Sunday, September 08, 2013

Violência

Vivemos num mundo violento demais. Não sou eu que o digo, são os jornais, a TV, os filmes. Eu até que não tenho me encontrado muito com a tal violência. Não tenho testemunhado abusos, a não ser o do supermercado aqui em frente, que insiste em ocupar e emporcalhar nossas ruas.
Aqui no prédio as pessoas são educadas. Os funcionários são educadíssimos. Na rua, como o Leblon ainda é uma aldeia, somos reconhecidos e cumprimentados por quase todos. Isso quando somos anônimos, ou seja, essas pessoas que passam desapercebidas e nem precisam de máscaras. Pois sei que sou reconhecida, mas tipo: lá vem a dona do cachorro branco, olha o bigodudo cantor, e onde será que anda o moço das cadeiras. Gente de quem só lembramos ao cruzarmos na rua e de quem até sabemos o nome, mas na maioria das vezes não. Por exemplo, tenho uma vizinha que gosta de plantas, cujo marido está com dificuldades para andar, e que não é brasileira. Sei que gosta de vestir roupas claras, e que é muito disciplinada. Sei de muitas coisas sobre ela, mas não sei o seu nome.
Outro vizinho toca piano, pratica todos os dias. Um outro (talvez o mesmo) fuma maconha. Sinto o cheiro todos os dias. Uma tem cachorro, outra tem netos. Uma está sozinha, não tem filhos, perdeu o marido, a família mora longe. Uma é ambiciosa e segura de si. A outra é recém-chegada ao país, tem um filho pequeno e não fala português. Aquele usa perfume demais, sempre que posso, tomo outro elevador, por conta de minhas alergias. Mas quem são essas pessoas, realmente? Anônimas – sem nomes, sim, mas com histórias e características próprias.
Talvez seja esta a razão de nos saudarmos e de sermos gentis uns com os outros. Eles aparecem para a gente com algum sinal de humanidade. Quando estamos numa situação de "massa", as coisas se tornam diferentes. Pessoas se acotovelam nos locais muito cheios, empurram, gritam com quem eles acham que está em desvantagem. Pessoas são horríveis quando são apenas "gente". Grosseiras. Perderam a delicadeza e seus sorrisos.
Nós somos seres horríveis quando viramos "massa". Abusamos do nosso ambiente, abusamos de tudo e de todos. Somos um grupo de infelizes, achando que o mundo nos maltrata, mas nós é que maltratamos o mundo.
Digo isso por causa de minha leitura da Revista de Domingo. Um fala do meio ambiente ameaçado, outra fala da sala de espera do analista e do esforço pela invisibilidade. Mas há uma história que me encanta. A do médico que inventa exames baratos e que se preocupa em identificar doenças negligenciadas porque são, erroneamente, classificadas como "doenças de pobre".  Exames que custam apenas 5 reais. Acho que contribuir para isso faria mais bem à alma da cronista que frequentar o consultório do analista e se preocupar com a etiqueta de cumprimentar ou não o paciente da sala de espera. Ela que estenda a mão a quem precisa, e que abra a bolsa que seus leitores generosamente recheiam. Pessoas como ela, com nome, são exemplos para anônimas como eu. Mas é pelo médico anônimo e estrangeiro que a lição verdadeira é ministrada. Meus parabéns a ele. Prometo que vou decorar seu nome e aprender sua lição.

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