Friday, July 27, 2012

Eu é um outro

Fui ao Rimbaud, ontem à noite, e gostei.
Dividido em 3 partes, mas as três funcionando juntas, ainda comporta um 4º nível, no qual os atores dialogam com a plateia e entre si.
Temos uma vida, bem simplificada, de Arthur, com destaque para alguns poemas e o caso com Verlaine. Um episódio, verídico, que retrata a censura à publicação de Uma temporada no inferno, por represália ao Ênio, que na peça é chamado de Henrique. E um caso passado na França de 2005, o caso Thierry, homossexual abandonado pelo parceiro e que dá guarita a um jovem de origem argelina, que entra em sua casa para roubar 90 euros. E as discussões entre os atores e a plateia, e um inflamado manifesto pela educação. O que costura os episódios? Num dos casos, a censura, noutro o homossexualismo? Seria tão simples assim? Fiquei achando que perdi alguma coisa…
Gostei muito dos atores e em certos momentos achei o jovem Rimbaud muito bom. Ele peca por ser muito simpático, no entanto. Rimbaud provocava, exasperava, obrigava todo o mundo a reagir. O que a gente não entende é quando ele fica quieto. Pois esse comportamento irritante inicial é muito similar aos jovens com algum tipo de distúrbio mental, que insistem, invadem, perturbam nosso cotidiano. Quem já teve um parente ou amigo com um determinado tipo de depressão, dessa que exige um público para sua infelicidade agressiva, sabe o que estou falando. Nem sei se o nome certo é depressão, para este tipo de doença, mas sei que existe e que leva as pessoas a fazerem bobagens, como geralmente se diz. A jovem que engravida, por exemplo, e que é forçada pelos pais a abortar, e depois foge de casa, vai viver numa comunidade hippie, se droga, anda com gente "abaixo de sua classe social", escuta rock, é presa, etc (essa é a descrição de uma personagem secundária do romance Serena, do Ian MacEwan, que estou lendo). Os roqueiros como Jim Morrison seguem este padrão. Viver no limite, afrontar costumes burgueses, experimentar outros níveis de realidade. E insuflar lendas. Alguns acreditam que Morrison não morreu e desapareceu numa vida misteriosa. Claro que, depois de dez anos de sumiço, o Morrison, para fazer juz à lenda, deveria ter voltado para morrer verdadeiramente (de câncer ou de AIDS) e provocar pena e lágrimas e muitos mea-culpas. Pelos vistos, o sonho acabou mesmo em 81…
Volto à peça. Minha amiga me perguntou: Por que é que Rimbaud está na moda? Será que é uma questão de moda? Ou atemporalidade? Personificar os tormentos e as incompreensões, a arrogância da juventude com sua vida até os 19 e depois personificar o arrependimento, a aceitação, a conformidade da vida madura? Ou, no enigmático silêncio, salvar-nos a todos da mediocridade?
Sei lá. O que me atrai nele é a injustiça divina. A punição e o aniquilamento implacável, seu sofrimento de oferenda, inimaginável.
Bem, volto ao trabalho.

1 comment:

carlos trigueiro said...

A propósito de RIMBAUD,qualquer esclarecimento, vida, obra e influências, quando tiver tempo,Vc. pode encontrar em:
http://gavetadoivo.wordpress.com
O Ivo Barroso é uma "autoridade"
em Rimbaud.
abs. CT