Thursday, May 27, 2010

Extase!

Como foi formidàvel a òpera ontem à noite! Daniel Barenboim regendo O ouro do Reno. Uma cenografia das mais espetaculares, com o palco inundado, cantores e bailarinos dentro d'agua, vozes lindissimas, efeitos espetaculares com pouquissimo material, uso sobretudo das luzes e de imagens projetadas. E o teatro, por dentro, é lindissimo, todo em veludo vermelho e dourados, seis andares de Loggias, ou camarotes, um camarote imperial grandioso para receber alguém tao grande quanto Napoleao, que mandou construir o Teatro. Flora e eu num camarote com tres alemaes, eu podia sentir a vibraçao deles com a beleza do libreto e da musica. Bem, com a musica eu ate concordo, quanto ao libreto terei que ficar na impressao, pois do meu lugar nao consegui ler as legendas. Quando terminou o espetaculo, que foi apresentado sem intervalo, o publico saiu em estado de graça, desconhecidos falando uns com os outros, compartilhando seus sentimentos pois era muita emoçao para sentirmos calados! Lindo! Emocionante! Com todos os pontos de exclamaçao que puder usar.

Wednesday, May 26, 2010

Paris é uma festa (ainda)

Sim, Hemmingway tinha razao, e o computador nao tem til. Mas Paris é uma festa em dias de sol, encantadores e coloridos. Tantas coisas para fazer em pouco tempo. Sò com relaçao a Proust havia duas exposiçoes! Uma no museu de letras e manuscritos, em St. Germain, e outra no Marmottan, um palàcio lindo na Porte de la Muette. Munch, Lucien Freud, Sainte Russie, Turner e Picasso, Crime et Chatiment (Crime e castigo) e muitas mais. Optei por Munch e por La Sainte Russie porque eram os museus que estavam abertos nos dias que pude ir. No domingo fui visitar a casa e os jardins de Monet, em Giverny. Nao podia ter escolhido um dia melhor. Assim que puder, publicarei algumas das fotos escandalosamente lindas que tirei, e de antemao peço desculpas, pois os jardins possuem um fundo musical de canto de passarinhos e também é acompanhado pelos mais variados perfumes de flores e isso nao se consegue reproduzir. Havia uma multidao, une foule, por toda a parte. Tanto em Giverny quanto em Paris, era bom parar e olhar o mundo se reunindo em paz e sorrisos. Além dos 4 museus, ainda fui ver uma peça de teatro. La maison de poupée, com a Audrey Tautou, nossa querida Amélie Poulain. Que continua fazendo carinhas de Amélie Poulain, mas que até consegue representar bem direitinho. O teatro de la Madeleine é que é muito lindo por dentro, mas mais apertado que os teatros brasileiros. Os joelhos ficam roçando na cadeira da frente, parecia que eu estava no teatro do Fashion Mall.
Foi tudo o que deu para fazer. Entre um programa e outro, livros, livros e mais livros! E um vestido e duas blusas, para me livrar do calor que ia me matando. A vontade era de andar de canga, mas nao dava... Ontem vim para Milano! Com as dicas da Barbara Càssara, estou fazendo os passeios mais lindos, me deliciando. Hoje vou ao Scala, que me surpreendeu por ser tao pequenino. Mais tarde vou ve-lo por dentro, depois conto. E, como nao tenho muito tempo aqui no computador do hotel, deixo para contar os detalhes depois, quando form me lembrando, no Brasil.

Thursday, May 20, 2010

Travel light

Será que algum dia viajei assim, "light", quase sem bagagem, sem expectativas, sem amarras? Essa é uma arte que às vezes domino. Uma roupa para sair à noite, dois pares de calça, algumas blusas, casaco, se esfriar – está pronta a mala! Mas, desta vez, errei a mão: fiz a mala cedo demais, e nos três dias em que ela ficou aberta a meu lado, fui colocando mais coisas de que fui lembrando: cachecol, luva, cintos, meias, bijoux, escova para o cabelo. E livros. E um caderno. E o computador. A máquina fotográfica. Os quinhentos carregadores a que nossa modernidade nos obriga. E as notícias das amigas, avisando que está frio. Ou que está quente, agora está parecendo verão! Resultado, saio daqui com a mala cheia, com casacos demais, com a sensação de que vou levando roupas demais para dias de menos. Mas agora não vou mexer mais na mala. Vou assim mesmo. E com uma malinha de mão, com uma muda de roupa, em caso de extravio de bagagem. Ah, que importa? Vou feliz!

Saturday, May 15, 2010

Descobertas de uma manhã de outono

Minha casa se desfaz: aparelhos que quebram, portas que não abrem, os vestígios do tempo… Mas faz tão pouco tempo que estou aqui! Talvez seja minha insistência nas coisas voláteis da modernidade, que aprendi a amar com o Gui.
Fui criada cultuando o passado. Em minha casa valorizávamos o tapete velho, o lustre antigo a poltrona usada. Aquele tinha sido o tinteiro do bisavô. Este era o castiçal da vovó. Minha casa parecia e ainda parece um museu, não de coisas valiosas, mas de pequenos objetos que talvez ainda guardem um pouco dos desaparecidos. Quando viemos para o Brasil, absolutamente sem dinheiro, "herdamos" os móveis velhos de tios e amigos. Não sei como conseguimos dar uma aparência de casa bonitinha e decorada com tantos retalhos díspares. O sofá de veludo vermelho gasto que herdamos de minha mãe milagrosamente combinava com as poltronas amarelas de com braços puídos, que ganhei da madrinha. Para disfarçar os buracos, fiz capinhas de crochê, com barbante, já que era o material mais barato. Essa era eu. Mas o Gui era apaixonado pela novidade. Ele estava sempre antenado com maquininhas, objetos que eu encarava com absoluta indiferença, enquanto ele se extasiava com sua modernidade. Aos poucos fui me convertendo: passei a apreciar, mesmo sem entender e sem me esforçar para aprender a usar todo o potencial das novas aparelhagens de som, dos controles remotos que controlavam tudo, menos minha capacidade de usá-los, até por que, quando eu finalmente conseguia dominar uma novidade, esta já havia se tornado obsoleta e estava na hora de trocá-la. Passei a achar muito natural trocarmos um computador que me parecia absolutamente maravilhoso, por um outro que me parecia hostil, mas que me garantiam ser muito melhor. Agora, sozinha, tendo que administrar as novidades, percebo que elas são efêmeras por natureza. A fechadura é o máximo, mas tem vida breve, assim como o telefone celular pelo qual tenho um verdadeiro encantamento, mas que me tenta com mais uma novidade que só posso obter se trocá-lo por um modelo mais moderno.
E cá estou eu às voltas com o Kindle (que já troquei duas vezes), com a TV, com o DVD, as máquinas que perdem seus fios e se tornam inúteis tão rapidamente.
E olho meu retrato, sendo abraçada pelo Guilherme e percebo que sou supérflua, sou quase imaterial nesta foto, que tanto me agrada. A solidez do Gui, de seu braço me envolvendo, de sua mão que parece segurar uma quimera, é isso que se destaca nesta foto, além dos sorrisos absolutamente felizes.
Essa é minha descoberta nesta manhã de outono. Minha fluidez. Não tenho "substância", por isso me apeguei a coisas do passado e depois me fascinei por modernidades. Mas, eu, mesma, qual seria a minha preferência? Agora, sozinha, o que escolheria? Acho que minha única escolha própria são os livros. Nem sequer os livros em si, mas as histórias contidas nestes livros. As quimeras.

Thursday, May 13, 2010

Perdi o Baudelaire

Tanto que eu quis publicar um texto que li, de Baudelaire falando sobre arte e fotografia, mas a incompetência cibernética me impediu. Agora não sei mais onde anda o Baudelaire. Por aí, pelo espaço. E eu perdi a vontade de falar sobre arte, perdi a vontade de falar do Baudelaire, estou meio blasée. Tem épocas que acho que o mundo conspira contra mim: Procuro uma revista no jornaleiro e não acho. Leio textos e não os compreendo. Vejo meus prazos se esgotarem, e não reajo. Sei lá. 
O vento lá fora canta, e isso me deixa inquieta. O vento agora me sussurra coisas que não consigo mais entender. Houve um tempo em que eu adorava os dias de vento. Em minha casa sem ar condicionado, qualquer corrente de ar era bem vinda. E eu adorava andar na rua nos dias ventosos, cabelos me chicoteando o rosto, e eu andando contra ou a favor do vento, as roupas se agitando e se enfunando a meu redor, como velas prontas a me levar para outros portos. Um dia, parti. Mas parti com destino, e no novo porto encontrei abrigo e âncora firme. Agora minhas velas estão rotas, perdi minha âncora, qualquer ventinho me faz rodopiar. E, por falar em rodopiar, me lembro de um outro dia de vento, distante no tempo, e eu, na janela, vendo as coisas mais disparatadas passarem em frente a ela: roupas, flores, brinquedos, papéis, sapatos, Tudo desfilando em frente ao sexto andar, subindo e descendo num balé sem coreografia, rodopiando loucamente por breves instantes, ameaçando cair e depois subindo, se elevando até andares ainda mais altos. Espantada, acompanhava com os olhos aquele espetáculo, sem me dar conta do perigo que representava. Mesas e cadeiras de plástico passaram voando, colchonetes, guarda-chuvas revirados, expondo seus esqueletos.  Quando se passou isso? Já não sei. As lembranças agora se misturam, se combinam, se perfeccionam em matéria de sonhos ainda não sonhados. Houve um dia de vento que testemunhei. Talvez Baudelaire tenha passado voando em frente aos meus olhos, naquela data. Talvez essa seja a data de seu desaparecimento. Talvez tenha sido aquele o dia em que o conheci. Hoje ele se foi, então, num vento muito mais brando. Mas não há como segurá-lo, as raízes não se fincam na areia das ampulhetas. Baudelaire, Drummond, Rimbaud, Bandeira, Verlaine, João Cabral, Anna Akmahtova, Paul Celan, Secchin, Adrienne Rich, magos de palavras que sopram pela minha vida e me inquietam, desfilando horrores e imprecisões, bisturis e lucidez… Olhando o turbilhão não percebo os perigos e me mantenho, fascinada, à janela, sonhando em criar asas.

Sunday, May 09, 2010

Dia das mães

Destesto dia em que a gente se sente na obrigação de ser feliz! Sempre impliquei com essas obrigações: estar apaixonado no dia dos namorados, se sentir livre no Carnaval, honrar pai e mãe nos dias respectivos, dar um exagero de presentes no Natal, achar que tudo vai mudar no Ano Novo, e por aí vai… O pior de tudo é que cada vez sinto mais patente essa tradução de amor e carinho em $$$$. Fulano ama tanto sua mãe que lhe dá um carro, mas Sicrana supera seu amor, pois lhe dá um apartamento. E o filho da mendiga? O quanto ele sofre e se sente inferiorizado porque ao invés de dar um conjunto estofado da casa Bahia só pode dar para sua mãe a bala que estava guardando há tanto tempo, e que já está até melada? Pois, para mim, tem mais valor o taxista que me trouxe ontem para a casa, que me confessou que gostaria muito de ir ver as acrobacias aéreas, mas não ia poder, pois era dia das Mães. "Prefiro ficar com ela", foi a frase despretensiosa que ouvi, de um homem jovem, bem apessoado, que não estava querendo impressionar ninguém e que, por delicadeza, talvez nem comente seu desejo de ver os aviõezinhos se arriscando enquanto riscam os ares. E aí eu penso: E estes pilotos, será que eles não têm mães? Qual a mãe que vê seu filho fazendo essas maluquices sem sentir as garras do temor em volta de seu coração? Me lembro da amiga que ganhou de presente, de seus filhos, o filme dos dois se atirando de Bungee-Jump. Ao invés de uma declaração de amor piegas e melosa dos filhos distantes, ela vê o que lhe parece uma tentativa de suicídio! Ficou mal, chorou, mas os filhos riram dela e a chamaram de boba. "Mamãe exagera", foi o que eles me disseram, quando os encontrei. O pior é que a gente se controla, amarra um sorriso, diz com voz um pouco trêmula "Meu filho, tome cuidado!". E fica tentando se convencer de que o importante é que nossos filhos vivam felizes; que nós não devemos impedi-los; que eles sabem o que estão fazendo e que mais vale uma vida bem vivida que a pusilanimidade.
Passamos a vida fingindo que está tudo bem, quando, na verdade, a vida é uma sucessão de perdas primordiais que vamos tentando preencher com nossos atos. Nascemos e somos, imediatamente, mutilados: cortam nosso cordão umbilical, até então nosso suprimento de tudo o que necessitávamos. Temos que começar a respirar, sugar, chorar, comunicar, exigir, lutar. E nossa testemunha, desde o início, é nossa mãe. E é por que ela se comove com nossa fragilidade, por que ela se esforça para nos compreender, porque traduz nossos vagidos, é por ela ser quem é que sobrevivemos. E aí, chega um dia, e a gente pensa que pode, com um anel de brilhante, agradecer o que ela fez por nós. Um abraço, beijos, um presente e logo partimos para nossa própria satisfação, para nossas obrigações, para longe… E nem guardamos na lembrança o rosto que, de ano para ano, se apaga um pouco mais…
Hoje estou muito argumentativa! Só estou solidária com aqueles filhos que, como o Chico Buarque, passam seu primeiro dia das mães de órfãos. Estes, acredito, devem estar refletindo no verdadeiro valor de suas mães. Liberados do presentinho, que depende de seus bolsos, podem pensar em suas mães com seus corações vulneráveis pela ferida recente.
Mãe, seu colo, seu silêncio, suas implicâncias, os instantes de prazer e alegria que passamos a seu lado e depois os instantes em que nos alegrávamos por não mais precisarmos de sua presença e ajuda. Mãe com seus ralhos e implicâncias, com suas impaciências e seus transbordamentos. Mãe.

Thursday, May 06, 2010

Tirado da Gazeta do Povo 05.05.10

Leitura sem piedade
Em meados da década, o antropólogo Felipe Lindoso – um dos virtuosos do mercado editorial brasileiro – publicou um estudo nanico, porém revolucionário, intitulado O Brasil pode se tornar um país de leitores? Deu o que falar. A pergunta, propositalmente com jeito de “e por falar nisso”, teve o efeito de um beliscão de mãe. Há muito se reza a ladainha de que só o ensino e a leitura podem salvar a nação do fogo do inferno. Virou um argumento messiânico. Mas ninguém tinha ousado duvidar da possibilidade de a gente dar um jeitinho de se salvar. Pois é. O risco existe e ao insinuá-lo Lindoso deixa o leitor com a mão no queixo. Ponto para ele. É dessa insegurança que o pesquisador tira proveito para chamar atenção sobre suas teses, tirando da boca do público a velha resposta pronta para as mazelas nacionais. E a mais importante de suas teses é que só se vai vencer a batalha do livro e da leitura com estratégias agressivas e certeiras, semelhante às dedicadas ao agronegócio ou ao setor de energia.

A tática de guerra é a seguinte. Sabe-se que os índices de leitura se movem, para cima, a cada vez que a economia aquece. Os êxitos do Plano Cruzado e do Real fizeram com que mais livros fossem retirados das prateleiras, para alegria geral da nação. Mas tolo o país que se fiúza apenas no sobe e desce do mercado para
avaliar seu desempenho de leitura. Seria o mesmo que dizer que o aumento nas vendas de barras de chocolate representa que as pessoas aprenderam mais sobre boa alimentação. Para ser um país de homens e mulheres com livros às mancheias é preciso articular três itens: os avanços na educação, a melhoria de renda e o tempo dedicado ao esporte de juntar letrinhas. Eis a questão. Tempo é prioridade, cultura, atividade humana. Não é um índice do IBGE. E fazer com que as pessoas dediquem algumas horas do seu dia ao silêncio da leitura implica dizer que essa prática é tão importante quanto pilotar iPods, ir ao cinema ou gozar das delícias urbanas, para citar algumas donatárias dos relógios contemporâneos.

É assunto complicado, mexe com a alma e a alma é o segredo do negócio. Daí a tentação de confundir bom desempenho com o sucesso dos livros da moda, a exemplo de O Código Da Vinci, de Dan Brown, ou com a saúde financeira das editoras cristãs, às voltas com a piedade e com autoajuda. A essa altura, alguém pode dizer que se volta ao ponto – é tudo uma questão de educação. E é. Não há nada mais educativo do que promover na sociedade a proliferação de agentes de leitura. Que eles sejam tantos quanto os garis, os agentes de saúde e os
professores da rede pública. E que agentes de leitura sejam inclusive esses todos. Caso existam, aos borbotões, esses operários da leitura vão se ocupar de ensinar a ler, a ter boa luz em casa e um lugar adequado para abrir o livro. Mais do que isso. Vão vigiar os currículos es colares, para que privilegiem a leitura. Pro moverão a leitura em voz alta – essa lição de antigamente, caída em desuso nas salas apinhadas das de alunos. Os agentes irão às ruas exigir programas de redução do preço dos livros.

De quebra, farão campanhas em favor do livro que mobilizarão mundos em fundos, tanto as que são feitas para evitar as DSTs, os acidentes de trânsito, a homofobia. Nos palanques, hão de pedir que as verbas de incentivo à cultura não privilegiem tanto os artistas esquecendo-se, sem piedade, dos seus consumidores. Parece um manual de utopia dos anos 60, editado para os anos 2000. E talvez o seja, porque este de fato é uma libido reprimida do Brasil – ser um país de leitores. Chega de lágrimas: é possível, se houver políticas continuadas, se superarmos a marca vergonhosa de 25% dos municípios, apenas, com bibliotecas. Se o livro se tornar importante. Do contrário, a resposta à pergunta de Lindoso será “não”. E não veremos país nenhum.