Monday, June 23, 2014

O que será que me dá?

De quatro em quatro anos sou acometida de uma virose que me transtorna e transforma. Descubro que, encarcerada a sete chaves, tenho uma outra personalidade turbulenta, passional, bagunceira e irreverente que, além do mais, gosta de futebol.
Ela passa anos sem se manifestar hibernando, e chego a esquecer que essa outra Lúcia, que se veste com roupas verde-amarelas, que não desdenha o uso de perucas e adereços e que diz bobagens, grita e sopra buzinas desafinadas faz parte de mim.
Ela tem uma vitalidade que não tenho. Pula e abraça pessoas sem um pingo de cerimônia. Diz coisas que eu, em meu estado normal, preferiria morder a língua até sangrar a proferir as palavras que essa outra usa sem se envergonhar.
A duração dessa virose depende da participação do Brasil na Copa. E, à medida que o time vai avançando nos jogos, vai ficando cada vez mais séria. Houve uma Copa em que me julguei curada: aquela malfadada Copa na França, quando o time entrou rendido em campo. Ao olhar aqueles "heróis" já vencidos antes mesmo da batalha, fiquei tão indignada que não sei como cheguei até o final do jogo.  Jurei que nunca mais assistiria a um jogo do Brasil. Depois disso, a "outra" ficou enclausurada, sem dar sinal de vida durante duas Copas. Em 2010 amoleci um pouco, e, vez por outra a turbulenta tornava a botar a cabecinha de fora, soprando uma buzina solitária na varanda do meu apartamento. E, embora não tenha assistido a nenhum jogo naquele ano, ligava religiosamente a TV na sala e voltava para o escritório para ler, mas mantendo os ouvidos alertas na esperança de ouvir os gritos de gol. Quando isso acontecia, corria para ver a comemoração na TV, e depois voltava ao meu sossego.
Esse ano, na contramão de todos os bem-pensantes partidários do "não vai ter Copa", fui me entusiasmando devagarinho e, quando vi, a louca tinha escapado do cárcere e está agora no comando de minha vida. No meu coração tem Copa! Estou torcendo como louca para o Brasil chegar ao Hexa. Não saio de casa, não vou à Fanfest, não fico nos bares com os turistas que surgiram como cogumelos, da noite para o dia, em todos os recantos da cidade. A Louca da Casa acompanha todos os jogos, parece que até entende um pouco de futebol, e encontrou amigos que a acham muito engraçada.
A Lúcia de sempre se espanta, mas acaba se divertindo com esse alter-ego muito mais desinibido e popular que o seu ego de cada dia. Fica se perguntando se a virose ainda vai demorar a passar, e tem até um pouco de medo quando sua parceira sossegar, seja pelo final da Copa ou (God forbid!) quando seu time se despeça da luta. Sua vida vai voltar a ser a de antes, sem a paixão e a adrenalina… Acho melhor ir planejando alguma aventura emocionante, como uma volta numa enorme montanha russa, ou umas aulas de voo livre para me entreter e satisfazer essa que, afinal de contas, também posso chamar de eu.

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