Sunday, March 16, 2008

Esqueci...

Tinha um título para começar a escrever. Desde ontem tinha escolhido um título para esta postagem, mas, como não tive tempo de escrever, como a vida se desenrolou seguindo outro traçado, esqueci. Porém o esquecimento nunca é inteiramente ruim -- Uma amiga, a Mira, sempre dizia que a função primordial da memória era esquecer -- se não fôssemos capazes de esquecer, não seríamos capazes de aprender. Pode parecer um paradoxo, mas a Mira era médica e sabia o que dizia. Precisamos dar lugar a novos "arquivos" e, se não esquecemos o que é supérfluo, não teremos lugar para o importante. Na verdade, esquecer é diferente de apagar. Apagar por completo, nunca apagamos. Mudamos de "gaveta", os nossos arquivos. Ou, seja, tiramos aquela lembrança da gaveta que usamos toda hora e a colocamos numa gaveta emperrada, que quase nunca abrimos, pois está trancada a chave. Assim podemos explicar doenças como a de Alzheimer, em que os pacientes trancam as gavetas das lembranças necessárias e abrem as do passado, abrem até aquelas cujas chaves ficavam no inconsciente... Já não se reconhecem os filhos, mas os pais, há tanto tempo mortos. Os impulsos reprimidos, os desejos recalcados se liberam mas as palavras mais sofisticadas se escondem, as noções de matemática se emperram e os números são olhados como ilustrações nada criativas, que se repetem na sua monotonia de formas finitas...
Divago. Ia contar que comecei a ler o Coetzee, apesar de ter tantas outras obrigações mais urgentes. Quem me conhece sabe que sempre fui assim: caio facilmente em tentações, e depois me torturo com prazos e tarefas que nunca deixo de cumprir, pois fui criada pela mais exigente de todas as mulheres: minha avó "vitoriana". Deve ser algum gene do inglês que foi o seu avô. Um inglês engenheiro, que veio construir estradas de ferro -- ou seriam minas? -- e que engendrou uma única filha, que por sua vez engendrou minha avó. Minha vó, de pele tão branca que parecia biscuit, mas tão macia que parecia feita de algodão, e de espírito tão rijo que parecia de ferro! Contrario as psicologias e afirmo, com todas as letras, que meu super-ego não tem uma representação masculina: meu super-ego é uma avó zangada, de sobrolho fechado, que me impede de deixar de fazer o que tenho que fazer. E, como ela já se manifestou aqui nestas palavras, também tomou conta de minha vontade, então largo tudo para cumprir meus deveres. Quando ela cochilar, eu volto.

2 comments:

Anonymous said...

Querida, a sua cochila, a minha jamis!
Beijos, Eugenia.

Anonymous said...

Lúcia, você já deve ter recebido o Rascunho. Chegou a ver meu primeiro conto publicado?
http://rascunho.rpc.com.br/index.php?ras=secao.php&modelo=2&secao=4&lista=1&subsecao=12&ordem=1818
Fiquei mais do que feliz. Agora volto para a imperatriz.
Beijos, Eugenia