Em Maceió descubro o verdadeiro significado de liberdade. Imaginem o diálogo:
-- Onde você quer sua liberdade?
-- E liberdade tem lugar?
Isso denunciaria aos alagoanos minha identidade estrangeira, de grande desconhecedora dos caminhos da liberdade. Pois a liberdade aqui é uma linha, que se traça à direita ou à esquerda, ou até mesmo no centro. E não é uma linha imaginária que traçaríamos na cabeça, embora a liberdade aqui esteja na cabeça de todos. A liberdade se desenha com pente ou escova, reparte os cabelos, enfeita os penteados. Liberdade, liberdade.
Mas existe a outra Liberdade aqui em Alagoas, essa liberdade que se expressa nos céus azuis despejados, que aparece nos sorrisos abertos e nas vogais cantadas, que se desenha nos bordados singelos dos artesanatos. Uma liberdade de ser, de mostrar o que se é, de dizer o que se sente, de sentir sem preconceitos.
Maceió me encanta, com seu jeitinho de cidade simples, sem luxos. Com seus restaurantes japoneses que servem bolinhos de bacalhau, com as praias protegidas pelos arrecifes, que enlouquecem nas cores leitosas de azul e verde. Nos peixes que parecem flutuar no ar, de aolímpidas que são as águas; com suas lagoas múltiplas, que escurecem as noites e iluminam os dias. E como não mencionar a brisa, que sopra pontualmente todas as noites, refrescando os passeios e permitindo os amores?
Amanhã partirei, e desde já lamento. Como deixar esta terra de suavidades, se ainda nem conheci seu lado pétreo e firme, que faz a fibra das gentes?
Voltarei,Maceió. Com tempo para me banhar nestas águas macias, para caminhar sobre os caminhos de rochas, para me temperar no sol que seca e define.
Saturday, November 29, 2008
Monday, November 24, 2008
Matéria de novela
A vida, às vezes, não parece coisa corriqueira, e sim extraordinária, cheia de sentido e de mistérios. Vejam as peripécias que aconteceram comigo no sábado -- ia a uma mera festa de samba, um ensaio de escola, coisa distante porém já classificada como familiar quando me pus a conversar com uma moça, bonita, que acabava de se descobrir grávida.Minha noite de samba mudou-se em outra coisa, numa espécie de maravilhamento -- pois não era só estar grávida: aquela vida que se desenvolvia insuspeitada era o fruto de uma verdadeira odisséia. Uma criança que tinha sido abandonada ao nascer e que vingara, com pais carinhosos, longe da família de sangue e que agora lutava, com a mãe adotiva, pelo direito de ter o seu bebê. Um bebê que vai nascer, segundo a previsão dos médicos, no dia do aniversário da própria mãe que não apenas realiza sua maternidade como recupera os laços sanguíneos já que conseguiu descobrir o paradeiro da mãe de sangue e agora vai fazer um exame de DNA para descobrir o pai. Irmãos ela tem muitos -- dois da família adotiva, mais uns tantos da família da mãe e outros tantos da família do pai. Novela, parece novela, mas é vida. E mistério. Pois a história, com tantos reencontros, nos leva logo a descartar o acaso e a procurar o sentido de tudo isso. Passei a noite meio desligada, depois dessa conversa. Dancei, um pouco, mas nem conversei nem me alegrei em demasia, perdidos que ficaram meus pensamentos nestes caminhos. Coloco-me no lugar dessa moça, ansiando por saber, por conhecer, por entender. E imagino o que não representa esta gravidez, a espécie de vingança contra o destino, as propostas de amor, de devoção, de vínculos jamais partidos. Passei a noite e o dia seguinte rezando para que tudo dê certo, não só para a criança que vem como para a que está ainda guardada e temerosa no espírito dessa jovem. E que, como nas novelas, tudo acabe bem.
Saturday, November 22, 2008
divagações
Acordei, sem vontade.
Há muito tempo que sou assim, pontualmente sem vontade, abro os olhos e vejo que o mundo continua existindo, apesar de...
Isso não significa ...mas, não tenho que explicar nada. Só digo que acordei e fiquei na cama, com a TV ligada, vendo coisas bobas e belas. Notting Hill, um lugar que me lembra um passado de Beatles e de sonhos, e que, revisitado por dois bobões, se torna insípido, embora ainda agradável. Depois, uma obra prima, O Leopardo, e a cena final, de beleza absoluta, solidão pujente e extremo desânimo finalmente me fez ter vontade de sair da cama e recomeçar a rotina, embora sabendo que é preciso que tudo mude para que tudo continue a mesma coisa...
Melancolia, a bile negra que sorvi a pequenos goles cuidadosos junto com o café (acho que vou usar isso no romance, gostei da frase), me acompanhou nas lembranças da noite anterior, de festa e de amigos, gente que guardo com carinho entre os cacos de meu coração (não, essa não vou usar, it's corny, como diriam meus amigos gringos, com uma palavra muito mais simpática que cafona). Festas perigosas, essas, em que voltamos ao passado. Festas maravilhosas, essas, em que encontramos amigos de toda a vida. Saber que vivemos nas memórias de quem vive em nossas memórias é muito legal -- dá uma sensação de amparo, de aconchego. Tipo reunião de família, quando, embora com pouca vivência em comum, reconhecemos nosso DNA. Claro que ali não havia o DNA químico, mas sobrava o afetivo. A gente reconhece os gostos em comum, as lembranças e ditos, ri com piadas que podiam ter sido ditas por nós mesmos, abraça crianças que não são as nossas, mas que poderiam ser, pois as vimos nascer, antes mesmo de serem.
Um abraço, um sorriso, uma notícia, tudo isso nos faz sentir a felicidade do clã. Um rosto cansado, uma fala arrastada, uma cicatriz, tudo isso nos deixa apreensivos e medrosos do amanhã. Junto a tudo, a lembrança daqueles que já não estão. A falta que nos fazem. A partida prematura. Foi no meio desses pensamentos que me chegou o e-mail do mano André, avisando que tinha sido detonado no Idéias. Ora mano, seu resenhista reconhece o essencial -- seu talento. E, se ele não gosta do texto, das histórias, isso é gosto pessoal Não invalida o escrito.
Volto às minhas resenhas, que quero aprontar antes de partir para Maceió. Junto aos dois livrinhos (novos, não houve pulinho nem promessa que me resgatasse os dois volumes perdidos) me aguardam o livro do Galera e o do Amós Oz. Estou curtindo o Cordilheira, pois estou revisitando Buenos Aires através das páginas do Galera. Sei que vou adorar o do Oz, a quem devo, aliás, o título de Linha de sombra, tirado de uma das páginas de seu livro de memórias.
Então vou terminando por aqui, deixando registrado os parabéns para a Cecília, uma das mais maravilhosas mulheres que conheço. Me orgulho de ser sua amiga, de estar em sua lembrança e de ter feito parte da espetacular República das Tabajaras. Um espaço de crescimento e de alegria, que me formou.
Há muito tempo que sou assim, pontualmente sem vontade, abro os olhos e vejo que o mundo continua existindo, apesar de...
Isso não significa ...mas, não tenho que explicar nada. Só digo que acordei e fiquei na cama, com a TV ligada, vendo coisas bobas e belas. Notting Hill, um lugar que me lembra um passado de Beatles e de sonhos, e que, revisitado por dois bobões, se torna insípido, embora ainda agradável. Depois, uma obra prima, O Leopardo, e a cena final, de beleza absoluta, solidão pujente e extremo desânimo finalmente me fez ter vontade de sair da cama e recomeçar a rotina, embora sabendo que é preciso que tudo mude para que tudo continue a mesma coisa...
Melancolia, a bile negra que sorvi a pequenos goles cuidadosos junto com o café (acho que vou usar isso no romance, gostei da frase), me acompanhou nas lembranças da noite anterior, de festa e de amigos, gente que guardo com carinho entre os cacos de meu coração (não, essa não vou usar, it's corny, como diriam meus amigos gringos, com uma palavra muito mais simpática que cafona). Festas perigosas, essas, em que voltamos ao passado. Festas maravilhosas, essas, em que encontramos amigos de toda a vida. Saber que vivemos nas memórias de quem vive em nossas memórias é muito legal -- dá uma sensação de amparo, de aconchego. Tipo reunião de família, quando, embora com pouca vivência em comum, reconhecemos nosso DNA. Claro que ali não havia o DNA químico, mas sobrava o afetivo. A gente reconhece os gostos em comum, as lembranças e ditos, ri com piadas que podiam ter sido ditas por nós mesmos, abraça crianças que não são as nossas, mas que poderiam ser, pois as vimos nascer, antes mesmo de serem.
Um abraço, um sorriso, uma notícia, tudo isso nos faz sentir a felicidade do clã. Um rosto cansado, uma fala arrastada, uma cicatriz, tudo isso nos deixa apreensivos e medrosos do amanhã. Junto a tudo, a lembrança daqueles que já não estão. A falta que nos fazem. A partida prematura. Foi no meio desses pensamentos que me chegou o e-mail do mano André, avisando que tinha sido detonado no Idéias. Ora mano, seu resenhista reconhece o essencial -- seu talento. E, se ele não gosta do texto, das histórias, isso é gosto pessoal Não invalida o escrito.
Volto às minhas resenhas, que quero aprontar antes de partir para Maceió. Junto aos dois livrinhos (novos, não houve pulinho nem promessa que me resgatasse os dois volumes perdidos) me aguardam o livro do Galera e o do Amós Oz. Estou curtindo o Cordilheira, pois estou revisitando Buenos Aires através das páginas do Galera. Sei que vou adorar o do Oz, a quem devo, aliás, o título de Linha de sombra, tirado de uma das páginas de seu livro de memórias.
Então vou terminando por aqui, deixando registrado os parabéns para a Cecília, uma das mais maravilhosas mulheres que conheço. Me orgulho de ser sua amiga, de estar em sua lembrança e de ter feito parte da espetacular República das Tabajaras. Um espaço de crescimento e de alegria, que me formou.
Thursday, November 20, 2008
Meu livro
Feriado e consciência
Feriado, daqueles saborosos, que caem numa quinta e permitem vadiar até a próxima segunda, dia amanhecendo ensolarado, sem calor -- é coisa que não se pode desprezar. O problema é o título do feriado que inclui consciência e apela para a minha enraigada noção de dever. Droga! Tenho tanto trabalho, que não posso vadiar, nem um pouquinho, só o necessário para escrever algumas linhas aqui no blog, essa minha cachacinha gostosa, que tomo aos golinhos, saboreando a embriaguês. Gosto de vir aqui derramar os pensamentos, pois penso melhor por escrito. Acho que preciso do tempo gasto em escrever para sedimentar as idéias, permitir que elas se combinem entre si, se organizem e organizem meu mundo. Os trabalhos me aguardam e o dia da consciência (negra) me recomenda que volte a eles e esqueça a caminhada pela praia e a água de coco. Vou, então, fazer o que devo. Mas, em sinal de protesto, com roupa de ginástica e chapéu de palha na cabeça!
Tuesday, November 18, 2008
Arte e Literatura
De volta ao Rio, depois do temporal...
Em São Paulo, amigos e literatura e um pouco de arte... Começo pela pouca arte exposta na Bienal, que me lembrou a música dos tempos de criança: eu sou pobre, pobre, pobre, de marré, marré, marré... Um andar vazio -- inteiramente vazio --, onde saí valsando a bela adormecida, que cantarolei prá mim mesma até chegar ao tobogã, lá ao fundo do salão. Recebi as instruções necessárias, acomodei-me no "tapete" voador e mergulhei, veloz, um míssil em direção ao futuro, mesmo se o futuro distasse apenas um segundo. Cheguei e fui saudada por um coro de risos adolescentes, admirados de verem alguém tão distante no tempo, tão próxima no prazer e na coragem. Rimos todos, mas sem desprezos nem zombarias, de pura admiração uns pelos outros, nos assegurando que é possível rir em tempos de crise, de vazio e de estranheza. Recebi a chave da Bienal, depois de trapacear um pouquinho e oferecer em troca uma chave que não é de casa, mas é do coração. Vi fotos, assisti uns filmes divididos em três telas, pequenos documentários se eternizando em múltiplas telas de TV. Procurei os locais de diálogo, de silêncio e de monólogo. Olhei, com olhos indiferentes, outras manifestações que me pareceram tediosas. Depois fui visitar a aranha ali ao lado, no MAM. Mas, a coisa de que mais gostei na Bienal foi ter encontrado meu "livro", bem ali na entrada, antes mesmo do chaveiro. Meu livro desconstruído, as letras esparramadas pelo chão, amontoadas numa pilha onde tudo o que eu precisava fazer era ir recuperando sua ordem lógica. Era o meu livro e também o livro de cada um de nós. Livro que só nós podemos organizar, a partir do caos, o nada que é tudo, como Pessoa definiu o mito. E, já que estamos falando em mitos e em poetas, acho que este é o melhor momento para assinalar a presença do Dr. Mindlin no lançamento do André. Levado por um amigo e vizinho, ele enfrentou uma hora e meia de trânsito para chegar lá e conversar, com a delicadeza que lhe é habitual, com os convivas. A mim me informou que está relendo Proust, com ar de beatitude. Eu, que estou fazendo as resenhas dos livros que não voltei a encontrar e que tive que tornar a comprar, pensei que bastava olhar para a expressão de encantamento no rosto do Dr. Mindlin para descobrir porque ler (e reler) Borges e Dante. O Dr. Mindlin gosta que alguém leia poesia em voz alta para ele -- confissão já repetida muitas vezes por ele, em revistas e paralelos. Dr. Mindlin, que mais uma vez me convidou para visitar sua biblioteca de Babel... Irei, desta vez irei. Será meu presente de Natal a mim mesma...
André estava radiante com seu livro novo, com os amigos à volta, com a entrevista que tinha saído no Estadão. Nós conversamos, tomamos vinho, comemos amendoim japonês colorido e misturado a outras "loucuras", numa brincadeira com a palavra nut. Parecia que estávamos num stand da Record, mas estávamos sós, à deriva, encontrando um pouco de casas e viagens passadas, de notícias antigas, dessas coisas gratas ao coração. Fiquei conhecendo novas pessoas: Plus, encore! Encantadoras, solícitas, de corações grandes e conhecimentos imensos. Um verdadeiro Parnaso. E, já que o equivalente do Parnaso pode ser o céu, saímos da livraria e fomos homenagear o santo guerreiro -- São Jorge, padroeiro dos carnavais e das cervejas. Ele certamente rogou por nós já que além das biritas tivemos deliciosos petisos. Um bela noite. Viva, Dré, que os bons auspícios te acompanhem -- e não me desamparem!
Em São Paulo, amigos e literatura e um pouco de arte... Começo pela pouca arte exposta na Bienal, que me lembrou a música dos tempos de criança: eu sou pobre, pobre, pobre, de marré, marré, marré... Um andar vazio -- inteiramente vazio --, onde saí valsando a bela adormecida, que cantarolei prá mim mesma até chegar ao tobogã, lá ao fundo do salão. Recebi as instruções necessárias, acomodei-me no "tapete" voador e mergulhei, veloz, um míssil em direção ao futuro, mesmo se o futuro distasse apenas um segundo. Cheguei e fui saudada por um coro de risos adolescentes, admirados de verem alguém tão distante no tempo, tão próxima no prazer e na coragem. Rimos todos, mas sem desprezos nem zombarias, de pura admiração uns pelos outros, nos assegurando que é possível rir em tempos de crise, de vazio e de estranheza. Recebi a chave da Bienal, depois de trapacear um pouquinho e oferecer em troca uma chave que não é de casa, mas é do coração. Vi fotos, assisti uns filmes divididos em três telas, pequenos documentários se eternizando em múltiplas telas de TV. Procurei os locais de diálogo, de silêncio e de monólogo. Olhei, com olhos indiferentes, outras manifestações que me pareceram tediosas. Depois fui visitar a aranha ali ao lado, no MAM. Mas, a coisa de que mais gostei na Bienal foi ter encontrado meu "livro", bem ali na entrada, antes mesmo do chaveiro. Meu livro desconstruído, as letras esparramadas pelo chão, amontoadas numa pilha onde tudo o que eu precisava fazer era ir recuperando sua ordem lógica. Era o meu livro e também o livro de cada um de nós. Livro que só nós podemos organizar, a partir do caos, o nada que é tudo, como Pessoa definiu o mito. E, já que estamos falando em mitos e em poetas, acho que este é o melhor momento para assinalar a presença do Dr. Mindlin no lançamento do André. Levado por um amigo e vizinho, ele enfrentou uma hora e meia de trânsito para chegar lá e conversar, com a delicadeza que lhe é habitual, com os convivas. A mim me informou que está relendo Proust, com ar de beatitude. Eu, que estou fazendo as resenhas dos livros que não voltei a encontrar e que tive que tornar a comprar, pensei que bastava olhar para a expressão de encantamento no rosto do Dr. Mindlin para descobrir porque ler (e reler) Borges e Dante. O Dr. Mindlin gosta que alguém leia poesia em voz alta para ele -- confissão já repetida muitas vezes por ele, em revistas e paralelos. Dr. Mindlin, que mais uma vez me convidou para visitar sua biblioteca de Babel... Irei, desta vez irei. Será meu presente de Natal a mim mesma...
André estava radiante com seu livro novo, com os amigos à volta, com a entrevista que tinha saído no Estadão. Nós conversamos, tomamos vinho, comemos amendoim japonês colorido e misturado a outras "loucuras", numa brincadeira com a palavra nut. Parecia que estávamos num stand da Record, mas estávamos sós, à deriva, encontrando um pouco de casas e viagens passadas, de notícias antigas, dessas coisas gratas ao coração. Fiquei conhecendo novas pessoas: Plus, encore! Encantadoras, solícitas, de corações grandes e conhecimentos imensos. Um verdadeiro Parnaso. E, já que o equivalente do Parnaso pode ser o céu, saímos da livraria e fomos homenagear o santo guerreiro -- São Jorge, padroeiro dos carnavais e das cervejas. Ele certamente rogou por nós já que além das biritas tivemos deliciosos petisos. Um bela noite. Viva, Dré, que os bons auspícios te acompanhem -- e não me desamparem!
Monday, November 17, 2008
Sampa
Aqui estou eu, nesta minha Nova Iorque tupiniquim, me encantando com os recantos paulistas. SP é uma cidade que sempre me admira: nas leituras, a grande megalópolis. Ao vivo, a cidade que guarda a dimensão humana, que preserva casas e árvores, que tem vendedores com jeitinho de província -- uma mistura sempre renovada, sempre surpreendente. E esse ar de colcha de retalhos, com um pedacinho de seda oriental, outro de arraiolos, outro de mantilha espanhola, outro de algodão de jerusalém.. Cada bairro com seu sotaque diferente, suas memórias e códigos, seus perigos insuspeitados. Suas ladeiras, culminando na Paulista, seus vales e rios insubordinados, seu mar de carros impedindo a passagem embora se proponha a nos conduzir de uma zona a outra. Adoro SP, mesmo com o frio e a chuva que chegam sorrateiramente, depois de um dia de sol e calor, só para enganar a carioca desavisada.
Hoje é o lançamento do livro do André de Leones, e daqui a pouco estarei lá, na Livraria da Vila. Segunda feira fria e chuvosa, que vai se aquecer graças aos abraços amigos e se iluminar com o sorriso dos reencontros. Enquanto espero, leio, e converso, e telefono, e relembro.
Hoje é o lançamento do livro do André de Leones, e daqui a pouco estarei lá, na Livraria da Vila. Segunda feira fria e chuvosa, que vai se aquecer graças aos abraços amigos e se iluminar com o sorriso dos reencontros. Enquanto espero, leio, e converso, e telefono, e relembro.
Thursday, November 13, 2008
Ao pé da letra
Não me levem ao pé da letra, pois as coisas que escrevo aqui não correspondem a uma realidade "real", mas a uma realidade "percebida". Não sou deprimida, nem solitária, nem infeliz. O que não consigo é me conformar com a perda de um interlocutor privilegiado, com quem eu podia falar desde o preço do feijão até meu medo da crise, desde revista em quadrinho até Tolstói, e que, ainda por cima, fazia com que eu me sentisse mais bonita, mais inteligente, mais desenvolta com seus comentários. Tenho muitos amigos, e adoro todos eles. Mas preservo minha "solidão", pois, como disse a Virginia Woolf, é necessário ter um canto só seu para se poder escrever. Uma de minhas amigas (que são de todas as idades, e disso me orgulho muito) faz 9o anos em junho. Mora sozinha, não tem filhos, é viúva, mas dentre todas as pessoas que conheço é a que tem mais alegria de viver. Viaja todos os anos, mais de uma vez. Sempre tem programas, almoços, teatros, jogos de biriba. Às vezes ela viaja comigo, e, por uma ou outra razão, preciso sair sozinha para dar uma aula, por exemplo. Preocupo-me, convido-a para ir comigo, digo que não quero deixá-la sozinha e ela me responde: Mas eu sou ótima companhia para mim mesma! E é verdade. Ela lê, ela vê filmes, escuta música, telefona (isso eu não faço). Quando volto, ela está maravilhosamente bem, com mil coisas para falar à cerca daquilo que leu ou que viu ou que escutou. Quando estamos juntas, sempre rimos muito -- ela é engraçada, tem tiradas maravilhosas e é uma namoradeira. Seus olhos, brilhantes, estão sempre dançando pelos rostos masculinos, avaliando-os com o que eu julgo ser experiência de boa conhecedora. E ela é uma grande professora, está sempre me dando lições de vida, sem fazer sermões, só pelo exemplo e pelos comentários. Só ela mesmo para me animar a pegar o carro e atravessar a ponte na hora do rush para ir assistir um filme "imperdível" em Niterói. E quando lhe disse que eu adorava o passeio pela ponte, ela concordou entusiasmada, dizendo: Isso devia ser cobrado em dólar! Olhe para esse mar dos dois lados! Olhe para as montanhas! Só cobrando em dólar!
Vimos o filme, voltamos, jantamos, fizemos planos para a próxima saída e lá foi ela de táxi para a casa, pois estávamos ao lado de minha casa e ela não permitiu que a levasse. "Eu gosto de andar de táxi, e os motoristas gostam de dirigir", justificou-se ela. E eu fico por aqui, dizendo: Eu gosto de você, minha amiga, e sei o quanto devo a sua alegria e compaixão, que me ajudaram a atravessar os dias mais tenebrosos de minhas angústias.
Tenho, ou tive, outra amiga, que se foi cedo e deixou uma grande saudade. Era médica, e sabia que não tinha muito tempo, mas eu não acreditava, pois na época ainda pensávamos que éramos todos imortais. Ela saía comigo e ia olhando as árvores, bebendo aquelas imagens, com intensidade. Eu também sou grande admiradora de árvores e, quando estas estão floridas e ostentam suas cores vibrantes contra o céu, fico deslumbrada. Minha amiga, porém, tinha outra intenção -- a mim me parecia que ela queria guardar aquelas imagens, gravá-las, apropriar-se delas para levá-las a uma outra vida. Espero que ela e Guilherme estejam nesta outra realidade, ambos com suas provisões de imagens belas. Mira com as árvores, Gui com o por do sol sobre o mar. Eu ficarei feliz se, numa outra vida, tiver a visão dos rostos deles contemplando suas belezas prediletas.
Vimos o filme, voltamos, jantamos, fizemos planos para a próxima saída e lá foi ela de táxi para a casa, pois estávamos ao lado de minha casa e ela não permitiu que a levasse. "Eu gosto de andar de táxi, e os motoristas gostam de dirigir", justificou-se ela. E eu fico por aqui, dizendo: Eu gosto de você, minha amiga, e sei o quanto devo a sua alegria e compaixão, que me ajudaram a atravessar os dias mais tenebrosos de minhas angústias.
Tenho, ou tive, outra amiga, que se foi cedo e deixou uma grande saudade. Era médica, e sabia que não tinha muito tempo, mas eu não acreditava, pois na época ainda pensávamos que éramos todos imortais. Ela saía comigo e ia olhando as árvores, bebendo aquelas imagens, com intensidade. Eu também sou grande admiradora de árvores e, quando estas estão floridas e ostentam suas cores vibrantes contra o céu, fico deslumbrada. Minha amiga, porém, tinha outra intenção -- a mim me parecia que ela queria guardar aquelas imagens, gravá-las, apropriar-se delas para levá-las a uma outra vida. Espero que ela e Guilherme estejam nesta outra realidade, ambos com suas provisões de imagens belas. Mira com as árvores, Gui com o por do sol sobre o mar. Eu ficarei feliz se, numa outra vida, tiver a visão dos rostos deles contemplando suas belezas prediletas.
Tuesday, November 11, 2008
Maluca beleza
Se não existissem a internet e os blogs eu estaria fazendo parte de uma raça que já foi conhecida como "maluco beleza" -- andaria por aí, falando sozinha, pois converso aqui com o blog, já que não tenho com quem falar. Será que isso me faz mais sã do que aqueles mendigos vociferantes? Nos velhos tempos de Posto 6 havia um mendigo, que cheirava éter, a quem minha família me proibia de dar esmola, para ele não insistir no vício. Quando virei adolescente rebelde, o mendigo, que parecia eterno, continuava por ali e eu passei a lhe dar o pouco trocado que tinha, penalizada -- se todo o prazer que aquele homem tinha se concentrava num frasquinho de éter, porque eu não o ajudaria a obter? Sei lá, posso estar moralmente errada, mas eu não conseguiria transformar aquele ser num ser humano outra vez, com dignidade. Então lhe oferecia uma contribuição para o delírio, onde ele poderia ser o que quisesse, inclusive voltar a ser humano.
Agora aqui por perto há uma mendiga, muito mal-humorada, que vive vociferando pela esquina. De vez em quando ela some, depois volta, interpelando os passantes. Eu passo pouco pelas ruas, mas já cruzei com ela algumas vezes. Ela está sempre numa espécie de comício, gesticulando. Ninguém para e conversa com ela, mas já vi muitas pessoas pararem por perto e ficarem rindo dela. Talvez bastasse alguém para ouvi-la se queixar (de quê? não consigo entender o que ela diz quando passo apressada) e esta mulher pudesse voltar a ser alguém com outros sentimentos que não a mágoa e a revolta. Mas somos todos covardes, a começar por mim, que reclamo de não ter com quem falar, mas também não desejo ser interlocutora da mendiga.
Há muitos mendigos por aqui -- um rapaz que dorme pela calçada, até tarde, talvez sentindo-se mais protegido pela luz do dia. À noite deve vaguear assustado, e de manhã dorme, indiferente à luz e aos ruídos. Talvez tenha sido ele o rapaz que me cortou o coração, no dia em que o ouvi pedindo esmola a um senhor que passava, que deve lhe dar alguma coisa costumeiramente, pois ele dizia: não quero dinheiro, quero um agasalho. Até hoje, ao contar isso, meus olhos se enchem de lágrimas (que não derramo, ser racional e experimentado que sou). Tive vontade de ir comprar para ele casacos e suéteres, meias, sapato, o que ele precisasse para mitigar o frio. Mas não fiz nada disso. Continuei o meu caminho, e hoje me consolo pensando que, por mais que eu oferecesse roupas, o frio de que ele precisava se proteger era o da indiferença social. Como é que não cuidamos de nossos vizinhos? Quando deixamos de ser habitantes de aldeias, onde todos podem compartilhar o pão e o agasalho, e podem se sentar ao redor de uma fogueira e contar suas histórias, ouvir outras, com-viver?
Ao invés disso, aqui estamos, em frente de uma tela, seja de computador ou de TV, cada vez mais solitários, menos solidários, mais malucos e menos beleza.
Agora aqui por perto há uma mendiga, muito mal-humorada, que vive vociferando pela esquina. De vez em quando ela some, depois volta, interpelando os passantes. Eu passo pouco pelas ruas, mas já cruzei com ela algumas vezes. Ela está sempre numa espécie de comício, gesticulando. Ninguém para e conversa com ela, mas já vi muitas pessoas pararem por perto e ficarem rindo dela. Talvez bastasse alguém para ouvi-la se queixar (de quê? não consigo entender o que ela diz quando passo apressada) e esta mulher pudesse voltar a ser alguém com outros sentimentos que não a mágoa e a revolta. Mas somos todos covardes, a começar por mim, que reclamo de não ter com quem falar, mas também não desejo ser interlocutora da mendiga.
Há muitos mendigos por aqui -- um rapaz que dorme pela calçada, até tarde, talvez sentindo-se mais protegido pela luz do dia. À noite deve vaguear assustado, e de manhã dorme, indiferente à luz e aos ruídos. Talvez tenha sido ele o rapaz que me cortou o coração, no dia em que o ouvi pedindo esmola a um senhor que passava, que deve lhe dar alguma coisa costumeiramente, pois ele dizia: não quero dinheiro, quero um agasalho. Até hoje, ao contar isso, meus olhos se enchem de lágrimas (que não derramo, ser racional e experimentado que sou). Tive vontade de ir comprar para ele casacos e suéteres, meias, sapato, o que ele precisasse para mitigar o frio. Mas não fiz nada disso. Continuei o meu caminho, e hoje me consolo pensando que, por mais que eu oferecesse roupas, o frio de que ele precisava se proteger era o da indiferença social. Como é que não cuidamos de nossos vizinhos? Quando deixamos de ser habitantes de aldeias, onde todos podem compartilhar o pão e o agasalho, e podem se sentar ao redor de uma fogueira e contar suas histórias, ouvir outras, com-viver?
Ao invés disso, aqui estamos, em frente de uma tela, seja de computador ou de TV, cada vez mais solitários, menos solidários, mais malucos e menos beleza.
Sunday, November 09, 2008
idade e irrealidade
Muita gente se esquece que o tempo é uma invenção -- e convenção -- humana. Essa coisa de horas, minutos, segundos que se acumulam em semanas e em anos, séculos e milênios, é tudo fruto de nossa cabeça, de nosso desejo de ordenação. Mas existir mesmo, só existem manhãs, tardes e noites, que se sucedem apenas graças ao passeio da terra em torno do sol. Um besouro em volta da chama de uma vela, esse nosso planeta.
Vejam só as horas -- dividimos o globo terrestre em fatias horárias, numa espécie de aberração -- se duas pessoas estão se beijando, sobre a linha fronteiriça de um dos fusos horários, porque um estará beijando às onze e outro ao meio-dia?
Essa questão de idade também é bem convencional. Algumas pessoas têm corpo jovem e espírito velho, cheirando à naftalina. Outras têm espírito quase infantil, imaturo, e vivem em corpos decadentes, como uma casa em ruínas. A gente tenta ir equilibrando desgaste (ou amadurecimento) mental e físico, do mesmo jeito que, no café da manhã, vamos tentando fazer nosso pão com manteiga acabar junto da xícara de café.
Mas o que me horrorizou na questão de maridos e mangas, é a transformação de gente em acessório. Eu tive um marido, com apenas mais quatro anos que eu, e nunca pensei nele como um par de sapatos. E tenho a certeza de que ele nunca pensou em mim como um carro do ano. Reajam, maridos em potencial -- Se uma mulher de mais de 38 se achegar, tentando fazer que algum de vocês se adapte a um modelo Casas Bahia ou Ferragamo, resista! Não se deixe consumir. E isso vale para as mulheres também. Se algum homem quiser que você seja modelo e manequim, ou mãe de família, fuja dele! Sejam vocês mesmos, múltiplos, individuais, surpreendentes -- seres vivos e vibrantes. Mas cheios de amor, interessados no outro, e não apenas no próprio umbigo!
Vejam só as horas -- dividimos o globo terrestre em fatias horárias, numa espécie de aberração -- se duas pessoas estão se beijando, sobre a linha fronteiriça de um dos fusos horários, porque um estará beijando às onze e outro ao meio-dia?
Essa questão de idade também é bem convencional. Algumas pessoas têm corpo jovem e espírito velho, cheirando à naftalina. Outras têm espírito quase infantil, imaturo, e vivem em corpos decadentes, como uma casa em ruínas. A gente tenta ir equilibrando desgaste (ou amadurecimento) mental e físico, do mesmo jeito que, no café da manhã, vamos tentando fazer nosso pão com manteiga acabar junto da xícara de café.
Mas o que me horrorizou na questão de maridos e mangas, é a transformação de gente em acessório. Eu tive um marido, com apenas mais quatro anos que eu, e nunca pensei nele como um par de sapatos. E tenho a certeza de que ele nunca pensou em mim como um carro do ano. Reajam, maridos em potencial -- Se uma mulher de mais de 38 se achegar, tentando fazer que algum de vocês se adapte a um modelo Casas Bahia ou Ferragamo, resista! Não se deixe consumir. E isso vale para as mulheres também. Se algum homem quiser que você seja modelo e manequim, ou mãe de família, fuja dele! Sejam vocês mesmos, múltiplos, individuais, surpreendentes -- seres vivos e vibrantes. Mas cheios de amor, interessados no outro, e não apenas no próprio umbigo!
Da vida dos objetos inanimados
Quando era pequena, certas histórias me fascinavam -- a revolta dos brinquedos, por exemplo. Adorava estas possibilidades mágicas, de que, quando não observados, os objetos pudessem existir de uma maneira independente, e que se movimentassem, pensassem, interagissem, assim como nós. Com o tempo, e a invenção das câmaras de vigilância, essa minha crença se desfez. Somente alguns objetos parecem ainda conservar seus poderes, pelo menos aqui em casa: livros e facas.
Qual será o mistério desses seres?
Alguns me abandonam para sempre -- livros que estou procurando há mais de ano, e que ou foram emprestados e não devolvidos, ou sumiram graças a alguma arrumação apressada, motivada por absoluta falta de espaço em cima das poltronas ou de minha própria cama. Sim, durmo com livros, numa licenciosidade absoluta. Quantos autores e autoras já não passaram pela minha cama? Perdi a conta. Alguns dormiram o sono de pedra dos jamais abertos... poucos. Geralmente convido aqueles de que mais gosto.
Quando estou doente -- coisa rara, minhas mazelas são do espírito, não do corpo -- eles se reúnem no meu leito, como médicos numa junta. Ora um me sussurra um pensamento, ora outro me faz rir com uma piada, outro, ainda, me rapta e me faz esquecer a dor, ou a febre, ou seja lá o que for, e me leva para paraísos perdidos, ou tenebrosos esconderijos. E converso com as personagens que se acomodam a meu lado, sem precisar dizer palavra, apenas através dos pensamentos, rápidos, instantâneos, quase incompreensíveis.
Mas, no mundo acordado, os livros me pregam peças. Começo a ler um livro, e, se porventura preciso parar, alguns, mais dóceis, me aguardam com o marcador porto no lugar, sem protesto. Outros, voluntariosos, se encantam e somem. E lá fico eu, procurando-os por dias e meses a fio, até que, apaziguados, eles se mostram outra vez, e se deixam terminar de ler. Um dos livros que tem brincado de esconder comigo é Memórias de la niña mala, do Vargas Llosa. Comprei-o em espanhol, antes de sair aqui no Brasil, e comecei a ler lá mesmo na Argentina. Depois, volúvel, comecei a leitura de outro, e o livro, suscetível, até hoje ainda não se deixou ler: de vez em quando o encontro, mas ele volta a se esconder com habilidade de espião.
Agora estou a procura dos dois Por que ler -- Dante e Borges. Tenho que resenhá-los e os marotos não se deixam encontrar. Por favor, apareçam. Não sei se se assustaram com a inundação aqui em casa, no mês passado, o fato é que já olhei por toda a parte e os danadinhos não apareceram. Também não vi o do Vargas Llosa. Quem sabe estão compartilhando o esconderijo?
Lá vou eu, mais uma vez, em seu encalço.
Qual será o mistério desses seres?
Alguns me abandonam para sempre -- livros que estou procurando há mais de ano, e que ou foram emprestados e não devolvidos, ou sumiram graças a alguma arrumação apressada, motivada por absoluta falta de espaço em cima das poltronas ou de minha própria cama. Sim, durmo com livros, numa licenciosidade absoluta. Quantos autores e autoras já não passaram pela minha cama? Perdi a conta. Alguns dormiram o sono de pedra dos jamais abertos... poucos. Geralmente convido aqueles de que mais gosto.
Quando estou doente -- coisa rara, minhas mazelas são do espírito, não do corpo -- eles se reúnem no meu leito, como médicos numa junta. Ora um me sussurra um pensamento, ora outro me faz rir com uma piada, outro, ainda, me rapta e me faz esquecer a dor, ou a febre, ou seja lá o que for, e me leva para paraísos perdidos, ou tenebrosos esconderijos. E converso com as personagens que se acomodam a meu lado, sem precisar dizer palavra, apenas através dos pensamentos, rápidos, instantâneos, quase incompreensíveis.
Mas, no mundo acordado, os livros me pregam peças. Começo a ler um livro, e, se porventura preciso parar, alguns, mais dóceis, me aguardam com o marcador porto no lugar, sem protesto. Outros, voluntariosos, se encantam e somem. E lá fico eu, procurando-os por dias e meses a fio, até que, apaziguados, eles se mostram outra vez, e se deixam terminar de ler. Um dos livros que tem brincado de esconder comigo é Memórias de la niña mala, do Vargas Llosa. Comprei-o em espanhol, antes de sair aqui no Brasil, e comecei a ler lá mesmo na Argentina. Depois, volúvel, comecei a leitura de outro, e o livro, suscetível, até hoje ainda não se deixou ler: de vez em quando o encontro, mas ele volta a se esconder com habilidade de espião.
Agora estou a procura dos dois Por que ler -- Dante e Borges. Tenho que resenhá-los e os marotos não se deixam encontrar. Por favor, apareçam. Não sei se se assustaram com a inundação aqui em casa, no mês passado, o fato é que já olhei por toda a parte e os danadinhos não apareceram. Também não vi o do Vargas Llosa. Quem sabe estão compartilhando o esconderijo?
Lá vou eu, mais uma vez, em seu encalço.
Saturday, November 08, 2008
Você pensa que marido é manga....
Deu no jornal, hoje: depois dos 38 toda mulher tem que ter um marido e um vestido com manga.
A princípio eu achei que tinha entendido mal. Reli o trecho do Caderno Ela e confirmei. Pobres homens. Viraram item de consumo... Imagine a festa de aniversário da perua, as amigas fazendo uma vaquinha para comprar ... um vestido de manga, óbvio, que nenhuma ia ser tola de comprar um marido para outra. Imagine, os maridos estão tão escassos, há notícia de gente que está na fila para comprar um modelo Louis Vuitton, no mínimo seis meses de espera. Dizem que em NY estão vendendo uns maridos fake, made in China, mas que dão muito defeito nas partes essenciais. Bem, eu já passei dos 38, já tenho um vestido de manga, agora me falta um marido. Mas será que qualquer modelo serve? Será que a gente tem que ficar trocando, igual computador? Modelo 6.0, modelo 4.5, modelo 3.7? O vestido de manga vem explicado, não serve manga sino. Mas o que será manga sino? Com marido e sem sino, isso só pode querer dizer uma coisa: a mulher, depois dos 38, não pode mais badalar...Será?
Vou passar um fim de semana cheio de questões para resolver. Ainda mais depois que fui assistir ao novo filme do Woody Allen - Vicky Christina Barcelona - Imperdível. Só mesmo o Woody Allen para ter coragem de fazer um filme quase que todo narrado. Escandaloso! E, na minha opinião, adorável. E a fábula mais que humana que ele conta, essa nossa impossibilidade de nos contentarmos com o amor, é fantástica. E moderna, engraçada e muito louca. Mas, se quiserem saber o que achei melhor de tudo no filme, foi o "pai", o fabuloso poeta que nunca escreveu nada para não macular as palavras... Que idéia! Outra coisa, que cenários! e que elenco! Woody Allen, agora que estou com mais de 38, quem sabe você quer casar comigo? -- Suspeito, porém, que em alguma revista masculina, tenha sido decretado que todo homem, com mais de 50 anos, deve ter uma mulher de 22, e uma camiseta sem manga....
A princípio eu achei que tinha entendido mal. Reli o trecho do Caderno Ela e confirmei. Pobres homens. Viraram item de consumo... Imagine a festa de aniversário da perua, as amigas fazendo uma vaquinha para comprar ... um vestido de manga, óbvio, que nenhuma ia ser tola de comprar um marido para outra. Imagine, os maridos estão tão escassos, há notícia de gente que está na fila para comprar um modelo Louis Vuitton, no mínimo seis meses de espera. Dizem que em NY estão vendendo uns maridos fake, made in China, mas que dão muito defeito nas partes essenciais. Bem, eu já passei dos 38, já tenho um vestido de manga, agora me falta um marido. Mas será que qualquer modelo serve? Será que a gente tem que ficar trocando, igual computador? Modelo 6.0, modelo 4.5, modelo 3.7? O vestido de manga vem explicado, não serve manga sino. Mas o que será manga sino? Com marido e sem sino, isso só pode querer dizer uma coisa: a mulher, depois dos 38, não pode mais badalar...Será?
Vou passar um fim de semana cheio de questões para resolver. Ainda mais depois que fui assistir ao novo filme do Woody Allen - Vicky Christina Barcelona - Imperdível. Só mesmo o Woody Allen para ter coragem de fazer um filme quase que todo narrado. Escandaloso! E, na minha opinião, adorável. E a fábula mais que humana que ele conta, essa nossa impossibilidade de nos contentarmos com o amor, é fantástica. E moderna, engraçada e muito louca. Mas, se quiserem saber o que achei melhor de tudo no filme, foi o "pai", o fabuloso poeta que nunca escreveu nada para não macular as palavras... Que idéia! Outra coisa, que cenários! e que elenco! Woody Allen, agora que estou com mais de 38, quem sabe você quer casar comigo? -- Suspeito, porém, que em alguma revista masculina, tenha sido decretado que todo homem, com mais de 50 anos, deve ter uma mulher de 22, e uma camiseta sem manga....
Thursday, November 06, 2008
Realidade paralela
Hoje fui ao cabeleireiro -- programa que faço com alguma parcimônia, mas com constância suficiente para que me recebam bem e me ofereçam cafezinho e revista. Geralmente aceito o café e passo a revista, mas, desta vez, fiz o contrário. E me vi com uma revista no colo, com fotos de gente que nunca vi e de outras que já vi, mas que não reconheceria se não fossem as legendas. As manchetes eram .... como direi? ... irrelevantes. Lázaro e Thais juntos outra vez. Ah, bom. Não quis saber onde, pois já olhava para uma foto desfocada de Luana beijando o ex-da Ivete. Huumm. Depois o pessoal se espanta com as epidemias. Aparentemente o carinha sortudo já andou beijando meio mundo. Me fez lembrar de um sujeito -- hoje fora das manchetes -- que serviu de pai para quase todos os bebês de atrizes de TV. Esqueci o nome dele. Mas foi pai de filho da Elba Ramalho e depois foi sendo descartado e reaproveitado por umas e outras até que, finalmente, foi esquecido. Ah, outro candidato a pai geral é o Fábio Jr. Mas, coitado, numa entressafra, ele encontrou o cirurgião plástico do Michael Jackson -- os dois estão com a mesma cara, ou deveria dizer máscara?
Mas o que mais me espantou na dita revista foi a reportagem de várias páginas com Susana Vieira na Bienal. Pensei que eu é que estava com o surto psicótico de nossa mais nova autora de sucesso, Adriana Calcanhoto, mas era verdade. Lá estava ela pousando, com as pernas abertas e braços na cintura, enfrentando resoluta uma parede cheia de obras de arte. Susana, a crítica de arte -- extraordinário! Devo estar vivendo numa das realidades paralelas de que fala o Paul Auster, citando Giordano Bruno. Como é que vim parar aqui? Acho que a culpa é minha, por falar muito no celular...
De volta a casa, folheio o maravilhoso Sermão de Quarta-Feira de Cinza, pregado por Vieira no ano de 1672: Memento homo quia pulvis es, et in pulverem reverteris... És pó, e ao pó retornarás. Mas acho que os editores da revista andam abusando desse pó....
Mas o que mais me espantou na dita revista foi a reportagem de várias páginas com Susana Vieira na Bienal. Pensei que eu é que estava com o surto psicótico de nossa mais nova autora de sucesso, Adriana Calcanhoto, mas era verdade. Lá estava ela pousando, com as pernas abertas e braços na cintura, enfrentando resoluta uma parede cheia de obras de arte. Susana, a crítica de arte -- extraordinário! Devo estar vivendo numa das realidades paralelas de que fala o Paul Auster, citando Giordano Bruno. Como é que vim parar aqui? Acho que a culpa é minha, por falar muito no celular...
De volta a casa, folheio o maravilhoso Sermão de Quarta-Feira de Cinza, pregado por Vieira no ano de 1672: Memento homo quia pulvis es, et in pulverem reverteris... És pó, e ao pó retornarás. Mas acho que os editores da revista andam abusando desse pó....
Wednesday, November 05, 2008
Era de aquário, peixes ou áries?
Procurando um título para meu post de hoje, me lembrei do filme falando sobre os anos 60, quando todos nós sonhávamos com Paz e Amor. Os cariocas elegeram Paes no Rio (infame trocadilho), teriam os americanos eleito Amor nos EUA? Alguma forma de amor, sem dúvida, de alguém que se diz construtor de pontes entre as diferenças, ele mesmo um traço de união entre um negro e uma branca, entre um estrangeiro e uma cidadã, entre o desejo e a realidade. Assisti ao seu discurso de vitória -- um belo discurso, inspirador, sem muita demagogia, lembrando dos limites rompidos. Discurso de um bom escritor. Pensei em como o mundo vem suplicando por mudanças: as eleições de Lula, Chavez, Morales e Obama são sintomáticas -- ninguém quer mais do mesmo, todos estão apostando suas fichas na mudança. E, com isso, ninguém se preocupa muito com programas de governo, com propostas realistas -- o que se deseja é o ideal, às favas com o real que está nos levando à destruição. E querem as mudanças já, para ontem. Querem o símbolo e a velocidade. Querem a juventude para frear a caducidade deste nosso fim de império. Me comparei à velhinha emblemática citada por Obama -- quantas coisas ela presenciou -- quantas coisas eu presenciei... Costumo brincar com meus alunos que pertenço à pré-história da humanidade, pois durante minha vida, passei de telefone fixo e sempre mudo a celulares inoportunos; de mapas a GPS; de raio X a raio laser... Homem na Lua, Muro de Berlim, Glasnost, nada disso me é estranho. Vi o herói de Marlboro virar vítima do câncer, o coquetel de Martini se transformar em coquetel anti-aids. Meninos, eu vi -- já dizia o poema.
Esperançosa por profissão (afinal, sou brasileira), assisto essa nova era se aproximando. Ainda dá tempo? Deve dar. E tudo vai dar certo, no final. Porque -- quem se lembra? -- já nos ameaçaram com tudo, de bomba H, bomba de nêutrons, à "maré vermelha"; agora é o aquecimento global, o fim do capitalismo, essas coisas. Os filósofos nos falam da modernidade líquida -- mudanças, fluidez, insegurança -- mas eu digo que sempre fui fã do caminho das águas. Confrontada com um obstáculo, a água se desvia, procura, encontra uma passagem. Passemos, então, da era de aquário para a era de peixes -- aprendamos a nadar livres, sem as barreiras impostas pelo vidro. Mas que a era de áries não chegue já -- que os cabeças duras se afastem! Que de áries só nos cheguem os carneiros, com sua maciez e aconchego.
Esperançosa por profissão (afinal, sou brasileira), assisto essa nova era se aproximando. Ainda dá tempo? Deve dar. E tudo vai dar certo, no final. Porque -- quem se lembra? -- já nos ameaçaram com tudo, de bomba H, bomba de nêutrons, à "maré vermelha"; agora é o aquecimento global, o fim do capitalismo, essas coisas. Os filósofos nos falam da modernidade líquida -- mudanças, fluidez, insegurança -- mas eu digo que sempre fui fã do caminho das águas. Confrontada com um obstáculo, a água se desvia, procura, encontra uma passagem. Passemos, então, da era de aquário para a era de peixes -- aprendamos a nadar livres, sem as barreiras impostas pelo vidro. Mas que a era de áries não chegue já -- que os cabeças duras se afastem! Que de áries só nos cheguem os carneiros, com sua maciez e aconchego.
Tuesday, November 04, 2008
Mais filmes
Bem, depois de um longo jejum de filmes, agora parece que estou indo sempre. Hoje recebi um convite irresistível -- lá fui eu levar alguém muito especial para ver High School Musical 3. Confesso que gostei: adoro musicais, mesmo os ruinzinhos. E este não é mau. Consegui até me divertir, tentando adivinhar para qual universidade o Troy ia. Me decepcionei, mas devia ter percebido, desde o início, que ele era too sweet para não ficar em cima do muro. Boboca. Principalmente porque a Gabriela, depois que obtiver seu diploma de advogada, não vai querer mais nada com ele. Aliás, só ele não percebeu que está em segundo plano na vida dela. Mas, pensando bem, talvez ela também esteja em segundo plano e o negócio dele seja com o Chad... Bem, chega de falar nesse filme. Só mais uma coisa: o que são aquelas onipresentes xícaras de chá que distinguem a diretora, a compositora e o coreógrafo? A seita do santo daime? Um sinal secreto para os olheiros da Julliard? Puro ridículo?
Guido, chéri! Estava com saudades. Quer dizer que você acha impossível gostar de Kombi? É, elas são mesmo desconfortáveis, mas eu passei momentos muito emocionantes em Kombis -- quando estava estudando, minha "condução" era uma Kombi que quase nos matou a todas de susto graças ao seu motorista, o Cícero, que dirigia de lado, à toda velocidade. Cada ida ou volta do colégio era mais emocionante que bungee jumping. É um milagre que tenhamos sobrevivido!
Guido, chéri! Estava com saudades. Quer dizer que você acha impossível gostar de Kombi? É, elas são mesmo desconfortáveis, mas eu passei momentos muito emocionantes em Kombis -- quando estava estudando, minha "condução" era uma Kombi que quase nos matou a todas de susto graças ao seu motorista, o Cícero, que dirigia de lado, à toda velocidade. Cada ida ou volta do colégio era mais emocionante que bungee jumping. É um milagre que tenhamos sobrevivido!
Sunday, November 02, 2008
Vejam como são as coisas...
Fui ao cinema, hoje, assim por impulso, para desanuviar a decepção que o Hamilton me provocou. O Massa me comoveu com suas lágrimas, e, por alguns instantes, odiei o Hamilton, pela sua sorte. Depois, não, ele também se esforçou para chegar até onde estava. Mereceu, mas não festejo por ele. Celebro a vitória do Massa, e espero que a Ferrari não o desaponte na próxima temporada. Daí que fui ao cinema e vi um filme divertido. Mas já me esqueci do título -- alguma coisa com meu irmão e a namorada dele. O ator tinha trabalhado no Pequena Miss Sunshine, fez o papel do Proust Scholar e meus filhos zombaram de mim, na época, pois pouco antes de assistirmos o filme, eu tinha brigado -- na brincadeira -- com eles, e dito que ia vender meu carro e comprar uma Kombi velha. Eles viram o filme e eu, logicamente, tive que escutar as piadinhas sobre minhas preferências por Proust e Kombis... Desta vez, era o filme que ia começar quando chegamos ao cinema. Não sabia de nada sobre ele, mas mal o filme começou, tive que escutar um "outra vez? parece você, né?" E tive que concordar: O ex-Proust scholar, dessa vez um escritor viúvo, acorda numa cama compartilhada por livros, como a minha. Exatamente a mesma coisa. Mas não tenho irmãs, as semelhanças param por aí.
Ao chegar em casa, percebi que havia um recado na minha secretária. Era de uma amiga, que me ligou na sexta, ou talvez na quinta, essa secretária que tenho não me diz a ocasião da ligação. Ela falava de irmos almoçar no sábado... Fiquei devastada -- passo os fins de semana sozinha, nunca tenho programa, e desperdicei uma chance de estar com uma pessoa querida! Quando será que vou aprender a verificar minhas mensagens? Quando será que vou aprender a viver? Eu teria gostado de sair com ela, mas também não fiquei aborrecida nem chateada em casa. Às vezes, no fim da noite, me sinto meio sozinha, após passar um dia inteiro sem falar com ninguém, nem sair de casa. Só que, geralmente, passei o dia lendo, ou escrevendo, e não me senti solitária.
Bem, pensei em ligar para ela para me desculpar, mas já é muito tarde. Amanhã me desculpo. Termino só contando que comecei bem o dia: Na TV Senado, o Maurício Albuquerque fez um comentário sobre meu Linha de sombra, falando que uso o "desejo, o lirismo e a violência"para ler a realidade de nossos dias, ou algo assim. Fiquei impressionada comigo mesma. No computador, havia um aviso dizendo que meu conto No divã, com Freud, tinha sido publicado numa revista virtual chamada Balaio de Notícias -- a revista é linda, vale conferir. E eu escrevi um pouco mais, avançando no romance. Espero que fique bom. Por enquanto acho que estou indo. São poucas as páginas, umas 20, ou pouco mais. Mas estou gostando delas.
Ao chegar em casa, percebi que havia um recado na minha secretária. Era de uma amiga, que me ligou na sexta, ou talvez na quinta, essa secretária que tenho não me diz a ocasião da ligação. Ela falava de irmos almoçar no sábado... Fiquei devastada -- passo os fins de semana sozinha, nunca tenho programa, e desperdicei uma chance de estar com uma pessoa querida! Quando será que vou aprender a verificar minhas mensagens? Quando será que vou aprender a viver? Eu teria gostado de sair com ela, mas também não fiquei aborrecida nem chateada em casa. Às vezes, no fim da noite, me sinto meio sozinha, após passar um dia inteiro sem falar com ninguém, nem sair de casa. Só que, geralmente, passei o dia lendo, ou escrevendo, e não me senti solitária.
Bem, pensei em ligar para ela para me desculpar, mas já é muito tarde. Amanhã me desculpo. Termino só contando que comecei bem o dia: Na TV Senado, o Maurício Albuquerque fez um comentário sobre meu Linha de sombra, falando que uso o "desejo, o lirismo e a violência"para ler a realidade de nossos dias, ou algo assim. Fiquei impressionada comigo mesma. No computador, havia um aviso dizendo que meu conto No divã, com Freud, tinha sido publicado numa revista virtual chamada Balaio de Notícias -- a revista é linda, vale conferir. E eu escrevi um pouco mais, avançando no romance. Espero que fique bom. Por enquanto acho que estou indo. São poucas as páginas, umas 20, ou pouco mais. Mas estou gostando delas.
Saturday, November 01, 2008
Conversas passadas...
Estava agora mesmo trocando e-mails com um amigo de muito tempo atrás. Sentávamos os dois na última fila, e conversávamos sobre poesia, que ambos amávamos. Ele se tornou poeta, respeitadíssimo. Nós éramos muito amigos, nos falávamos todos os dias e com aquele ardor fácil da juventude: nós admirávamos as mesmas coisas e compartilhávamos nossas descobertas, sem tentar suplantar ninguém, sem segundas intenções, apenas maravilhados com o mundo, que nos parecia ainda mais belo através das palavras dos outros. Ele me apresentou os versos de João Cabral, mas na época eu me derretia com Neruda. Depois passou, mas tive uma recaída recente, por ocasião de minha viagem ao Chile. Lá fui eu visitar a casa do poeta. A de Santiago estava fechada, tive que ir a Valparaíso para ver La Chascona -- gostei. Gostei mais ainda porque o motorista que nos levou ficou contando uma piada (que deve ser bem gasta) falando sobre os problemas amorosos de Neruda graças aos versos que ele repetia a todas as namoradas, e que começavam por algo do tipo: gosto quando ficas calada -- todas elas protestavam antes de chegar ao fim, a única que se manteve calada até o fim do poema (que, aliás, é muito lindo) foi com quem ele se casou.
Acontece que estava viajando na companhia de uma amiga dos tempos de faculdade, outra apaixonada por literatura. E, como tinha que trabalhar, estava levando meu computador. Resultado, no meio da noite, já em outra cidade, lá fomos nós googlar Neruda, para ler o poema referido na piada na íntegra (nós já não lembrávamos e o motorista não sabia). Lemos, gostamos, e daí passamos a noite lembrando de poemas de que gostávamos e googlando os versos, para lermos em voz alta. Esse é mais um exemplo desse prazer desinteressado que a literatura nos traz, quando a gente fala e cita pela pura alegria de compartilhar belezas. Ninguém menciona um autor porque é "da moda", ninguém está preocupado em demonstrar que conhece mais que o outro -- o que a gente quer é que o outro sinta o mesmo arrepio descrito por Hemingway (ele dizia que sabia quando o texto era bom porque os cabelos de seu braço se arrepiavam) Infelizmente a gente vai perdendo isso. Na vida acadêmica ficamos mais preocupados com o "sucesso", com o "prestígio", com a "relevância" que com aquilo que realmente nos atraiu em primeiro lugar: o texto.
Então, para que a gente desfrute, aqui vai o poema, que aparece no google recitado na própria voz do Neruda (mas eu não gosto do jeito lento e arrastado como ele lê os próprios poemas) Me gustas cuando callas e Poema XX
Leiam vocês mesmos nas transcrições abaixo:
Me gustas cuando callas
Acontece que estava viajando na companhia de uma amiga dos tempos de faculdade, outra apaixonada por literatura. E, como tinha que trabalhar, estava levando meu computador. Resultado, no meio da noite, já em outra cidade, lá fomos nós googlar Neruda, para ler o poema referido na piada na íntegra (nós já não lembrávamos e o motorista não sabia). Lemos, gostamos, e daí passamos a noite lembrando de poemas de que gostávamos e googlando os versos, para lermos em voz alta. Esse é mais um exemplo desse prazer desinteressado que a literatura nos traz, quando a gente fala e cita pela pura alegria de compartilhar belezas. Ninguém menciona um autor porque é "da moda", ninguém está preocupado em demonstrar que conhece mais que o outro -- o que a gente quer é que o outro sinta o mesmo arrepio descrito por Hemingway (ele dizia que sabia quando o texto era bom porque os cabelos de seu braço se arrepiavam) Infelizmente a gente vai perdendo isso. Na vida acadêmica ficamos mais preocupados com o "sucesso", com o "prestígio", com a "relevância" que com aquilo que realmente nos atraiu em primeiro lugar: o texto.
Então, para que a gente desfrute, aqui vai o poema, que aparece no google recitado na própria voz do Neruda (mas eu não gosto do jeito lento e arrastado como ele lê os próprios poemas) Me gustas cuando callas e Poema XX
Leiam vocês mesmos nas transcrições abaixo:
Me gustas cuando callas
Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.
.
Como todas las cosas están llenas de mi alma
emerges de las cosas, llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.
.
Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza:
Déjame que me calle con el silencio tuyo.
.
Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.
.
Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.
Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Yo la quise, y a veces ella también me quiso.
En las noches como ésta la tuve entre mis brazos.
La besé tantas veces bajo el cielo infinito.
Ella me quiso, a veces yo también la quería.
¡Cómo no haber amado sus grandes ojos fijos!
Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Pensar que no la tengo. Sentir que la he perdido.
Oír la noche inmensa, más inmensa sin ella.
Y el verso cae al alma como al pasto el rocío.
¡Qué importa que mi amor no pudiera guardarla!
La noche está estrellada y ella no está conmigo.
Eso es todo. A lo lejos alguien canta. A lo lejos.
Mi alma no se contenta con haberla perdido.
Como para acercarla mi mirada la busca.
Mi corazón la busca, y ella no está conmigo.
La misma noche que hace blanquear los mismos árboles.
Nosotros, los de entonces, ya no somos los mismos.
Yo no la quiero, es cierto, pero cuánto la quise..
Mi voz buscaba al viento para tocar su oído.
De otro. Será de otro. Como antes de mis besos.
Su voz, su cuerpo claro. Sus ojos infinitos.
Ya no la quiero, es cierto, pero tal vez la quiero.
Es tan corto el amor, y es tan largo el olvido.
Porque en noches como ésta la tuve entre mis brazos,
mi alma no se contenta con haberla perdido.
Aunque éste sea el último dolor que ella me causa,
y éstos sean los últimos versos que yo le escribo.
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.
.
Como todas las cosas están llenas de mi alma
emerges de las cosas, llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.
.
Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza:
Déjame que me calle con el silencio tuyo.
.
Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.
.
Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.
POEMA XX
Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Escribir, por ejemplo: "La noche está estrellada,
y tiritan, azules, los astros, a lo lejos."
Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Yo la quise, y a veces ella también me quiso.
En las noches como ésta la tuve entre mis brazos.
La besé tantas veces bajo el cielo infinito.
Ella me quiso, a veces yo también la quería.
¡Cómo no haber amado sus grandes ojos fijos!
Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Pensar que no la tengo. Sentir que la he perdido.
Oír la noche inmensa, más inmensa sin ella.
Y el verso cae al alma como al pasto el rocío.
¡Qué importa que mi amor no pudiera guardarla!
La noche está estrellada y ella no está conmigo.
Eso es todo. A lo lejos alguien canta. A lo lejos.
Mi alma no se contenta con haberla perdido.
Como para acercarla mi mirada la busca.
Mi corazón la busca, y ella no está conmigo.
La misma noche que hace blanquear los mismos árboles.
Nosotros, los de entonces, ya no somos los mismos.
Yo no la quiero, es cierto, pero cuánto la quise..
Mi voz buscaba al viento para tocar su oído.
De otro. Será de otro. Como antes de mis besos.
Su voz, su cuerpo claro. Sus ojos infinitos.
Ya no la quiero, es cierto, pero tal vez la quiero.
Es tan corto el amor, y es tan largo el olvido.
Porque en noches como ésta la tuve entre mis brazos,
mi alma no se contenta con haberla perdido.
Aunque éste sea el último dolor que ella me causa,
y éstos sean los últimos versos que yo le escribo.
Subscribe to:
Posts (Atom)