Sunday, December 30, 2007

Quem fatiou o tempo?

Mais uma vez me pergunto porque este rito de passagem na noite de 31 de dezembro? Quem 'e que determina que as coisas mudam de um ano para outro? Estou assim, numa fase "protestante" -- questionando tradicoes, inquietamente esperando a noite de amanha, sem ilusoes. Esta e minha terceira passagem de ano sem o Guilherme, e mais uma vez vejo o tempo escoando neste funil de horas, sem que eu me anime, sem que as esperan'cas ressurjam. Vou levando, como se diz. Acho que estou me saindo bem, conforme prometi a ele que faria, mas meu cora'cao continua pesado, minhas alegrias ainda sao ocas, e comeco a acreditar que a vida agora sera sempre assim: risos vazios, planos construidos por mera forca de vontade e nenhuma tesao.
Gostaria de entender o mecanismo da esperanca, da ingenuidade da fe... Mas nao sei de nada, nem sei mais aquilo que julgava saber. E, no entanto, criei novos amigos, alcancei velhos objetivos, estabeleci metas para o futuro. Mas nao tenho nenhuma "vontade". Faco, porque faco, mas se nao fizesse, seria igual. Assim sendo, fico inquieta com tanta gente esperancosa e feliz a meu lado -- nao quero ser desmancha prazeres, mas nao consigo me contagiar nem entusiasmar um pouquinho com a mudanca de data. Mas muita coisa vai acontecer este ano. Minha amiga Ro vai ter seu primeiro filho. Minha amiga Laura completa suas bodas de ouro. Meu segundo livro sera publicado. O livro do Flavio tambem vai ser publicado. Vou voltar para a faculdade.Vou ver o Breno em janeiro, vou viajar com Natercia, vou andar de bicicleta na praia com o Marcio, vou rir muito com a Livia, vou colaborar com o Andre, vou continuar com minhas aulas de piano, quem sabe conseguirei tocar alguma coisa de Bartok? So que isso tudo eu faco assim, meio impostoramente, fingindo uma felicidade que sinto mas que nao e verdadeiramente minha. Nao sei explicar melhor. Tambem nao sei quem fatiou o tempo. So sei que o meu tempo estacionou no passado, e eu nao tenho vontade de seguir adiante. Mas vou andando assim mesmo.

4 comments:

Anonymous said...

Com seus projetos realizados: Meus votos,
Ernane

Guido Cavalcante said...

Este texto me emocionou profundamente.
Não apenas pelo drama que se entrevê - e que eu não ouso desejar saber - mas pela forma com que foi construído - camada sobre camada - a noção das fatias (layers) perpetuando-se através da narrativa. Este texto me fez conhecer que - não importa de que forma - sempre teremos um "pedaço" só nosso, algo que não nos pode ser subtraído, que permanece, chamê-mo-lo de tesouro ou o que seja...

Este texto me fez lembrar do signori Lampedusa e de lady Katherine Mansfield - algo que esta literatura sua recobra, renova e amplia: o incrível pendor para debruçar-se sobre o próprio coração, contar-nos que "isto não importa tanto assim" e torná-lo parte de nossa experiência.

Deus te abençoe neste e nos próximos anos que, com certeza, virão.

Eugenia Zerbini said...

Querida, perante a eternidade não existe tempo. O ano deveria recomeçar a cada manha. Deveríamos ser como as fênix, renascendo das próprias cinzas, depois de - como pelicanos - devorarmos nossas próprias entranhas.
Talvez não seja só para você que as coisas não façam nenhum sentido. 'As vezes não têm sentido algum. Mas -como já escreveu o Manuel Bandeira - , o dia em que eu encontrar com a morte, quero amá-la com o mesmo desencanto que eu amei a vida.
Que 2008 lhe seja generoso e propício, beijos da Eugenia.

Anonymous said...

Querida Lucia,
Sei bem o que sentes, mas de coração não encontro palavras que possam te ajudar embora sabendo o que pode te fazer melhor.
Com o tempo, não se preocupe, a cada virada de ano, repetimos as mesmas coisas seguindo os mesmos costumes os quais nem sempre são de nossa vontade.
Quanto a saudade, sei que São Francisco de Assis tem a melhor definição e que serve bem ao que sentes - " A saudade pura não encontra distancia no espaço, nem no tempo, criando de tal sorte um vínculo que, mesmo as almas estando separadas, se sentem unidas pela força do amor. Se alguém te levar a visitar as mais belas metrópoles da terra, que te ofertem as mais lindas visões das coisas mais aprimoradas da ciência moderna, ainda assim não te esquecerás daquela imagem que amas e que a saudade te faz lembrar"

Quanto a esperança e a fé, te digo que és uma pessoa de muita fé, pois sem ela, voce não estaria traçando seus objetivos com esperança de realiza-los neste ano. Nem mesmo teria realizado tudo o que já fez nestes ultimos anos. Outra vez SFA diz - " A fé avança em todos os sentidos e sustenta a vida em todas as demandas dos homens e dos Anjos. Se estás triste, busca de novo o teu íntimo e verás que escapuliu, sorrateiramente , a tua fé"

Lucia, não sou ninguém para dizer o que é melhor para você, só que tenho fé de que alguém de algum lugar esta te ajudando passar essa parte de sua vida e, tudo que realizou ou realizará, alegra esse alguém, então continue, não perca sua fé e sua esperança por que assim manterá a alegria desse alguém que te dá saudades.
Um forte abraço e um 2008 cheio de realizações com muita fé em você mesma e naquilo que você acredita, sem protestos pois o que realizas sai de seu coração para alegria de quem te ama.
Deus elumine seu coração e te dê alegria em tudo que faz.
Beijos.