Friday, December 11, 2009

Luís XIV

Nada sei de Luís XIV, nem tenho nada a dizer sobre ele. No entanto, parece que o dilúvio que ele invocou a segui-lo andou se desviando mas chegou ao Rio de Janeiro. Será que vamos ter 40 dias de chuva? Será que preciso arrumar um bote que me permita sair daqui de minha alta torre para buscar um monte Ararat onde encalhe? Ontem à noite, depois de cruzar a cidade chuvosa duas vezes, vim me refugiar em casa, com vontade de nunca mais sair. Olhei satisfeita para meus livros, meus DVD's, e vi que tinha alimento para o resto da vida. Minha cozinha, no entanto, é desprovida de sustento. Pacotes de sopa instantânea, algumas folhas amarelando na geladeira, pouco mais. Algum café, temperos sem nome… Definitivamente, precisarei de um bote se a chuva continuar. Mas ontem podia me dar ao luxo de ficar em casa, no seco, mergulhada na beleza do ballet que graças a minha amiga Marie Louise podia ficar assistindo. Como agradecer a esta linda e delicada criatura, que me trouxe de presente o ballet de Proust, pelo qual já cometi loucuras como embarcar, de uma hora para outra, para Paris, a fim de assisti-lo?  Agora, quando soube que o ballet tinha saído em DVD, fiquei louca de vontade de voltar a assisti-lo. Que lindo! Proust ou les intermittences du coeur, ballet en deux actes et treize tableaux. Coreografia de Roland Petit, música de Beethoven, Debussy, Fauré, Franck, Reynaldo Hahn, Saint-Saëns e Wagner. E todo o corpo de baile da Opéra de Paris.  Ah, que maravilha! Acho que nem Louis, Le Roi Soleil, teve mais satisfação do que eu. Na verdade, tive muitos momentos de princesa em minha vida: Estive no Louvre, sozinha (literalmente) numa sala com a Gioconda, antes de sua proteção de vidro, numa saleta onde ela era apenas mais um dos quadros. Pequeno, nada de grandioso, como eu esperava. E cheia de craquelé, o que muito me admirou. No mesmo Louvre, eu e uma amiga, na ala grega, brincamos de telefone sem fio com as urnas de mármore, postadas nas extremidades de um amplo salão. Isso depois de meus olhos avaliarem, negativamente, a beleza da Vênus de Milo. Não que eu tivesse achado a deusa feia, mas me admirava de que ela fosse tão "massiva". Em inglês há um adjetivo para mulheres como ela que é, exatamente, "statuesque". Que é bem diferente do nosso "escultural", que se prende mais ao torneamento do que à sensação de grandiosidade, de concretude, da beleza de algumas mulheres. Mas, aqui mesmo no Rio, tive de sobra momentos de princesa. Um dia, por exemplo, ao voltar de uma viagem, atravessei o túnel Rebouças deixando para trás uma Tijuca chuviscante e, ao sair na Lagoa, o que me esperava era um dia radioso, com o sol ofuscando as águas da Lagoa, e a saudade fazendo meu coração explodir e provocando lágrimas de puro êxtase. Por falar em êxtase, os momentos sem fim em frente à imagem do êxtase de Santa Teresa, onde, na igreja quieta e quase sempre deserta, me esqueço do tempo e dos pés cansados de turista… Nem sei expressar o quanto gosto de arte, nem o prazer que ela provoca em mim. Um bom livro também é capaz de me dar a mesma sensação. E creio que alguma "memória corporal" desses momentos fica em mim, pois, ao falar sobre esses livros, minhas amigas dizem que minha expressão se modifica.
Agora, ao escrever estas palavras, vejo que o sol volta a aparecer. Bom isso. Principalmente porque hoje tenho um programa ao ar livre: assistir ao filme do Woody Allen no Vale Open Air. Terei mais um momento de princesa? Talvez, embora poucos sejam os filmes que me tenham impressionado assim. Um foi, sem dúvida O Leopardo. Outro foi 2001. Mas não posso esquecer de maravilhas como O incrível exército de Brancaleone, O mensageiro, A filha de Ryan, Amarcord, Barbarella… Pretty inconsistent, uh? Mas eu sou assim, como o Mário de Andrade descreveu: múltipla, arlequinal, 350. 
Para terminar, mais um viva a minha amiga, imperatriz no nome e nas graças! A minha duquesa de Guermantes, com seu perfil de pássaro, sua elegância natural, e seu eterno ar de menina em flor!

1 comment:

Anonymous said...

Pela 1a vez ouço falar em balet do Proust (santa ignorância), Quantos aos elogios à nossa querida Imperatiz concordo plenamente, poderia acrescentar mais alguns, mas sem sua elegância e competência. Beijos. Marcio