A chuva tem me acompanhado nesta viagem, mas nem posso reclamar, pois, vez ou outra, ela fica com dó de mim e se recolhe. E aí volto a experimentar o encanto que é a primavera. Flores que brotam de um dia para outro, tulipas com suas corolas rosas, roxas, vermelhas, os daffodils (cujo nome não aprendo nunca em português), crocuses (outro que nunca sei o que é), narcisos, com seu perfume forte, jacintos, procurando sua imagem no espelho… E as árvores, floridíssimas, nuvens brancas, rosas de todos os tons, belas magnólias, outras árvores brancas, em pequenos ramalhetes, profusões de cores e belezas. Desta vez as flores tardaram a aparecer, mas hoje, domingo de Páscoa, elas estavam por toda a parte. Nas árvores bordejando as ruas, nos vasos de plantas, nos canteiros dos prédios, nos jardins da cidade, nos chapéus da Easter Parade, nas vitrines das lojas, nas próprias lojas de flores.
O sol abriu e todo o mundo saiu para se mostrar, em belas roupas, chapéus extravagantes, criações exclusivas ou massificadas, misturando-se aos protestos contra a homofobia. Durante horas nos divertimos, minha anfitriã, sua filha e eu, olhando cachorros vestidos como gente, gente vestida como flor, flores se agigantando em chapéus que se pretendiam jardins, pontes, cidades inteiras… Aqui e ali coelhos de Páscoa. Aqui e ali, deusas Floras. Aqui e ali figuras do passado, elegantes, distintas, tão elegantes e distintas que pareciam os convidados do casamento real que está por acontecer. No meio de tudo, músicos, marionetes, acrobatas. O ar se enchendo com o cheiro dos cachorros-quentes e dos pretzels. Um policial, a caráter, parecia fazer parte do desfile.
De bom humor, as pessoas desfilavam, paravam, sorriam para fotos. Finalmente, os jardins do Rockfeller Center, com seus coelhos em topiária, suas flores, convidando a um instante de descanso e a mais algumas fotos. Afinal, tudo estava tão bonitinho…
Numa rua lateral, uma senhora exibia suas belíssimas pernas envoltas em meias arrastão. Suponho que ela tenha sido corista da Broadway, quando nova… Duas irmãs, com presumíveis oitenta anos, exibiam elegantes chapéus, sentadas num banco do Central Park, descansando.
No zoológico, os bichos, encalorados, deitavam-se e olhavam a fauna humana que vinha visitá-los, exibindo cores inusitadas e roupas fora do comum. Algumas famílias judaicas circulavam de jaula em jaula, com suas roupas diferentes e seus cachos emoldurando os rostos avermelhados de calor. Um dos homens mais velhos, enorme de gordo, tão gordo que até a parte de cima de sua nuca era gorda, usava, ao invés de calças compridas, calções e meias, e uma espécie de bata de cetim. Sua cabeça estava toda raspada, com exceção dos dois cachos, também gordos, que ladeavam sua face. Era impossível deixar de notá-lo no meio dos outros.
No fim da tarde, a chuva veio dispersar a parada. Já em casa, escutei o temporal caindo, satisfeita de estar bem abrigada, e recordando o dia de ontem, passado com muita chuva, mas dentro de um teatro da Broadway, me divertindo com a Família Addams. NY é muito bom!