Um pouco de história é sempre bom. Eu adoro histórias, com ou sem maiúsculas, mas, quase sempre chego à História através das histórias que leio. Os idos de março chegaram até mim pomposamente trazidos pela mão de Shakespeare, na peça Julio César, traduzida pelo Carlos Lacerda, por quem minha mãe era apaixonada. Lacerdista doente, diziam na época. Devo ao Lacerda minha passagem por uma escola pública, pois antes dele, e depois dele, só estudei em colégio particular. Já a faculdade, fui eu que escolhi, e só queria a UFRJ, onde entrei, muito bem colocada, atrás apenas de Cecília, minha amiga querida. Fui muito feliz na UFRJ. Adorava minha turma, LEA. Adorava meu grupo, que se mantem unido até hoje. Adorava meus professores, a quem admiro até hoje. Tive dois filhos estudando, já entrei com uma no colo. Me lembro de fazer a inscrição para o vestibular, gravidíssima, minha e do meu marido, que estava me esperando no carro. Quando cheguei lá com a papelada e o retrato do Gui, novo, cabelão, queimado de sol e de óculos escuros, o atendente, um senhor de meia idade olhou para mim e abanou a cabeça: Ô minha filha, você aqui e o surfista na praia?! Não faz isso com você não… Mas o "surfista" nunca subiu numa prancha de surf e nunca me deixou na mão. Ele fez a faculdade trabalhando e eu procriando. Não sei como, consegui dar conta de tudo, e ainda lia sem parar. Minha sogra, quando me via abrir um livro, dizia: "pronto, agora ela já se fechou no seu mundo! Não adianta mais falar com ela!" Meu marido tinha ciúmes de meus livros. Mas só no início. Depois ele entendeu que para me amar, precisava amar meus livros. E ele fez questão que esses livros nunca me faltassem. Duros como éramos, o presente que ele me dava a cada natal era um crédito na livraria perto de nossa casa, onde passei muitas tardes sentada no chão (naquele tempo as livrarias não tinham essas frescurinhas de poltronas) lendo os livros que não tinha dinheiro para comprar. Escrevo essas coisas e sou varrida por uma onda de sentimentos contraditórios, alegria e tristeza, amor e saudade. Acho que meus amigos me acham uma chata, em minha obstinada viuvez, ninguém entende lá muito bem porque eu fico só. Mas … eu também não entendo muito bem, e não consigo pensar em ter outra atitude. Vou ficando do jeito que estou. Choro um pouquinho, rio um pouquinho, me escondo em casa, até me chamarem para algum programa. Viajo, gosto disso, e vou sempre que posso. Escrevo, coisa que também gosto, e que me dá um sentido, uma canoa a bordo da qual atravesso a vida. E leio, prazer enorme, vício, mesmo, pois sem ler começo ficar inquieta, impaciente, agitada.
Bem, ia falar nos idos de março, no assassinato de César, talvez no nariz de Cleópatra e, quem sabe, no Marco Antônio. Falei dos idos de minha própria vida, e agora vou correr atrás do tempo, para fazer a resenha que estou devendo ao Rascunho, os e-mails que tenho que colocar em dia, e as leituras para a UFF.
Só para terminar, o André de Leones me mandou um convite para participar de uma comunidade de leitores chamada skoob, que está bombando. E citou a mim e ao Marcelo Moutinho, na resenha que ele fez para o JB. Fiquei muito contente! É bom ser lembrada.
3 comments:
não preciso me lembrar de você, posto que jamais a esqueço.
beijos!
É sempre bom ver como você cultiva o amos pelo Guilherme e pelos livros. Beijos Marcio
Nossa! Que texto lindo! bjsMárcio Galli
Post a Comment