Tuesday, May 24, 2011

Uma sociedade sem regras

Já há dias que ando engasgada com isso, tudo o que leio (superficialmente, pois não tenho tido tempo para muita coisa) nos jornais me mostra que estamos vivendo numa espécie de limbo onde não se admitem mais regras para nada.
As leis viraram "facultativas", as normas são ignoradas, as regras gramaticais são meras sugestões… Onde é que vamos parar? Será que todos se esqueceram que, para que uma sociedade exista, são precisas as regras? Pode parecer "careta", mas é necessário parar para refletir: estamos tão liberais, tão descolados, que nosso próximo passo só pode ser a aniquilação.
Não temos uma "lei", ou seja lá o que se chame, para o problema do desmatamento; resultado: cada vez se derrubam mais árvores. Não temos uma "lei" para o uso de conduções públicas: no metrô, as portas se abrem e uma verdadeira parede humana nos impede de sair do vagão, uma vez que não se respeitam as leis da lógica que ensinam que é preciso deixar um espaço para quem quer sair na estação; nos bancos, os desenhos de sentido da fila no chão são interpretados como uma mera decoração, e a fila impede o acesso a outros serviços. Na grámatica, as regras de concordância viraram discriminação: o professor que corrige está discriminando o aluno menos favorecido… Ora bolotas!
Criamos regras para podermos viver em sociedade. A gente convenciona que é preciso parar nos sinais vermelhos, então, para evitar acidentes e engarrafamentos, devemos obedecer essa convenção. Mas aí começa nossa indisciplina: justificamo-nos falando que é perigoso parar no sinal, que nossa velocidade nos impediu de parar no semáforo que mudou de repente, inventamos mil razões para não parar. O sinal fica vermelho, mas o carro avança, pois já é a segunda vez que ele abriu e fechou e o distinto motorista não conseguiu passar. Ele não entende que isso só acontece porque algum espertinho resolveu romper a regra e que se todos insistirmos nisso vai chegar o dia em que ninguém vai a canto nenhum. Pois, por exemplo, o ônibus que diz que vai para o Castelo, pode resolver naquele dia, ir para o Recreio. Afinal, é muito chato fazer sempre o mesmo trajeto. E os carros, cansados de andar na rua, podem optar por passar pelas calçadas e provocar mortes em série. E o governador eleito para o Rio de Janeiro pode preferir ir governar São Paulo e entrar em disputa com o que foi eleito para lá, estabelecendo um governo paralelo. E o redator do jornal pode decidir que não gosta mais da palavra vida, e substituí-la por salada, e o editor pode fazer como o Visconde de Sabugosa e surripiar o "ão", acabando assim com nosso fracote não (Caetano, finalmente será obedecido já que ficará proibido proibir).
Precisamos de regras e de leis, se quisermos continuar vivendo em sociedade. Precisamos das regras de etiqueta, de nos cumprimentarmos com gentileza, de aceitarmos a ideia de que nossos direitos terminam quando os dos outros começam. Não posso forçar que meus vizinhos tenham que escutar FUNK toda vez que me der na telha escutá-lo. Nem devo furar fila, nem jogar papel no chão. O lixo deve ser colocado no lixo, e não na jardineira do edifício. Não podemos estacionar em fila dupla, pois impedimos a passagem na rua, que é pública. Quando algum governante manda plantar uma mudinha de planta que achamos bonitinha, é para deixá-la ficar no canteiro, e não para arrancá-la e levá-la para nosso sítio. E quando o próximo nos irritar, não é para estapeá-lo sem piedade, é preciso ter a humildade de ver quem é que está mesmo errado, se somos nós com nossa buzina ou se o carro da frente pifou e precisa de reboque. Vamos combinar? Se até para jogar cartas é preciso aceitar as regras, por que é que não podemos ver que elas beneficiam a todos? Mas, se alguma regra for boba, ou exagerada, se os costumes mudaram, se as necessidades são outras, podemos aprimorar o que está falho e melhorar nossa convivência. É sempre possível nos divertir na companhia dos outros, e o trabalho em conjunto é sempre mais leve...
Agora que desabafei, estou me sentindo igualzinha… Devo estar com um cartaz de CRI-CRI colado na testa. No entanto, gosto que meus amigos saibam que vou chegar na hora marcada, que vou cumprir os prazos, que não vou levá-los em casa dirigindo pela contramão, essas coisinhas básicas.

1 comment:

Tereza said...

Querida, se vc é CRI-CRI, acho que nasci CRI-CRI, mas com a conotação, claro, de pessoa do bem, que acredita que regras são necessárias e vitais, que nem você. A nossa família era de juristas, estudiosos da lei, e isso fez toda a diferença para mim (e acho que para vc também), e anos mais tarde fui estudar as Ciências Jurídicas e amei cada minuto dos cinco anos. Muitas vezes me deslumbrei com as leis do Código Civil: eram tão investidas de bom senso, do certo e do errado para a coletividade, do ético. Enfim, é isso, amei a postagem e deixo mil beijos, T.T.