Tuesday, June 17, 2008

Ondas

Saio de casa, vejo amigos, escuto coisas seriíssimas, mas olho o mar e esqueço os problemas. Em São Conrado o mar estava agitado, cheio de ondas, um grande friso de espuma por toda a praia, e aquela coisa linda que algumas ondas sabem fazer, de soltar um véu de gotículas, como uma cabeleira. Me pergunto o que é que as pessoas veem (ai, meus acentos!) nas ondas. Muitas pessoas falam em carneirinhos, mas essas são as ondinhas pequenas, espalhadas por toda a superfície do mar, um rebanho inquieto e apressado.
Os gregos viam cavalos nas ondas. Daí que Posídon, o Netuno romano, tivesse tentado subornar a cidade de Atenas oferecendo o cavalo a seus habitantes. A história é linda: Fundada a cidade, os deuses Palas Atena e Posídon, encantados pela beleza da mesma, disputavam para serem os padroeiros. Posídon ofereceu o cavalo, como presente, e Atena ofereceu a oliveira. Ganhou Atena que, sábia, conquistou os habitantes pela boca. Talvez por isso azeitonas e azeite pareçam ter um sabor especial quando degustados nalguma viela da Plaka.
Já vi quadros em que as ondas se transformam nos cavalos de Posídon, outros em que elas se metamorfoseiam em mulheres. Assisti um programa na TV sobre um pintor japonês que pintou uma onda perfeita, onda essa que ele passou o resto da vida repintando, e que virou paradigma de outras pinturas de outros artistas. No programa, eles identificaram o tipo de onda e quando ela ocorria. Esperaram, então, que ela acontecesse e filmaram a onda real e sobrepuseram sua imagem sobre a da pintura.
Imagino como seria a tsunami: sua velocidade, sua altura, sua cor. O dia devia de estar bonito, as praias estavam cheias. De repente, a água que brincava, morninha, aos pés das pessoas, refluiu, desertou a praia, e como ela voltou? Sombria? Uma parede de água, alta e veloz? Ou veio na forma de torrente, espumosa, imperfeita, maculada de areia e detritos? Como seria a face desta morte? Nas imagens da TV, a gente não via a onda, mas o seu efeito. Quem conseguiu filmá-la estava longe da praia, em hoteis, em restaurantes, mostrava não uma onda, mas uma espécie de lamaçal, uma enchente que não diferia muito das imagens de alagamentos e enxurradas a que estamos, infelizmente, habituados no Brasil.
Lembro de filmes, catastróficos: The Perfect Storm é um deles. Aquelas ondas enormes e o barquinho pequenino subindo e descendo até não conseguir mais resistir. Já enfrentei ondas raivosas, perto de Cabo Frio. Sei como o barco acelera na descida da onda, como parece faltar água ao redor dos hélices, que não conseguem impulsionar o barco, sei do ruído que encobre as batidas de nosso coração acelerado, e da sensação de alívio quando se consegue entrar num local abrigado.
Mas também conheço as ondas que nos embalam durante as noites passadas em baías tranquilas. Essas merecem ser conhecidas por todos. São maternais, protetoras, e nos levam a um sono profundo e repousante. De manhãzinha elas cessam, sua maneira de nos acordar. A imobilidade e o silêncio servindo como despertadores...

2 comments:

Guido Cavalcante said...

Você tem um lado de aventureira, intrépida, muito bacana. Gostar de ondas diz muito sobre uma pessoa. Eu gosto delas e também gosto de vento - adoro uma boa ventania. Já vi um furacão em Cuba e estive numa tempestade durante 12 horas na região do Estreito de Magalhãoes. Foi num barco americano de três mastros, que estava a caminho da Geórgia do Sul para buscar uma foca para um zoo. A tempestade começou logo que saímos de Punta Arenas, direção da Isla Santa Helena, onde pretendíamos filmar uma pinguineira (pinguins não se importam com tremas). Foi uma experiência estupenda. O que me curou do terrível enjôo foi um longo trago numa garrafa de uísque, quando o desespero pelo mal-estar generalisado já me corroía a alma. Eu simplesmente não conseguia ficar encerrado na cabine e me agarrei horas seguidas nas cordas no convés. Para meu consolo, alguns marinheiros ficaram bem mal e assim não me senti um "mosquinha" completo :-) Depois do uísque me senti ótimo. Saltei numa das tantas ilhotas do Estreito (pode ser ilha Dawdson?), e prossegui à cavalo numa jornada de uma semana, naquela região coberta de florestas geladas. O barco prosseguiu para a Geórgia do Sul. Tem uma paragem onde as ondas não encontram terra em toda a volta do Planeta, o vento corre solto e então as ondas atingem 40km de extenção. Agora acho que não aguento mais uma viagem dessas.

*É claro que não perdi The Perfect Storm. E por falar em descrições de tempestades, que tal Typhoon, do Joseph Conrad?

João Paulo Parisio said...

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