Só um comentário pequenino, pois ando muito sem tempo: Já li o livro do Chico Buarque, que gostei e que já emprestei e até já dei de presente – não admira que o livro se esgote, é um presente que agrada, pois todo o mundo quer ler. Do livro só não gostei do nome : Leite derramado. Talvez por que me lembre de frias manhãs do passado, quando, sonolenta, ficava encarregada de tomar conta da leiteira e acabava me distraindo e deixando que o leite se derramasse pelo fogão, sujando tudo, prendendo-se, queimado, do lado de fora da leiteira, deixando minhas manhãs infelizes, e fazendo meu dia ter um cheiro meio doce, meio azedo, forte e insistente, sublinhando outros cheiros mais felizes, como a hortelã da pasta de dentes, e a alfazema dos abraços mais queridos.
Bem, mas, como contei, emprestei para alguém que conhece a família do Chico, e que reconheceu a mãe dele direto. Sabia de que casas ele falava: essa de Copacabana, disse-me ela, ele só conheceu de ouvir falar, quando ele nasceu já não existia. Contou casos de exílios, de infância, de sonhos, de doenças – e repetia, está tudo ali. Mas ela foi categórica: não é um livro machadiano, como diz a crítica, nem proustiano, como eu me atrevi a dizer. Ela não achou nada de Proust ali. Eu, no entanto, achei que o trabalho da memória e as retomadas das histórias, que se repetem, e nas repetições revelam um novo aspecto, é muito proustiano. É um livro triste, livro de velhice e tristeza, de um olhar que se recusa a envelhecer, mas de alguém cuja decrepitude impiedosamente descrita só pode levar à aniquilação. Um livro maduro, bom de ler, sem complicar a vida do leitor, e cujo fantasma do ciúme (seria por aí que a crítica fala que é machadiano?) não leva à criação de uma Capitu, pois Matilde se desfaz, se esconde, desaparece como o leite derramado. E, no entanto, é um livro difícil! Ainda bem que tirei férias do Rascunho e não vou ter que resenhá-lo esse mês.
Para terminar, esta semana peguei um texto antigo de Cortazar, onde ele fala de uma viagem à Índia. Que show! Que diferença de Caminho das Índias!
Por falar na novela, quem é que aguenta ficar uma semana inteira no enterro do falso morto? Morre, não morre, prepara o corpo, desaparece com o corpo, e tudo que a gente queria era ver o festival das luzes e as danças, e quem sabe descobrir um lugar onde servissem comida indiana, para a gente balançar nossas pulseiras e exibir os brincos da Maya, que já estão à venda no Rio?
Enquanto isso, o tempo passa e eu perco meus prazos. Então bye-bye. Vou trabalhar. Sei que é noite de sexta-feira, mas para mim os dias ficaram perigosamente iguais. Então trabalho, que é o melhor que posso fazer.
2 comments:
Lucia,
estou torcendo por você. Não tenho intimidade com nenhum jurado para lembrá-los do seu livro, mas se torcida conta, já coloquei em meu blog um post (Minha torcida para o Portugal Telecom) com o meu time de campeões. E para os contos, é a sua prosa que está lá.
Eu tin ha até pensado em comprar o livro do Chico. Depois de seu comentário não vou comprar: primeiro pq não me interessa qualquer coisa que tenha remotamente a ver com Proust ou Assis - são referências redundantes demais; depois, vc mostra que ali não esta escrito nada que valha a pena empregar algum tempo para ler - me pareceu coisa antiga, um olhar pra trás sobre o que não importa. Duvido que algum escritor tenha alguma coisa pra dizer hj em dia que realmente faça diferença. E assim continuo muito feliz sem ter nada para ler. Quanto à novela, é uma bobagem, com um trama óbvio e aquelas pessoas absolutamente inúteis. E bom pra queimar um charro e passar o tempo. Deixa o morto esticado lá dentro do caixão, que morto não chateia.
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