Monday, August 24, 2009

segunda-feira

Às vezes a gente perde o senso de direção, e parece que o tempo fica meio confuso, dando voltas na nossa cabeça. Isso costuma me acontecer nas segundas-feiras. Não é que aconteça ao pé da letra, nada que me impeça de funcionar, é mais uma sensação secundária, que persiste às vezes durante toda a manhã, enquanto eu acordo, providencio a vida, decido a semana, inicio projetos, finalizo pendências. Lá no fundo uma sensação de deja-vu, uma falta de propósito, a certeza de que, se não fizer o que tenho para fazer, o mundo não vai parar.  Acho que isso acontece porque reflito muito sobre a morte. To die, to sleep, no more – diz o Hamlet, numa equação que ele mesmo põe em dúvida. Não estou pensando na morte do ponto de vista pessoal, ou seja, em minha morte. Mas na morte cotidiana, na morte corriqueira, na morte de quem morre de morte morrida ou matada, a cada dia. Um interrupção na imagem, uma peça mal feita em que os personagens saem de cena sem resolverem suas questões. Um dia, a Glória Perez do mundo se cansa de um Gopal qualquer e lá desaparece ele, com ou sem bigode, e nem por isso os Ramiros deixarão de receber seus copos de água geladinhos nem seus cafés quentinhos. Delmiras ou Vanderleis, Robertos ou Susanas, todos se vão, uma hora estão ao nosso lado, outra hora não mais. No entanto, a vida se acomoda. As contas que a Delmira pagava passarão a ser pagas pelo Sérgio. As aulas que o Antônio dava serão dadas pelo Joaquim. A carteira que Dulcinéia ocupava passará a ser ocupada por Robson. Algumas pessoas ainda se lembram do Carlos, outras se espantam: Quem?! Um marido relembra os carinhos da mulher, outros passeiam ao lado de novas companheiras, de cabelos molhados, sorridentes.  Sei que sairei de cena e que meu papel será feito por outra pessoa: alguém decidirá que fruta comprar, outro alguém ferverá a água para o café, fulano passará no banco, beltrano escolherá o presente para o aniversário. Segundas-feiras me deixam assim, pensativa. Caminho pela praia, e noto que reconheço alguns rostos. Se amanhã não estiverem lá, quem sentirá falta deles?

1 comment:

Jurandir Araguaia said...

Segunda tem gosto de biscoito velho. Você não é a única a guardar essas estranhas sensações. Aprecio muito os seus textos. Parabéns...