Para terminar, revelo como descobri, logo de cara, que se tratava de um golpe: o uso dos clichês. Tudo o que o homem falava estava sobrecarregado de vícios de má-redação, mas não havia erros gramaticais. Um analfabeto que não errava o português mas que não sabia o nome de "táxi", falando nos "carrinhos amarelinhos que podem me levar de volta para minha mãezinha", e em guardar seu dinheiro "debaixo do colchão", e ser capaz de dizer 35 mil "reais", com plural corretíssimo e usando reais, ao invés de "conto" (ou mesmo contos, seria mais fácil de engolir), são pequenas incoerências que sinalizaram, para mim, que aquilo se tratava de um texto de um mau escritor. Nunca se deve explicitar muito as marcas, isso é dramaturgia exagerada de comédia, de caricatura. Para dramas realistas, aconselho menos exageros. Tentem assistir um pouco menos de Fallabela, pois ele pode ser bom, mas morreria de fome como golpista. Dou os conselhos, mas espero que os dois não estejam me lendo!
Thursday, November 05, 2009
Da necessidade de boa redação
Tentaram me aplicar um golpe, ontem. Bem aqui, na Rainha Guilhermina, um homem e uma mulher acharam que podiam, com sua história mal-redigida, me levar no bico. A atuação estava bem feita, o casting era estupendo, mas o texto deixou a desejar. Muito. Overdose de clichês. Por isso dizem que menos é mais. Eu conto. Não sei se está escrito no meu rosto que sou louca por histórias, talvez esteja. E, como eu vivo repetindo, tenho o coração mole, escuto as aflições dos pobres de rua, mesmo quando finjo que não vejo. Ontem um carinha me abordou, perguntando um endereço de uma loja de roupas. Eu não sabia, e já ia continuando a andar quando a outra artista se aproximou. Uma mulher falante, de roupa de ginástica, toda decidida, parecendo tentar ajudar ao cara, ao mesmo tempo conversando comigo todo o tempo. Ele se fazia de ignorante, perdido na cidade grande, ingênuo. Ela era toda urbana, bem de vida, generosa e de boa educação. Resumindo o longo golpe, que só foi esboçado, mas não foi concretizado, o suposto comerciante queria ficar com o prêmio da Mega Sena que o tal caseiro de "políticos lá de Brasília", tinha recebido, no valor de mais de 4 milhões de reais. Ele queria me dar cem mil reais se eu o ajudasse, mas eu disse que não cobro por ajuda, mas que queria escrever a história dele… Aí eles perceberam que eu não estava acreditando, e ele disse que queria desistir de ir até a Caixa e que ia voltar para sua Teresópolis e buscar sua mãe, tão analfabeta quanto ele. A mulher tentou continuar comigo, e eu, muito educada, falei para ela que infelizmente não podia ficar e que tinha compromisso, percebendo que ela estava dando cobertura para que o homem sumisse de vista. Ela tinha carro, e ficaria mais fácil desaparecer. Esse golpe é velho, mas eles nunca chegaram a me propor nada (além de o homem querer me dar cem mil e querer beijar minhas mãos, imagine!) e eu vou ter que imaginar um pouco mais a história que vou contar, claro. Como não sou "con-artist" – é assim que chamam os golpistas em inglês, e com razão, pois são verdadeiros atores – não imagino bem o objetivo deles. Me sequestrar? Me propor comprar o bilhete premiado pelo valor que eu tivesse no banco? Descobrir meus dados para depois virem me assaltar? Depois escolho. Acho que, para fins de conto, dá mais caldo um sequestro, claro. Mas depois isso me entristeceu demais! Pois o que eu gostaria mesmo é que a história fosse outra. Que alguém tivesse parado para ajudar uma pessoa que parecia necessitada e descobrisse que o outro era, na verdade, um afortunado. O que eu gostaria era de ter participado de um milagre de alegria, e não de mais uma dessas pequenas misérias humanas.
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2 comments:
Pôxa, amiga!
Logo na 'Rainha Guilhermina'??? (Rssss...)
Sorte sua!
Bjo!
Adorei a história. bjs Márcio Galli
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