeitadas com biscoitos embrulhados em papel "alumínio", como ele chamava, de diversas cores. Eram uns biscoitinhos bem gostosos, cobertos de chocolate e ele ia roubando os enfeites, um a um, enquanto olhava as luzinhas piscando, coloridas. Creio que minha sogra devia repor os biscoitinhos, sem que ele reparasse. Nunca tive coragem de fazer isso em nosso clima: medo de baratas, eu acho. Ou de chocolates melados pela casa. Nos EUA, usam aquelas bengalinhas de hortelã, mas só eu gostava daquela balinha e desisti de colocá-las na minha árvore, para evitar ficar comendo o que não devo.
Falei de árvores, e quase não falei dos 3 reis, cujos nomes Baltasar, Melquior e Gaspar, ficaram para sempre gravados em minha memória. Este ano, em que finalmente passeei de camelo, fico imaginando os pensamentos profundos em que deviam estar imersos durante a viagem. Pensamentos de esperança. Que esta esperança nos acompanhe, num tempo tão desesperado. Que o ouro, o incenso e a mirra não nos faltem. Riquezas, perfumes e temperos, facilitando nossa jornada… E que a lição, a linda lição de reis se curvando frente a uma vida que desponta, nos sirva a todos: respeitar a vida, em todas as suas manifestações!

Wednesday, January 04, 2012

Janeiro, 4.

Finalmente, dois dias de sol seguidos! Será que o verão já se instalou? Com sua carinha estremunhada de sol invernal, o dia me sorri, mas não promete grande coisa. Mesmo assim, aos primeiros raios, os cariocas e os turistas se animam e partem para as praias, crianças carregando seus baldinhos coloridos, presentes de Natal, talvez; mães arrastando sandálias gastas, que vão gozar sua aposentadoria nas praias… Eu me entusiasmei e comprei um biquini novo. Preto e branco, todo estampado de gaivotas, amigas que todos os dias escrevem belas frases no céu, sem que eu consiga decifrá-las. Não sei se vou chegar a usá-lo: enquanto escrevo o sol, preguiçoso, vai puxando sua coberta de nuvens e um ventinho zombeteiro assopra meus planos para longe.
Prefiro voltar aos meus textos sobre o Marrocos, minhas vinhetas. Vou escrevendo lembranças e revivendo um pouco a viagem, numa espécie de (eterno) retorno. Por falar em retornos, vejo que a notícia de hoje é que a NASA resolveu decifrar os mistérios da Lua. Pelos vistos, insatisfeitos com os programas que andam aparecendo nas madrugadas de pessoas insones, eles agora nos comunicam que a Lua eram Luas, que se chocaram. Com isso, me sinto habitante de uma bolinha de bilhar. Haja choques! Que a partida seja longa, e que o choque que nos levará à caçapa ainda esteja distante!

Tuesday, January 03, 2012

Pílulas de vida do Dr. Ross

A culpa é das aulas de linguística. Estudando funções da linguagem, aprendi anúncios que eram veiculados em bondes, no rádio e onde mais se veiculavam anúncios no passado. Agora tenho armazenadas na memória uma série de frases que vou misturando, não sabendo mais se as vi e li na rua ou nas aulas… Mas algumas guardei por desejar experimentar o produto anunciado. Não sei qual a verdadeira função das pílulas que menciono acima. Só sei que desejaria experimentá-las nesses dias que passo em "ponto morto", o coração ainda batendo, mas as engrenagens se recusando a me impulsionar para frente – ou mesmo para trás. Tomar pílulas de vida, viver em pequenas doses, receitadas pelo médico ou por alguma parenta "entendida em remédios", protegida dessa coisa que nos atinge com o impacto de um asteróide.
Esta noite, sem conseguir dormir, encontrei um programa que falava das crateras de impacto. Como agora sou "entendida no assunto", lá fiquei eu a madrugada, assistindo e rememorando minha viagem ao Marrocos.
Até a Lua, que nos meus tempos de colégio era fruto da revolução da Terra (fazíamos experiências com gotas de azeite em copos d'água), virou produto de um impacto. – Nosso universo era mais gentil, quando eu era criança… – Lá assisti eu à reencenação do asteróide, lento e enorme, chegando e se chocando com a Terra, que ainda era uma bola de fogo.  As grandes quantidades de partículas que se desprenderam da Terra formando um anel como o de Saturno e lentamente se juntando e criando a Lua, amiga que nos protege como um escudo e regulariza inclinação do eixo, marés, detalhes essenciais. E pensar que, em outro programa desses, fui informada de que nosso satélite, cansado de presenciar tantos descalabros, está se afastando lentamente de nós, e que eventualmente nos abandonará à própria sorte, em noites para sempre mais escuras, em oscilações erráticas como nosso espírito.
O Dr. Ross, ao inventar suas pílulas, talvez tivesse em mente essa situação de catástrofe, quando, desorientados e no escuro, tivéssemos como sustentáculo os círculos redondos que despejaríamos nas mãos e engoliríamos, com unção, um a a um, em homenagem à desaparecida… Vejam só as coisas que a linguística e a insônia me ensinam!

Monday, January 02, 2012

Só três palavras!

Recebi hoje o imeio de um amigo: Hora de trabalhar!
Apenas três palavras e vou conservá-las escritas na tela de meu computador, como um mantra para o ano de 2012. Vamos que ele se acaba mais cedo? Vou deixar tarefas incompletas e detesto isso! Portanto, volto a escrevê-las aqui no post:
HORA DE TRABALHAR!
                   HORA DE TRABALHAR!
                                      HORA DE TRABALHAR!
Trabalhar com a paixão do vermelho, com o entusiasmo do azul e a esperança do verde! Portanto, vou trabalhar, que já é hora.

Friday, December 30, 2011

Imaginações

Bem, vocês já me conhecem para saber que sou muitas, arlequinal como o poema do Mário de Andrade. 300 ou 350, ou mesmo milhares, fui criada dentro das crenças do mundo ocidental o bastante para saber que toda coisa boa tem seu lado ruim e vice-versa. Os deuses gregos me ensinaram isso com belos mitos, a mesma deusa que defende a castidade é a que protege o parto, para dar um exemplo não tão batido como o do deus que, padroeiro do comércio, presta iguais serviços aos ladrões. Sendo assim que meu gosto por imaginar coisas, se me constitui uma identidade como escritora, também mina minha necessidade de ação. O que imagino, muitas vezes, já não preciso fazer… Mas é esse me colocar no lugar dos outros que me permite criá-los como personagens, que sairão tanto mais verossímeis quanto eu conseguir imaginá-los. Seria esta a trama do romance do Coetzee? Acho que ele postula uma coisa mais sofisticada: os personagens criam sua autoria… Bem, no caso dele, acho que é um pedido de desculpas por ser assim, um descrente intrometido, de frios olhos analíticos, incapaz de amar. Neste romance que li, Slow Man, encontro uma verdadeira confusão sobre o amor, que nem o "retardado", nem a pretensa autora, nem ele mesmo conseguem apresentar. Mas não o culpo: olha que já tem uns dois mil e quinhentos anos que vamos tentando descobrir o que é isso, e nada! Ainda esbarramos em nossa incapacidade de definir o Amor. Eros e Psiquê, apaixonados para sempre, mas incapazes de se conhecer, aqueles danadinhos dos gregos antigos já nos haviam avisado…
E, no entanto, o que é que me toca no romance? A desesperada necessidade de amor de todos os personagens, principalmente daqueles que, já no ocaso, podem até desejar se enganar com um simulacro, mas que sabem muito bem que não se confunde amor com atenção, carinho ou seja lá o nome que se possa dar a esse sentimento meio doméstico de uma velhice acompanhada…
Sei que lido mal com minha viuvez: até hoje não me conformo e tenho raiva de continuar vivendo uma vida que agora me parece "mais ou menos", uma vidinha medíocre na qual deixei de representar o papel principal para transformar-me em coadjuvante. Onde está aquele que me iluminava e me aquecia com seu olhar? Se eu fosse outra, acho que teria saído a procura de alguém que substituísse os holofotes que se apagaram. Mas, leitora de Coetzee, como me satisfazer com simulacros? Mantenho-me, como o personagem amputado, recusando próteses e odiando meu ser incompleto.
Mas não vim aqui falar dessa Lúcia, que pode ser tão irreal quanto as outras que me habitam. Vim falar de outra coisa, muito diferente, de uma conversa que escutei por acaso, mulheres comentando o programa da Ana Maria Brega. Alguém se declarou no Bateau Mouche em Paris, tudo devidamente filmado e mostrado pelo programa, e uma das mulheres que conversavam dizia que esse era o sonho da vida dela! A outra disse preferir que a declaração fosse à meia-noite, sob o luzir dos fogos de Copacabana… Bem, confesso que estou editando um pouco o que ouvi, para pegar meu assunto pelo pé.  
E o pé é que fiquei me imaginando nas duas situações, querendo saber o que mais me agradaria. No Bateau Mouche certamente que não: fica muito bem na foto, mas conheço bastante aquilo lá para saber que esse barquinho só é bom em dia de chuva e frio em Paris. Bem quente, passeando suavemente pelo Sena, nos permite tirar uma ou outra foto e descansar as pernas cansadas de andar. Que ninguém suponha que vai ter um jantar romântico  e especial naquela armadilha turística!… Mas Paris tem seu charme, ser surpreendida num banco de praça com uma declaração deve ser muito bom! E já embarco numa fantasia completa: uma daquelas antigas livrarias que estão acabando, numa seção de poesia: ele retira um livro da estante, começa a ler um poema, um daqueles que eu mesma não saberia escolher, mas que passaria a fazer parte de minha vida para sempre. Depois, é claro, um afago, simples. O livro fechado numa das mãos, a outra estendida tocando o rosto dela (já virei personagem, nesta altura), delicadamente, contornando os lábios que ela separa sem nem mesmo perceber. Depois, puxando-a para si, ele murmura eu te amo dentro da boca da amada, como se estivesse lhe insuflando vida. Seu abraço se prolonga, mas é cheio de emoção pura, elevada. Ela, instintivamente, sabe que sua relação com ele, a partir desse momento, é mais séria, é uma união. E, antes que eles se separem, ela, com a cabeça escondida no peito dele o escuta perguntar: Você quer se casar comigo? Pergunta que ela não vai conseguir responder com palavras, mas com toda a vibração do seu ser, com nervos, sangue e alento que agora passam a fazer, com ele, um organismo único, inseparável!
Acorda, ó escritora! Será que alguém ainda diz essas coisas nos dias de hoje? As livrarias, tenho a triste certeza, já não estão mais de pé. Ou quando estão, têm mais telefones e kindles para vender que livros em belas encadernações de couro… Vejo no que escrevi o ranço do neoplatonismo, que me fez unir os seres num só, como se o casamento fosse o encontro com sua metade alienada. Cai na real, minha filha! Experimenta o cenário de Reveillon. Mas aí é preciso ser jovem, ter boa audição (como escutar uma declaração de amor no meio do espoucar dos fogos?) Ele tem que ser mais histriônico, gritar seu amor na frente de todos, e, otimista, não se preocupar com um possível assalto na hora de faíscar o anel em frente aos olhos de sua bela. O amor dos dois talvez tenha apenas a duração e intensidade dos fogos. É o suficiente. Afinal, 2013 já está se anunciando e ela vai precisar de mais emoções no próximo ano. Se não for outro amor eterno enquanto dure, será a maternidade, anunciada na praia ou na mesa do La Mole, restaurante que se orgulha de fazer parte da vida de seus clientes.
E assim vou me distraindo da solidão, me conformando com a mediocridade da vida singular, e sobrevivendo a essas datas de tanta loucura, de tantas manifestações…

Wednesday, December 28, 2011

Que livro é esse?

Algumas coisas que leio me remetem a livros fantásticos. Hoje, por exemplo, na coluna do Francisco Bosco (pelo qual professo a mais absoluta admiração) leio: ""li um livro que me fez largar o emprego, mudar de cidade e resolver estudar literatura". Não foi o cronista, mas um colega de turma que se apresentou desta maneira. Um colega de turma que se ficcionaliza tanto quanto a Francesca de Dante, condenada ao inferno por causa de outro livro, tão tentador que lhe fez abandonar os mandamentos, mudar de amante e mergulhar no inferno das grandes paixões.
Num poema que escrevi há muito tempo, imploro à Francesca que me revele o nome do livro, pois já tenho os dedos descarnados de tanto folhear as páginas à procura de semelhante turbilhão. Pelos vistos, o James, que devia ser professor do curso sobre romantismo, o encontrou. Um livro que muda nossa vida, que nos arremessa como uma folha num dia de vento, para cima, para baixo, e de simples e decadente folha seca nos transforma em pássaro, nos eleva, nos mostra o mundo sob outra perspectiva que nunca mais poderá ser esquecida.
James, Francisco, Francesca que livro é esse?
Estou bem grandinha para desconfiar que cada qual tem o seu. E talvez não seja o livro em si, mas a chave que trazemos conosco que nos abre a porta da paixão. Li e reli a história de Lancelot, em diferentes versões. Eu não tinha a mesma chave de Francesca. Não tinha ao meu lado alguém, trêmulo de desejo, que me beijasse a boca. E, se tivesse, será que teria correspondido ao beijo? Duvido. Para mim, os versos de Dante são mais tentadores que a história do herói e de sua rainha adúltera.
Estou, também, desconfiada, de que talvez esse "livro" mítico que procuro tenha sido encontrado por mim antes mesmo que eu tivesse a noção de que ele mudaria a minha vida. Não precisei abandonar tudo e mergulhar num ímpeto porque fui seduzida, ainda criança, por uma flauta melíflua e doce que me levou para reinos encantados, onde anseio habitar.
Ontem, trocando mensagens com um amigo, lhe confessei que meu maior sonho seria ser personagem, viver dentro da proteção da capa de um livro, habitante de uma estante onde tivesse vizinhos fascinantes. Ele me respondeu –ah, esses homens e seus hormônios simplificadores! – que isso era fácil, que somos aquilo que escrevemos. Somos? Mas quem somos? Se o que aflora em nossa escrita é o não-dito, como nos reconhecer? Se o que desejamos é trocar de identidade, como ser aquele pelo qual nos trocamos? Damos um pouco de nós a cada personagem, mas eles não nos representam. Nem mesmo quando escrevemos em primeira pessoa, num diário ou numa confissão, logramos ser aquele que surge do mar de tinta, como uma vênus, ou um monstro marinho.
Volto a citar Francisco Bosco: "A experiência da leitura não se esgota ao fim de sua atividade: prolonga-se depois de fechado o livro, instala-se na mente do leitor, transformando-a, e assim confunde-se com a sua vida, transformando-a também."  Tudo o que lemos nos modifica, tudo o que escrevemos nos constrói, e assim, seres em construção, em permanente transformação, multiplicamo-nos e nos transformamos em enigmas. Se podemos, ao olhar a foto de um bebê, proferir a frase "esse sou eu" e não provocar a risada de todos os que nos escutam, é porque aprendemos a ampliar nosso ego em milhões de seres e de imagens que, em algum momento de nossas vidas nos representaram ou representam. Se Flaubert pode dizer que "Mme Bovary c'est moi" é porque ele também descobriu o que Rimbaud, aos 15, nos ensinou a todos: "Je est un autre". Esse mesmo Rimbaud, que, num par de versos, fez o Bosco conhecer o que é verão, também me fez, em outros conhecer o que é a dor. Mas, em nenhum momento, experimentei a dor lida. Conhecer, experimentar, ser: com uma gama tão complexa de avaliações, continuo a me perguntar que livro é esse? E sigo com as leituras, gastando olhos e dedos… 

Monday, December 26, 2011

Por que é que eu invento?

Quando era pequena, fui muitas vezes censurada com esta pergunta: "por que é que você inventou de fazer isso?" Minha família, que parecia saída de um conto de Dickens, não achava muita graça nas minhas "invencionices", que sempre pareciam dar errado. Mas continuei inventando e descobri que, muitas vezes, as "invencionices" dão certo. Só que  desta vez deu errado: quis mudar tudo na ceia de Natal, e estou aqui com cara de Scrooge que não se arrependeu a tempo. Não comi a ceia natalina pela qual esperei o ano todo, nada daquelas coisas tradicionais, e agora vou ter que esperar pelo ano que vem! Mas, acontece, que anunciam que o mundo vai acabar antes. Nevermore, quoth the raven! De Dickens para Poe, assim vou mal. Mas ainda posso piorar: estou lendo Coetzee, vocês já sabem, o escritor que amo odiar. Estava até fazendo as pazes com ele quando o danado começou a fazer troça de mim. Bem, achei que ele estava falando comigo e me zanguei. Mas não vale muito essa minha zanga, não no dia de hoje, pois a chuva influencia o meu humor. Passei da mais completa euforia, de dias azuis e de sol, para torrentes de chuva, se despejando incessante sobre meu paraíso. Desisti de minha "favela chique" e voltei para o Rio, atravessando engarrafamentos, acidentes, toda aquela rotina de sempre. De sempre não, dos últimos dias. Como na igreja, e nas profecias. Agora me pergunto: Por que é que eu invento? Mas respondo: graças aos céus que invento. Assim se suporta um pouco melhor o desespero e o desalento que essa época de festas semeia em nossos corações, por baixo de tanto brilho e de papéis laminados. Minha ceia não deu certo, confesso. Não suportei o tal pernil de vitela, que eu já de antemão sabia que não iria comer. Me desapontei com o bacalhau, diferente do de minha sogra, reconfortante como uma certeza. Me surpreendi com a falta de receptividade de minhas rabanadas, sempre disputadas e consideradas as melhores do mundo (pela família, é claro) que, desta vez, alegou uma ojeriza pelo doce que provoca males nunca dantes suspeitados. As castanhas sumiram na geladeira, as saladas ficaram esquecidas e a única que agradou serviu também de estopim para desavenças. Sobrou o salmão, o champagne geladinho, sem os quais a família teria passado fome. Acho que aprendi a lição: se houver Natal em 2012, não vou inventar moda. Ou talvez possa servir somente o salmão…

Sunday, December 11, 2011

No meio do caminho

Ao contrário do que seria de se esperar, conhecendo-se minhas preferências literárias, não estou citando Drummond, e sim a crônica da Marta Medeiros de hoje. Acho que nem sequer estou citando corretamente, pois ela falava do meio da vida, avisando-nos de que, fossem quais fossem as perdas, a morte só ocorre no final. A Marta é sempre positiva, e não admira que tenha uma legião de admiradores. Meus amigos acham que sou assim, sempre para cima, sempre alegre… Mas aí lêem o que escrevo e ficam assustados. Eu mesma, às vezes, me assusto! Já estou no terceiro conto de Natal, e cada um saiu mais triste que o outro. Logo eu, que sofro da síndrome do Coringa, e estou sempre com um sorriso no rosto! Que histórias são essas?! Não sei, eu também me pergunto. Vai ver que sofro de dupla personalidade.
Já ouvi vários comentários diferentes e interessantes sobre Anunciação, meu conto na Bravo de dezembro. Uma amiga falou em viuvez, outras em esquizofrenia, outras em aborto. Já levantaram discussões sobre religião, sobre TOC, sobre caminhadas matinais e falta de potássio. Já falaram em ritmo, em imagens, em cortes cinematográficos. No entanto, numa coisa, todas, sem exceção, concordaram: é um conto muito triste. Acho que sou uma pessoa envergonhada de ser triste. Mas, na hora de escrever, me revelo. E, no entanto, essa tristeza que é minha, não me identifica. Mistérios da escrita: nada nos revela mais, nada nos esconde mais. Se me procuram no que escrevo, não estou lá. Mas nunca sou tão verdadeira como quando escrevo. E aí? Como solucionar esse mistério?
Outra coisa no meio do caminho de hoje são as sombras na foto do calçadão. Que maravilha de foto! Proustiana, eu diria. Cada pessoa, pequena em seu instante, projeta uma sombra longa, definida e expressiva. Somos esses mistérios, seres de vida ambivalente, pertencemos ao tempo e ao espaço. O que somos no presente não pode nos definir completamente pois também somos o que já deixamos de ser, e o que ainda não fomos. E essas miragens são mais definidas, embora impalpáveis, precárias. Basta uma nuvem para que tudo se desfaça… Parabéns ao Chico Lima, autor da foto.
Durante um tempo, essa que já não sou quis se assinar Lucia Lima. Na verdade, lucia lima, pois tinha lido e.e.cummings e estava encantada pela possibilidade das minúsculas. Nesta época tinha uma letrinha redonda e desenhada, o nome ficava simpático, com as letras bem juntinhas. Mas, depois, conheci o Guilherme e me apaixonei. E adotei o Bettencourt como minha identidade. Sempre assumi este nome como de origem francesa. Agora, nesta viagem, minha companheira de excursão, Gisela, da Bavária, me perguntou por que meu nome era alemão. Admirei-me, mas é uma possibilidade, e faz mais sentido do que em francês, idioma que exigiria adaptações para a tradução do nome. Bet, betten, court, tudo faz sentido em alemão, ela me garantiu. E assim, no meio do caminho, descubro que sou outra, diferente da que eu pensava. Vejam as sombras que projetamos, e que precisam ser lidas e esclarecidas para nós mesmos. Encontrar surpresas, reinventar-se no meio do caminho, dividir-se ou multiplicar-se. Seres em processo, sempre em alteração, até que, de repente, tudo se cristalize numa imagem que aos poucos vai se esfumando…

Friday, December 09, 2011

Coisas de esquecer

Passamos nossa vida nos treinando a "não ver". Quantas vezes dizemos a nossos filhos: não olha, segue em frente? Pessoas dormem nas calçadas da cidade e a gente passa fingindo "não ver". Homens e mulheres montam suas banquinhas de jogo de bicho e a gente  pretende "não ver". Crianças fazem malabarismo nos sinais e nossos olhos os desfocam, ou nos procupamos com as crianças dentro de nosso próprio carro que olham para aquilo e não entendem. Fazemos que não vemos e ensinamos nossos filhos a não ver, também. E pagamos um preço alto por isso. Vamos perdendo nossa humanidade. 

Coisas de admirar

De vez em quando me admiro de coisas assim: basta um acidente de carro para a cidade parar. Como é que pode isso? Alguém me explica? Há uns anos atrás a cidade parou por conta do incêndio do Zona Sul. Semana passada a Av. Brasil, às 3 horas da tarde de uma quarta-feira, parou por conta de 2 carros enguiçados e um acidente. Somos reféns do nosso trânsito, uma coisa inexplicável!
Hoje, antes de abrir esse post, estava olhando as fotos que tirei no Marrocos, e relembrando as ruas e estradas por onde passei. Buracos? nenhum! Já aqui, na Voluntários da Pátria, sempre que passo, me lembro da música dos Beatles (a day in life) por conta dos 4000 holes… Quatro mil buracos? Acho que são mais do que isso.
Andamos de um lado para o outro no Marrocos sobre estradas impecáveis. Viajamos de trem cuja primeira classe, pelo menos, era decente. Não era nenhum TGV, mas estava lá no horário e oferecia conforto básico. Aqui, mesmo que queiramos ir a algum lugar de trem, não existe a opção.
Houve um tempo em que o Rio não vivia sob a ameaça de epidemias de dengue. Um tempo em que as pessoas saíam para namorar à beira-mar. Em que fazia calor nos dias de verão, mas ao fim do dia tudo refrescava, com uma chuva que quase nunca alagava, embora fosse fortíssima. Devia ser nessa época que uma canção italiana, meio saudosista, fazia sucesso Era d'estate, poco tempo fa… Pois é isso. Era verão, faz pouco tempo, e as coisas pareciam melhores. Será que ainda dá para consertar?

Tuesday, December 06, 2011

Estou tentando!

Sei que às vezes é difícil seguir as resoluções, principalmente quando tomadas em épocas como esta: fim de ano, agenda cheia, muita confusão para administrar. Mas estou tentando. Escrevi uma coisinha para minha amiga Tatiana, mas acho que ela não gostou. Não me disse nada, portanto, se leu, não gostou. Mas talvez ela esteja viajando, e não tenha lido ainda. Estou torcendo para ser isso.
Também escrevi um conto de Natal, mas não me satisfez. Natal na África, foi o título que dei. Gostei, mas não era esse o conto que queria escrever, gosto de umas coisas com mais espírito natalino. Esse conto que escrevi era exatamente sobre a falta de espírito natalino, a indiferença com a data. Eu procuro milagres. E, como nunca os encontro, procuro, ao menos no Natal, escrevê-los.
Hoje comecei outro, mas tive que ir ao dentista, e duvido que seja capaz de escrever um conto de Natal com a boca anestesiada. Deixo para amanhã. Ou, ao menos, para quando passar a anestesia.
Abro minha caixa de correspondência com a esperança de quem acha que vai ganhar presente. Mas não ganho nada. Poucas mensagens eletrônicas. E, no correio tradicional, só as boas festas dos entregadores de jornal e de revistas. Além das contas, é claro.
Mas sou uma pessoa que se encanta com os sucessos de outras pessoas: Uma amiga que arranja um namorado e parece feliz, uma nova amizade cheia de boas ideias e de projetos, uma criança que lê com desembaraço e encantamento, um amigo que se restabelece de uma doença, a delicadeza de uma outra amiga que me traz fotos do Harar, um convite para uma sessão de cinema, são coisas que me alegram, me deixam encantada por me sentir rodeada de pessoas especiais.
Daí que chego à conclusão de que vou continuar escrevendo, tentando me disciplinar, mas sem podar essas coisas que dão sentido à minha vida. Pois é assim que funciono. E me volta a esperança de que alguma coisa especial vai-me acontecer, que uma mensagem chegará, que alguém vai aparecer, que as coisas vão melhorar. E, caso nada aconteça, vou fazê-las acontecer por escrito.

Monday, December 05, 2011

Já é dezembro!

Dezembro chegou e eu ainda não escrevi meu conto de Natal. Gosto de escrever contos de natal, mas este ano ainda não tive tempo. Na sexta-feira (esta sexta-feira, dia 2, que já me parece tão distante como se tivesse ocorrido há um ano) estive com alguns amigos na festa de aniversário da SHAHID. Três aninhos! Parabéns, Valéria! Lá recebi um conselho: tenha foco. Não deixe que seus múltiplos interesses lhe atrapalhem, concentre-se em fazer aquilo que você mais quer. Na verdade, ninguém estava me aconselhando, era uma conversa, tipo: "Já repararam que os escritores famosos, como o Hemingway, são obsessivos? Tudo é matéria para seus romances, eles não saem por aí estudando física quântica ou perdendo tempo em especulações sobre a economia"… Eu é que traduzi a conversa para mim mesma: foco! Concentre-se. Dos vinte e cinco mil projetos em andamento, escolha dois ou três e dedique-se a eles. Por que é que você vai ficar lendo coisas que não vão lhe servir para nada? Porque é que você fica se deliciando com historinhas sobre Paris ou romances de amigos, ao invés de escrever suas histórias sobre seus personagens? Mas não quero abrir mão de meus prazeres. Vou-me deixar tentar por livros diferentes, vou passear com uns e outros, vou continuar dando minhas aulas, mas vou arranjar tempo para escrever todos os dias. Todos, eu disse! E começo hoje mesmo! Vou escrever!

Sunday, December 04, 2011

Belo monte

Recebi um link e até compartilhei no Facebook: artistas questionando a hidrelétrica de Belo Monte. Concordo, sou contra essas obras grandiosas que são feitas à custa de grandes sacrifícios ecológicos. Até hoje não perdoo o desaparecimento de Sete Quedas para a construção megalômana de Itaipu Binacional. Tenho horror até de pensar na transposição do Rio São Francisco. Fico arrepiada ao ver as construções de enormes edifícios à beira da baía de Ilha Grande, que, com seus esgotos mal feitos, vão poluir as águas daquele paraíso, como já poluem a paisagem. Sofro com essas agressões, grandes e pequenas. Procuro olhar para o outro lado quando passo por Angra I e II e III e sei lá em que número vai. Me arrepio de pavor ao pensar nos pesadelos do pré-sal. Por isso, louvo a iniciativa dos artistas que questionam e fazem o que podem para chamar a atenção para as incongruências do Belo Monte (e olhem a coincidência com Canudos, vem aí uma tragédia anunciada). Mas a pergunta que não quer calar é a participação da Maitê no vídeo. O que é aquilo? Por que Maitê tem que tirar o soutien? Por que tem que tirar a blusa? O que deu nela, moça tão bonita, que virou essa coroa exibida e desinibida? Sei não, mas parece que, ao invés de estar contra a represa, ela parece estar se preparando é para mergulhar nas águas represadas… Vai ver ela tem um plano secreto, será?

Tuesday, November 29, 2011

Crateras

A conferência a que compareci era sobre Crateras de Impacto. São as tais crateras que se formam quando caem grandes asteroides sobre a terra. Minha companheira de viagem,  Dra. Gisela Poesges é diretora de um museu localizado no centro de uma cratera dessas, lá na Alemanha, em Nördlinger Ries.  Basicamente, o que aconteceu por lá foi uma história e tanto: um grande asteroide atingiu a região com uma velocidade de 20 km por segundo. Com toda essa velocidade multiplicada pelo seu peso (que devia de ser considerável, creio eu) esse asteroide penetrou cerca de 700 metros pela terra a dentro, atravessando camadas terciárias de argila e areia, Jurássicas de calcáreo e Triássicas de arenito, e provocando ondas de impacto nas camadas de granito e gnaiss bem lá no fundo (uns 4.500 m). Mas este é apenas o início da história: nuvens de vapor e de rocha se elevam, o solo reage e se eleva, uma chuva de pedras e de rochas derretidas cai sobre a região e forma-se um lago salgado que logo (em termos geológicos, algo como 1 a 2 milhões de anos) passa a ter vida, e que em mais 2 milhões de anos vira um lago de água doce, atraindo toda espécie de fauna. Esta cratera foi identificada como uma cratera de impacto nos anos 60. Pelos vistos, nem todo mundo estava experimentando o Flower Power, havia quem se interessasse pelo Rock and Asteroid Power.
Mas a região, a julgar pelos folhetos que recebi, é um encanto: Cheia de castelos, e muito fértil devido a essa riqueza de rochas misturadas e amalgamadas, existem traços de presença humana desde a idade Paleolítica. O período romano, uma era "Alemana" e outra "franconia", a idade média, todos esses períodos deixaram seus traços arqueológicos na região, que tem 9 castelos e conventos e inúmeras igrejas, e muitas ruínas mais antigas.
Estou doida para ir para lá, ver ao vivo essa região de gente simpática, bons vinhos e de traços históricos. Mais um encanto da Alemanha, país sedutoramente rico e belo.
Muito técnico este post? Talvez, mas não resisto a mostrar meus novos conhecimentos geológicos. Nunca mais serei capaz de olhar para a paisagem sem imaginar um pouco as forças que se combinaram para formar as doces colinas, um terreno plano se estendendo até o horizonte, ou os contornos serrilhados de uma serra. Isso já me assaltava quando ia visitar a Terceira. O centro da ilha era uma cratera, segundo me informou meu marido. Ali havia (deve haver ainda) locais onde uma fumacinha, com cheiro a enxofre, se escapava. E lá visitei uma caverna, com um rio subterrâneo, e muitas plantas.
O prato típico de uma região açoriana é cozido em buracos cavados nesta terra ainda fumegante e quente. Colocam-se os ingredientes na panela, embrulham-na bem, e enterram-na a uma determinada profundidade. Em cima de tudo, colocam uma vara espetada, com uma bandeirinha de cor e formato que a identifique. Exemplo: a verde triangular pertence à Maria, enquanto a rosa retangular é da casa da Aninhas. Isso tudo de manhã bem cedinho, antes de irem trabalhar na lavoura. Passam o dia trabalhando e no fim da tarde as famílias desencavam seus cozinhados, e fazem ali mesmo seu convescote, com um saboroso pão saloio, e talvez algumas fatias de queijo para complementar. A bebida pode ser o vinho da terra, pois lá nas ilhas eles cultivam umas uvas parecidas com nossas antigas uvas, de carninha mole. Mas também pode ser leite, tirado das vacas que pastam disciplinadamente dentro de pastos divididos e subdivididos com capricho, formando uma espécie de tabuleiro de xadrez em diversos tons de verde. Ou mesmo água mineral, pois não faltam fontes por lá. Eu sempre me maravilhava com essa região, que me parecia meio desolada, mas que tinha uma vida rica, interessante. Minha cratera preferida era a do Monte Brasil, um vulcão pequenino, com cara de vulcão de ilustração. Ali na sua cratera, muito verde, meu marido jogava futebol. Acho que foi lá que ele aprendeu a amar o meu país. Pudera, ia jogar futebol no Brasil e morava na rua Rio de Janeiro. Guilherme nasceu para ser brasileiro! Mas me deu o grande amor e carinho que tenho por Portugal e Açores.

Monday, November 28, 2011

E essa agora?

Descobri, somente agora, que tenho muitas estatísticas quanto ao meu blog. Que máximo! Tem gente à beça pelo mundo afora visualizando meu blog. Espero que todos esses visualizadores estejam entendendo, pois minhas postagens são feitas em português, língua de muitos, mas que já não tem mais o caráter universal que teve nos séculos XVI e XVII. Li, não sei onde (provavelmente no romance Shogun, será que alguém lembra?), que era essa a língua de comunicação pelo mundo afora, pois os navegadores portugueses tinham transformado o mundo numa "aldeia global". Iam daqui para lá e de lá para cá, e foram disseminando sua língua, na qual ensinavam as artes e os segredos de marinharia… Por falar em leituras, li hoje a reportagem sobre o José Olympio, o grande livreiro do auge da literatura brasileira. E li o livro Cartas perto do coração, que me deu um grande desejo de viver num tempo assim, em que escritores eram tão amigos, amigos irmãos, se ajudando mutuamente, se comentando, se encorajando contra a indiferença dos editores… Caraca, já naqueles tempos os escritores sofriam e rangiam os dentes, na tentativa de conseguirem ser publicados. Uma vez publicados, no entanto, havia um público muito maior.
Continuando minhas leituras, vejo que a OI Futuro mete os pés pelas mãos com relação a exposição de fotos programada. Não conheço a fotógrafa nem as fotos, mas sou, por princípio, contra a censura. Porém confesso que me incomoda um pouco saber que esta fotógrafa fez fama e fortuna clicando drogados e mendigos. Sei não. Me cheira à exploração terceiro-mundista. Sabem aquelas fotos maravilhosas de criancinhas mutiladas pela guerra e de gente morrendo de fome em campos de refugiados e outras fotos do tipo que nos comovem com facilidade e que fazem a fama e a fortuna de quem esteve lá no inferno mais preocupado com o foco do que com a situação? Sei não. Acho que essas fotos deveriam sustentar fundos de auxílio, e não dar fama e prestígio à ninguém. Mas todos nós temos nosso lado mórbido, que se deixa fascinar por fotos de prostitutas drogadas e de pessoas soterradas pelo mundo e pela dor, desde que bem focadas. Aquele que vira o rosto para o outro lado ao passar por um acidente de carro que atire a primeira pedra. Eu olho. E vejo as fotos e fico indignada, mas nunca fiz nada para melhorar aquelas situações. Mea culpa. Mea maxima culpa! Portanto, não recrimino, mas desconfio da fotógrafa e de mim mesma. Que tipo de pessoa sou?
Vejo que estou há duas semanas sem escrever no blog, mas não consegui conexão. à duras penas consegui postar no Facebook as fotos que tirei no Marrocos. Nem todas saíram boas, mas fiz uma reportagem bem completa da viagem. E fiz amigos novos. E aprendi coisas fascinantes. E estou feliz por ter ido, e voltado. E gosto de estar de novo na minha farrinha cotidiana: leitura, escritura, conversas e lançamentos, com essa sensação de tempus fugit, que o ano já termina e que já estou comprometendo os dias futuros, com planejamentos que se estendem quase até o final do próximo ano. E essa agora? Estou vivendo no futuro, sem passar direito pelo presente…

Tuesday, November 15, 2011

Banquete em Casá

Hoje é dia do banquete de encerramento do Seminário. Sim, estou aqui de penetra num seminário de Astrogeologia, e amanhã bem cedo partiremos num fieldtrip: até telescópios iremos visitar, para olharmos as Leonides, que suponho deva ser algum lugar de origem de meteoritos, pois aqui, quem não está interessado em meteoritos está estudando as crateras que eles formam ao cair na terra. Um barato. Já encontrei gente de todas as partes do mundo, do Havaí a Berlim, da França à Arábia Saudita.
Por falar em Arábia Saudita, não sei se já contei que o rei de lá tem um lindo palácio aqui pertinho do meu hotel. E, como o rei de cá mandou construir uma mesquita com um centro cultural, ele fez o mesmo em sua propriedade. Uma linda mesquita, com uma biblioteca. Só não sei se tem um Hammam, também.
Ontem gostei tanto do passeio ao souk (é assim que se escreve) do Habous, que hoje voltei lá. O dia está lindo, e deu gosto passar a manhã escolhendo quinquilharias que me fascinaram e que agora vão ser um saco transportar para o Brasil. Comprei vidrinhos, copinhos e mais óleo de Argan. Imaginem agora arrumar vidrinhos na mala… Só mesmo eu e minha falta de espírito prático. Mas tomara que cheguem bem lá em casa! Também comprei uns sapatinhos que já vêm com chulé, especialidade daqui. Sabem como é, são novinhos, mas o couro tem aquele cheirinho peculiar. Mas são tão lindos, não resisti.
Preciso ir, agora. Se tiver mais novidades, conto depois.

Monday, November 14, 2011

Chove em Casablanca

Depois de dias e dias de sol e calor, hoje o tempo esfriou. Chove, uma chuvinha miúda, mas a cidade não diminuiu sua animação por causa disso. E o trânsito não parece pior que nos outros dias. Isso aqui é meio caótico em termos de trânsito. As pessoas avançam sinais, os pedestres ziguezageiam no meio das avenidas cheias de carros que, na maior sem cerimônia, avançam pela contramão, uma loucura. Mas as buzinas são raras e ainda não vi nenhum acidente, graças a Allah, que tudo pode e comanda, dos céus, uma legião de esfalfados anjos da guarda, protegendo os pedestres. E os marroquinos continuam sorrindo e atravessando as ruas, despreocupados. De vez em quando vejo alguém brigando (ou não, essa língua que não compreendo me impede de saber se estão brigando ou comemorando alguma coisa) e depois se separam sorridentes, cada qual para o seu lado.
Hoje fui, com Roberto, fazer compras no Habous, um suk (?) muito legalzinho. Mais tranquilo, sem uma montanha de gente, com vendedores simpáticos e suas mercadorias empoeiradas, passamos uma agradável manhã, e nem nos cansamos. Para chegar até lá, foi uma verdadeira volta pela cidade. O motorista nos levou por caminhos bonitos, todos de casas espetaculares. Esqueci de mencionar a famosa casa giratória que vimos na primeira manhã aqui em Casá ( é assim que o pessoal daqui chama sua cidade). Hoje passamos por ela uma outra vez, mas notamos que está desabitada. Pudera, deve ser esquisito morar numa casa giratória…
Passei por uma padaria local, por uma confeitaria, por uma loja de tapetes. Esse Habous fica perto de uma mesquita bonitinha e muito próximo ao palácio real, portanto é um lugar bem cuidado. Gostei mesmo do passeio e das vistas. Agora vou encontrar com o pessoal da conferência, que está voltando da universidade. Não sei o que vamos fazer à tarde, mas preciso dizer que, mesmo debaixo dessa chuvinha miúda e com esse ventinho mais fresco, Casá nos acolhe e recebe bem.