Frio e chuva não tornam Paris menos apetecível. Esta é uma dessas cidades que o gris torna mais atraente, mais definida. As ruas, molhadas, ganham um brilho de aço, cortante, e os instantes de sol (afinal, o verão já está aí, batendo à porta) fazem as pessoas levantarem seus rostos, de olhos fechados, se entregando, amorosos, às promessas de bom tempo. As árvores sacodem gotas geladas sobre os passantes, os garçons entram e saem com suas cadeiras, a cada mudança de tempo. Os turistas, em hordas, invadem as lojas de quinquilharias, ou desfilam seus hediondos ponchos de plástico por entre os monumentos da cidade. Aproveitei para ir ao cinema, mais uma vez. Fui ver o documentário do Wim Wenders sobre Pina Bausch. Que linda homenagem! Que pessoa interessante ela foi, e que companhia excepcional ela criou. Deve ter sido uma experiência muito intensa trabalhar com ela, que nunca dizia aos outros o que fazer. Num dos depoimentos, a dançarina fala isso, e depois diz: Ela só dizia que eu precisava continuar tentando! E conclui: e assim eu continuei tentando, sem saber para onde estava indo, nem se estava indo na direção certa. Bem, devia estar indo. Afinal, ela continuou com a Pina por mais de 20 anos. Isso é uma outra coisa que chama a atenção: os bailarinos passaram a vida juntos. Uma delas nasceu praticamente no palco, filha de dois deles. Quando ela fala, diz: Não sei o que é a vida sem a Pina. Outra diz: Por 22 anos Pina sentou-se naquela mesa e me olhou atentamente. Ela me conhece mais do que os meus pais.
Como se fosse uma força da natureza, Pina usava terra e água em seus espetáculos. Às vezes o resultado era lírico, forte e vital. Às vezes era violento, muito violento. E os objetos que ela usava poderiam se transformar ora em obstáculos ora em ferramentas para a liberdade. Outra coisa, eram as repetições, os mesmos gestos se repetindo obsessivamente, como se estivessem criando uma linguagem nova, ou num outro extremo, como se estivessem aprisionando as pessoas.
Bem, agora vou ler. O hotel em que estou hospedada está sendo reformado e o cheiro de tinta me deixa inquieta, impaciente. Vou ver se a leitura me distrai.
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