Tuesday, July 03, 2012

Felicidade, clandestina?

Depois da postagem anterior, meu tempo se acelerou de tal forma que não tive tempo de passar por aqui. Perdi a chance de falar de tantas coisas que me sucederam e agora a memória fraca e o tempo exíguo deixarão para trás esses assuntos. Vou direto ao ponto, a coluna do Jabor, que fala em felicidade.
Fe-li-ci-da-de, seria assim que os personagens de O amor acontece se refeririam, grifando a palavra, um pouquinho irônicos, dando a entender que sabem que felicidade é utopia, mas nem por isso deixando de, no fundo, acreditar que ela existe e pode ser alcançada. Em meu grupo de leitura falo muito sobre isso, a tal da felicidade, "mercadoria" cuja posse nos torna especiais. O problema é essa questão de ter felicidade, de acreditar que alguém possa nos dar felicidade, ou que possamos comprar a felicidade "escondida" num vestido, numa caixa de bombons, no carro mais possante, na motocicleta brilhante…
Felicidade assim é prazer e o prazer é a satisfação de um desejo. Acontece que, para que exista desejo, é preciso que haja "falta". Não se deseja o que já se tem. Isso está em Lacan, mas antes de estar em Lacan, já estava em Platão. E nos tornamos, assim, insaciáveis. Queixamo-nos dos outros que não nos fazem felizes, mas é impossível que o Outro nos faça felizes, pois somos Hidras famintas, seres de mil bocas desejantes, quando uma é saciada 999 outras clamam por alimento.
Felicidade é processo, então? Uma dinâmica? A máquina que nos faz seguir vivendo e desejando? Aquela cenourinha inalcançada atrás da qual corremos até chegarmos ao ponto de repouso?
O que é a tal da felicidade? Hoje em dia, quando perdemos ideais e a capacidade de renunciar, a felicidade já não chega nem mais à categoria de prazer, perdendo-se no processo quase instantâneo de "gratificação". Descalçamos os sapatos na festa: Ah, que felicidade! Damos uma dentada no chocolate: quanta felicidade! Encontramos lugar para sentar no ônibus: uma verdadeira felicidade! E por aí vai.
Clandestina nos pequenos acontecimentos que atomizam nossa vida, a felicidade se reparte, humilde. Mas nos discursos, ela se apresenta como Felicidade, e, exigente, se diz impossível de alcançar. Escraviza, se coloca sempre num outro patamar e diz aos magros que, se tivessem um corpo mais voluptuoso, seriam felizes. Diz aos gordos que, se fossem mais magros, seriam felizes. Aos de cabelos lisos, sussurra que os cachos lhe dariam felicidade.
Mudo de assunto e penso naquele jogador italiano/ganês, que fez o gol da Itália e tirou a camisa, mostrando um belo corpo. Ele obviamente já não estava feliz naquele momento, pois nunca poderá ser feliz. E, no entanto, naquele momento era o herói de uma nação, exibia um corpo bonito e saudável, estava jogando na seleção, o que significa que faz parte dos melhores jogadores da Itália, tem audácia bastante para exibir um ridículo corte de cabelo. Tudo para ser feliz? Quanto mais se tem, mais difícil fica alcançar essa felicidade…
Melhor aproveitar o dia e dar uma caminhada pela praia. Talvez, no inesperado espetáculo de golfinhos alegres a gente descubra uma felicidade clandestina, mergulhando e rindo de nossas caras angustiadas,
saindo da água, como Vênus, correndo para outro lugar, longe, e nos acenando para segui-la…

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