Adoro as festas juninas. Desde pequena que acho um grande encantamento nestas festas de muitas musiquinhas, de encenações que aceleram os corações infantis, com um arraial inteiro embandeirado, com pescaria, capelinha, cadeia, fogueira e fogos de artifício. Acende a fogueira, iaiá!
Lembro-me de umas noites mais frias do que agora, de corre-corre para escapar da cadeia, de churrasquinho coberto de farinha, que grudava nas boquinhas pintadas de batom vermelho vivo, boquinhas que pareciam sangrar nas noites embaladas por sanfonas. Lembro-me da atrapalhação das quadrilhas, quando os dançarinos se atropelavam ora fugindo da chuva, ora passando pelo túnel formado pelas mãos dos casais. Ah, também tinha a hora do casamento: a noiva feia, o noivo relutante, o padre pândego, o delegado, o pai da noiva -- eu vivia a commedia dell'arte sem o saber!
As bandeirinhas se agitando no ventinho que levantava fagulhas de uma fogueira sempre fora de proporções; as lanternas e os balões que levavam os pedidos para São João, Santo Antônio e São Pedro. Havia as simpatias e as adivinhações, com a clara de ovo formando desenhos de navios ou de igrejas, com papeizinhos se desdobrando e revelando o nome dos futuros maridos, meio apagados pela umidade e incerteza.
O cheiro das batatas doce assando, o gosto do milho se desdobrando em bolos, canjicas e curaus, era de se admirar que São João não acordasse atraído pelas delícias. E as músicas continuavam, ensinando meu primeiro triângulo amoroso: Com a filha de João, Antônio ia se casar, mas Pedro fugiu com a noiva, na hora de ir para o altar. Tempos depois, na emoção teatral de Bodas de Sangue, do Lorca, era esse o fundo musical que eu imaginava durante a leitura de versos ardentes que diziam que a culpa era da terra e "do cheiro que desprendem teus peitos e tuas tranças" -- e o meu peito arfava, enquanto eu desfazia as tranças de meus cabelos quase tão longos quanto os de Rapunzel...
Sentei-me aqui no computador um pouco antes da meia noite, ainda lembrando os festejos do dia 12, comemorando, com a prova de meu livro no colo, as lembranças do amor passado. Agora já é hora de saudar santo Antônio, que ganhou fama de ser casamenteiro, mas que também é santo afeiçoado a uma batalha. Me lembro de uma charge do Ziraldo, antiga, antiga -- Um sujeito que vai caindo num abismo e grita: Valha-me Santo Antônio! Nisto uma enorme mão o segura e uma voz pergunta: De Lisboa ou de Pádua?... Grande dilema! Eu peço a bênção aos dois, e aos que mais existirem, ao Santo Antônio das brincadeiras infantis, dos festejos ingênuos, das saudades imensas dos trajes caipiras, dos olhos lacrimejantes de fumaça e de sono, do sorriso que persiste infantil num rosto marcado pela tristeza...
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