Thursday, May 13, 2010

Perdi o Baudelaire

Tanto que eu quis publicar um texto que li, de Baudelaire falando sobre arte e fotografia, mas a incompetência cibernética me impediu. Agora não sei mais onde anda o Baudelaire. Por aí, pelo espaço. E eu perdi a vontade de falar sobre arte, perdi a vontade de falar do Baudelaire, estou meio blasée. Tem épocas que acho que o mundo conspira contra mim: Procuro uma revista no jornaleiro e não acho. Leio textos e não os compreendo. Vejo meus prazos se esgotarem, e não reajo. Sei lá. 
O vento lá fora canta, e isso me deixa inquieta. O vento agora me sussurra coisas que não consigo mais entender. Houve um tempo em que eu adorava os dias de vento. Em minha casa sem ar condicionado, qualquer corrente de ar era bem vinda. E eu adorava andar na rua nos dias ventosos, cabelos me chicoteando o rosto, e eu andando contra ou a favor do vento, as roupas se agitando e se enfunando a meu redor, como velas prontas a me levar para outros portos. Um dia, parti. Mas parti com destino, e no novo porto encontrei abrigo e âncora firme. Agora minhas velas estão rotas, perdi minha âncora, qualquer ventinho me faz rodopiar. E, por falar em rodopiar, me lembro de um outro dia de vento, distante no tempo, e eu, na janela, vendo as coisas mais disparatadas passarem em frente a ela: roupas, flores, brinquedos, papéis, sapatos, Tudo desfilando em frente ao sexto andar, subindo e descendo num balé sem coreografia, rodopiando loucamente por breves instantes, ameaçando cair e depois subindo, se elevando até andares ainda mais altos. Espantada, acompanhava com os olhos aquele espetáculo, sem me dar conta do perigo que representava. Mesas e cadeiras de plástico passaram voando, colchonetes, guarda-chuvas revirados, expondo seus esqueletos.  Quando se passou isso? Já não sei. As lembranças agora se misturam, se combinam, se perfeccionam em matéria de sonhos ainda não sonhados. Houve um dia de vento que testemunhei. Talvez Baudelaire tenha passado voando em frente aos meus olhos, naquela data. Talvez essa seja a data de seu desaparecimento. Talvez tenha sido aquele o dia em que o conheci. Hoje ele se foi, então, num vento muito mais brando. Mas não há como segurá-lo, as raízes não se fincam na areia das ampulhetas. Baudelaire, Drummond, Rimbaud, Bandeira, Verlaine, João Cabral, Anna Akmahtova, Paul Celan, Secchin, Adrienne Rich, magos de palavras que sopram pela minha vida e me inquietam, desfilando horrores e imprecisões, bisturis e lucidez… Olhando o turbilhão não percebo os perigos e me mantenho, fascinada, à janela, sonhando em criar asas.

2 comments:

Unknown said...

Querida, tenho passado aqui diariamente -- é, virou uma doce e inquietante rotina que termina ou começa quando eu leio o texto novo. Quando não tem texto novo, leio o último mesmo, com aquele prazer de saborear o já conhecido ou já sentido ou já intuído.Continue assim, minha linda prima-sobrinha. Um grande abraço, meu carinho, sempre, Tereza.

Nadanonada said...

Que bom te encontrar por aqui! Gosto muito de você, minha tia/prima. Saudades dos seus belos olhos verdes…