Friday, June 21, 2013

Sempre confiei mais na ficção que na realidade…

Foi assim que terminei o meu post anterior.
Será que essa é uma verdade? Pois estou sempre examinando e reexaminando o que digo. Não desautorizo o que repito aqui no título, mas qualifico. A gente confia mesmo em ficção?
Há muitos níveis e ocasiões para a confiança. Por exemplo, na hora da leitura, temos que nos entregar e formar o tal do pacto "suspension of disbelief" (suspensão da descrença? só lembro do termo em inglês). Se não damos um crédito de confiança ao autor da história, não podemos acompanhá-la. Isso às vezes acontece com as crianças. Geralmente elas confiam, mas chega uma fase que se tornam críticas.
 "Um passarinho me falou…", começamos a história, como sempre. E aí vem o protesto: "passarinho não fala, passarinho só pia" Reestabelecemos o pacto explicando que passarinho pode dizer coisas piando. Se um passarinho estiver com fome, ele pode piar chamando a mãe para trazer logo uma minhoquinha, ou, se estiver assustado, pode piar rápido, como os pintinhos que antigamente eram vendidos nas feiras, e que, quando íamos pegá-los, se encurralavam num cantinho da caixa de papelão, piando muito. Em nossas mãos, seus coraçõezinhos disparados, e seu súbito mutismo nos faziam ver o quanto estavam assustados. Eles, bichinhos da terra tão pequenos, tendo que conviver com desajeitados gigantes de dois ou três anos, sem muita coordenação motora e sem nenhuma noção de seus sustos. Quantos pintinhos assustei? E quanto de ódio armazenei contra os adultos que me separavam desta coisa fascinante que é um "brinquedo vivo"?
Mas o que acontece, por exemplo, quando lemos um livro como 1984, que já foi um ano tão distante que parecia coisa de outro planeta? Lemos aquilo que classificamos de "ficção científica" e que nos encantou com suas ameaças e possibilidades, nas quais acreditamos enquanto líamos. Fechadas as páginas, aquilo devia ficar existindo apenas no mundo da imaginação, mas talvez o livro tenha sido tão convincente que alguns dos leitores tenham dedicado sua vida a transformar o escrito em verdade. Chegou uma certa altura de nossa vida que começamos a ver que nosso mundo estava ficando cada vez mais parecido com o de Aldous Huxley. E agora? Em qual dos milhões de livros já escritos se esconde a solução para a nossa realidade?
Hoje estou vivendo no meio de um tempo em que as pessoas se comunicam demais – por telefones, e-mails, mensagens, twits, facebook, tv, rádio, internet. E onde existem manifestações espontâneas que se organizam por meios eletrônicos, sem líderes. Aí acontece que eu, aquela que sempre confia mais na ficção, se lembra de um episódio contado na Bíblia: o da Torre de Babel. Todos os seres se entendiam, e espontaneamente resolveram construir a torre e chegar ao céu. Afinal, com que direito aquele déspota tinha expulsado a nós do paraíso? O céu era nosso, o poder era nosso.
Bem, todos conhecem o final da história: o poder sempre tem uma carta na manga, e, quando ataca, sempre nos deixa piores do que estávamos antes: ficamos sem céu e sem nos entendermos.
Moral da história? Essa deve estar em outro livro, mas esse ainda não li…

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