Thursday, March 26, 2009

Cigarras

Falei do coro da Butterfly que me parecia asinhas de insetos, e por coincidência, recebi um e-mail de um amigo poeta, Henrique Rodrigues, com poemas de Olegário Maciel, sobre cigarras.
Esses insetos que tantas vezes serviram como metáfora aos poetas, os artistas que morrem de tanto cantar, me entristeciam tanto, que eu chorava nos finais das tardes de verão, quando o som das cigarras parecia tornar o ar mais espesso, quase irrespirável. Aquilo me penalizava, como aquela fábula da Cigarra e da Formiga me revoltava. Nunca vi uma fábula mais odiosa, mais pequeno-burguesa que essa! Mas não sou especialmente fã de cigarras. Nem mesmo quando elas apareceram na forma de revista A cigarra, que acho que eu era muito pequena para ler. Houve um tempo, há tanto tempo, meu Deus, que o Rio foi invadido por insetos inoportunos e chatos, que o pessoal chamava de lacerdinhas. Aquilo caía em nossos olhos e fazia arder, era horrível. Se era horrível para as crianças, para as mulheres maquiadas era ainda mais, pois os insetos as faziam chorar, e o choro borrava sua maquiagem, vivemos, por um tempo, numa cidade de zumbis: mulheres de olhos derretidos, impressionantes. Houve um outro inseto, acho que nesta mesma época, que era só incrivelmente chato, mas não me lembro de um mal que ele causasse: uns besourinhos verdes que ficavam parados no ar, batendo muito as asas, trombando na gente, pois ao contrário dos outros insetos, esses não se afastavam quando nos aproximávamos. Era um pavor ser criança nesta época, e estar firmemente segura pelas mãos de algum adulto responsável, que nos arrastava para uma trombada inevitável com os monstrinhos, embora nos estorcêssemos, tentando escapar... 
Costumava dizer aos meus alunos que eu era da pré-história (e agora? tem acento? tem hífen?) da humanidade. Mais uma prova disso é ter vivido num tempo em que não havia água no Rio. E, de tarde, não havia luz. Minha mãe, que era uma pessoa, digamos, diferente, achou uma saudável ocupação para mim no horário sem luz: aulas particulares com uma professora que morava no décimo-segundo andar. Lá ia eu, com uma vela, subindo as escadas malcheirosas do prédio (naquele tempo as lixeiras ficavam nas escadas, e ninguém usava saco-plástico para embalar o lixo, que era despejado embrulhado em jornal velho). E eu nem precisava de aulas particulares, já que nunca tive problemas na escola. Não era aluna brilhante (só nas coisas que eu gostava: 10 em ciências, 10 em desenho, 5 em matemática, 5 em geografia) Naquilo que eu achava chato, só obtinha a nota mínima. No que eu gostava, só ganhava 10. Deixo o português de lado porque nesse eu me safava graças à redação. Sempre fui muito boa de redação, mas não queria saber de gramática. Escrevo sem maiores erros gramaticais porque leio muito, mas é só me perguntarem uma regra específica para descobrirem que não sei nada de português. Por exemplo: magestade ou majestade? Escrevo as duas, olho e respondo, segura: com J! Mas, se não escrever, não faço a menor ideia. Sei que jeito é com j pois deixei de ganhar dez numa redação graças à ele. A professora me descontou UM PONTO INTEIRO, por esse meu único erro, e foi irredutível, e eu nunca mais esqueci que jeito era com j.  Aprendi, também, a palavra arbitrariedade, nesta mesma lição...
Por falar em arbítrio, ontem assisti a um ótimo filme: Frost/Nixon. Fiquei fascinada pela caracterização dos atores. Vale a pena conseguir um horário para assistir o filme que se esconde em sessões quase impraticáveis.

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